Por seis meses, ZH investigou como o DEP fiscaliza os serviços prestados por empresas que deveriam manter limpos os equipamentos de drenagem em Porto Alegre. Sem controle, os serviços são mal feitos e superfaturados, com prejuízos aos cofres públicos e reflexos para a população, que sofre com alagamentos decorrentes de temporais.
Se uma das formas de evitar alagamentos decorrentes de chuva é a boa conservação de equipamentos de drenagem, nada mais natural do que esse serviço ser executado de forma preventiva. O DEP reforça isso em notícias no seu site. Na prática, a prevenção a partir de um cronograma técnico, que leve em conta áreas sob risco de enchente, parece não se concretizar.
A Avenida Tramandaí, em Ipanema, zona sul da Capital, é um exemplo da falta de planejamento visando à prevenção, e também mais um caso de superfaturamento nas cobranças apresentadas pela JD Construções. Referente a serviços de fevereiro de 2015, o DEP pagou pela limpeza de 243 equipamentos de drenagem (EDs). Mas no cadastro do município há somente 83 registrados.
Se a explicação para a cobrança de mais equipamentos do que os existentes fosse, por exemplo, o fato de bueiros e poços de visita serem limpos mais de uma vez no mesmo mês, por conta de a via estar em área crítica de alagamentos, como justificar que uma avenida com esse tipo de risco não tenha atendimento preventivo mais vezes por ano?
– Há muitos anos não existe limpeza regular de bocas de lobo. Quando surgem os problemas de alagamento, a associação começa a se movimentar, mandar ofício. Eles (o DEP) têm um sistema que a gente não consegue entender: tens de dizer exatamente a boca de lobo que quer que limpe. Daí ele vai ali e limpa aquela, ao invés de fazer uma geral no entorno. A gente precisa fazer um relatório fotográfico, identificar os endereços, fazer planilha e encaminhar – conta Waneza Vieira, que preside a Associação Ipanema, Eu Moro, Eu cuido.
Documentos oficiais do DEP a que Zero Hora teve acesso indicam que a Tramandaí não foi limpa pela JD durante todo o ano de 2014 nem em janeiro de 2015. Foram, portanto, 13 meses sem desentupimento de bueiros ou poços de visita. O trabalho só ocorreu em fevereiro de 2015 e resultou em cobrança superior ao que existe de EDs.
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Nos nove meses seguintes, entre fevereiro e novembro, não há registros de que a JD tenha voltado na Tramandaí, apesar dos dois períodos de chuva forte registrados no ano e que acarretaram novos alagamentos na região. Em janeiro, fevereiro e março deste ano, a Tramandaí seguiu sem receber serviços da JD, conforme documentos.
O projeto básico elaborado na licitação do contrato de limpeza de EDs diz: "Os serviços de limpeza preventiva dos equipamentos de drenagem e bacias de detenção e retenção são, para fins descritivos e pelas suas características, serviços que devem se executados de forma contínua. A limpeza preventiva desses dispositivos mantém o fluxo das águas em perfeitas condições de funcionamento".
Em entrevista a ZH sobre a rotina de serviços do DEP, em 29 de março, dois dias antes de deixar o cargo por exigência da lei eleitoral, já que deve concorrer a vereador, o então diretor-geral do DEP, Tarso Boelter (PP), explicou como o cronograma dessas limpezas é feito: a partir de pedidos da comunidade que chegam pelo 156 (telefone de atendimento da prefeitura), do Ministério Público, de vereadores, do gabinete do prefeito e do vice, e das reuniões do orçamento participativo, além de casos noticiados pela imprensa. Não há, portanto, um calendário do órgão visando a prevenção de alagamentos na Capital.