Enquanto a chuva e o vento faziam estragos e botavam moradores de Porto Alegre em alerta no entardecer de quarta-feira, técnicos de vários órgãos municipais monitoravam a situação no Centro Integrado de Comando (Ceic).
Alagamentos, queda de árvores, semáforos desligados. Tudo que surgia nas 39 telas de 55 polegadas recebia encaminhamento por meio da ação integrada de secretarias e departamentos.
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Faça sol ou chuva, haja emergência ou o dia esteja calmo, não importa. O centro, inaugurado em 25 de outubro de 2012, tornou-se o cérebro operacional da prefeitura. Mas as 849 câmeras para monitoramento ininterrupto não servem só para flagrar crimes ou intimidar ladrões. Associadas à atuação integrada, são decisivas para muitos serviços, principalmente preventivos.
A partir das imagens captadas e exibidas no videowall, agentes ligados a diversas secretarias decidem diariamente como solucionar as dificuldades enfrentadas pelos cidadãos - do salvamento de vidas ao controle do tráfego, passando pela limpeza das vias e pelo socorro a desabrigados. As imagens ficam armazenadas por até 10 dias e, se necessário, podem ser extraídas para posterior análise e uso.
Como em uma Capital nenhum dia é igual a outro, a cada nova ocorrência capaz de tirar Porto Alegre da normalidade são descobertas aplicações para a interação entre os órgãos públicos. Em muitos casos, os agentes conseguem antecipar-se a potenciais problemas, prevenindo-os integralmente ou minimizando os seus efeitos (veja exemplos abaixo).
De forma permanente, 17 órgãos municipais mantêm técnicos no local. Eventualmente, outras instituições podem ocupar as 24 estações de trabalho, em busca de informações que possam auxiliar suas tarefas diárias. Em 2013, durante os protestos de junho, também estiveram no Ceic agentes de órgãos estaduais e federais, que traçavam dali as estratégias e analisavam a postura de manifestantes e agentes públicos.
A teoria é simples: concentrados em um único local, com visão geral da situação da cidade, as instituições podem agir de forma conjunta, tomando decisões rápidas e assertivas, o que resulta na ágil resolução de problemas corriqueiros ou até mesmo na eventual gestão de crises.
CEIC: cérebro operacional de Porto Alegre
No brasil, só rio tem central semelhante
No incêndio no Shopping Total, em novembro de 2012, por exemplo, os plantonistas chegaram até a acionar os serviços emergenciais. Na ocasião, os bombeiros foram avisados pelos próprios agentes do Ceic, que avistaram a fumaça em uma das câmeras de monitoramento. Com a constatação do fogo, o atendimento foi imediato.
Há, ainda, casos mais dramáticos. Não raramente, agentes da Empresa Pública de Transportes e Circulação (EPTC), cuja função primordial é cuidar das questões relacionadas ao tráfego na Capital, são forçados pelas circunstâncias a iniciar o atendimento a vítimas de acidentes, sob a orientação, via rádio, de técnicos do Serviço de Atendimento Médico de Urgência (Samu), que assistem às imagens em tempo real.
Para Luciano Eifler, médico do Samu, a abundância de informações oferecidas pelas imagens complementa os dados repassados às centrais operacionais durante as chamadas telefônicas de emergência:
- Pelas câmeras, conseguimos ver o estado da vítima e até a deformidade do veículo, para entender qual foi a energia cinética transmitida para o paciente. Se a pessoa se mexe ou não, se respira, quantas vítimas são, quais os recursos de que vou necessitar. Enfim, é muito melhor ver e ouvir do que apenas ouvir - afirma Eifler.
No Brasil, só o Rio de Janeiro, com o Centro de Operações do Rio (COR), mantém central de monitoramento semelhante ao Ceic, agregando agentes de órgãos municipais. Desde 2012, técnicos das prefeituras de Belo Horizonte, Cuiabá e Vitória vieram a Porto Alegre para conhecer a estrutura e o sistema integrado, com objetivo de buscar informações para a criação de estruturas semelhantes.
SOCORRO EM TEMPO REAL
O monitoramento ajuda na rápida sinalização de acidentes, permitindo desviar o trânsito para a ambulância chegar mais rápido. Se necessário, a EPTC pode, de forma remota, alterar o tempo das sinaleiras para ajustar o fluxo. Também à distância, médicos do Samu orientam os agentes da EPTC ou da Brigada Militar no atendimento às vítimas até a chegada da ambulância mais próxima - que é acionada após verificação do mapa com todas as unidades (foto acima). Esse procedimento costuma ocorrer por rádio, com o médico acompanhando o socorro por meio da imagem das câmeras, em tempo real.
