O gerente de fábrica da Souza Cruz, engenheiro de produção Cláudio Wulf, festeja em clima de otimismo a reaproximação com os Estados Unidos. Carioca, Wulf trabalhou na ilha de 2007 a 2008 e se casou com uma cubana, com quem tem dois filhos. Leia a entrevista do executivo, concedida por e-mail.
Qual é a sua expectativa em torno do futuro de Cuba?
Muito positiva, principalmente no curto prazo, com o destravamento do fluxo de americanos para a ilha e o aumento do turismo. Devem se abrir portas para as relações entre Cuba e os EUA, com investimentos em infraestrutura e telecomunicações.
Como ficará a vida dos cubanos? Aqueles que dividem casas com inúmeros familiares e andam em carros das décadas de 1950?
No longo prazo, tende a melhorar. Com o aumento do turismo, cresce o fluxo de capital na ilha e, se isso vier aliado à disponibilidade de bens de consumo, proporciona aumento de renda. Só vejo aspectos positivos nessa relação.
Como será a vida dos que trabalham para o Estado?
Hoje já existe uma revisão no número de funcionários públicos e pode ser que esse processo sofra uma aceleração, mas nos moldes cubanos, sem perder a essência socialista do país, cujo foco é o bem-estar das pessoas. É um elemento que, acredito, eles não abram mão.
Como ficarão os que trabalham em pequenos ofícios, como taxista, garçom, guia turístico?
O Raúl Castro, desde que assumiu, já previa uma transição para um modelo em que o pequeno empresário, chamado de cuentapropista, fosse beneficiado. Acredito que, no futuro, haverá uma expansão para outros segmentos, gerando um aquecimento na economia. Mas ainda acredito que tudo será feito gradualmente, para que a essência do modelo não se perca.
Como ficará a questão do desabastecimento? Aquilo de não ter creme de barbear, sabonete, caneta esferográfica?
Essa é outra imagem incorreta que se tem do lado de fora da ilha. Lá tem tudo isso, talvez não em todas as opções que temos, mas os insumos básicos existem lá. O que acontece é que há altos e baixos, às vezes falta uma marca, mas isso tende a se normalizar pouco a pouco. Com a melhoria das relações comerciais, Cuba deverá adquirir credibilidade no cenário internacional, o que proporcionará mais investimentos no país.
Cuba tem bons indicadores na saúde, na educação e nos esportes. O senhor acha que isso pode mudar?
Tende a melhorar. Com a retirada do bloqueio, os cubanos poderão estabelecer parcerias científicas, participar de fóruns internacionais, ter mais acesso à internet, à tecnologia, participar de forma mais efetiva da comunidade científica, dos meios acadêmicos