MUDANÇA NO ITINERÁRIO
Não só em caso de acidentes, mas quando um protesto interrompe o trânsito em alguma rua, a rota dos ônibus pode ser alterada. Uma modificação temporária no trajeto, após análise do cenário da região por meio de mapas e das câmeras, faz com que os veículos não fiquem retidos nas áreas bloqueadas, evitando atrasos.
- Uma manifestação se movimenta, e a gente vai verificando: se liberou a Avenida Mauá, direciona os ônibus porque o protesto foi por outro caminho. Assim, a gente vai se entrosando com outros órgãos municipais - explica Gelson Luiz Guarda, assessor e coordenador financeiro da Carris.
ATENDIMENTO A INCÊNDIOS
Um exemplo de integração via Ceic foi em janeiro de 2013, no incêndio na Vila Liberdade. Sem hidrantes próximos, caminhões-pipa do Departamento de Água e Esgotos (DMAE) levaram água aos bombeiros. Com quase 200 casas queimadas, foi preciso um ônibus para remover desabrigados, que acabou cedido pela Guarda Municipal.
- Se precisar de uma retroescavadeira para escombros, peço ao Ceic, que contata as bases e disponibiliza os meios - relata Ricardo Selli, agente da Defesa Civil.
Em casos assim, as câmeras ajudam tanto na pré-análise do local como na orientação remota do socorro às vítimas.
PREVENÇÃO A ALAGAMENTOS
O monitoramento permite verificar demandas preventivas, como o controle de resíduos. Em 2014, técnicos do Ceic perceberam que locais próximos ao viaduto da Avenida João Pessoa e ao Parque da Redenção, que não tinham histórico de alagamentos anteriores, começaram a registrar inundações, mesmo em dias de chuva normal. A partir disso, o órgão iniciou uma série de serviços de manutenção na região e verificou, com a ajuda das imagens feitas pelas câmeras, que as bocas de lobo ficavam entupidas devido à queda de folhas. Em seguida, uma limpeza foi feita para resolver o problema.
ALERTAS METEOROLÓGICOS
O Metroclima dispara avisos aos órgãos no Ceic. Se há chuvarada à vista, o Departamento de Esgotos Pluviais limpa bueiros. Já o Departamento de Limpeza Urbana retira detritos das vias e, às vezes, até antecipa a coleta do lixo. No inverno, se há previsão de frio, os cardápios da merenda escolar são adaptados com mais alimentos quentes. Foi a partir de um alerta de que haveria muitos raios na região do Anfiteatro Pôr do Sol que foi cancelada a programação da Fan Fest em 13 de junho de 2014, durante a Copa do Mundo - além de raios, houve 65 milímetros de chuva, quase metade da média histórica do mês.
POR DENTRO DO QG
- O Centro Integrado de Comando (Ceic) de Porto Alegre tem câmeras em pontos elevados, para verificar a situação do trânsito nas vias, ou baixos, em locais públicos como praças, parques, postos de saúde e estações de tratamento de esgoto (ETEs). Também há monitoramento em áreas como o Mercado Público, a Usina do Gasômetro e os pátios internos das 96 escolas da rede municipal.
- Durante 24 horas por dia, os equipamentos têm suas imagens exibidas em tempo real, de forma alternada, em telas de alta resolução de 55 polegadas. A estrutura forma um grande mosaico (videowall), com 16 metros de comprimento por três metros de altura.
- R$ 5,6 milhões foi o investimento da prefeitura para a construção do centro de comando.
- O centro conta com 24 estações de trabalho, com 48 monitores capazes de reproduzir e controlar as imagens do videowall.
- A partir dali, técnicos de órgãos municipais monitoram as ruas, tomando decisões estratégicas para prevenir problemas ou resolver eventuais anormalidades, como congestionamentos, alagamentos ou incidentes.
- O espaço também fica aberto para monitoramento eventual por Brigada Militar, Bombeiros, Polícia Federal, Polícia Rodoviária Federal, Defensoria Pública e Exército.
- Além das imagens das câmeras, os profissionais dispõem de mapas georreferenciados, que indicam onde ficam hidrantes, dutos de gás, postos de saúde e, por exemplo, a localização de todas as 16 ambulâncias do Samu.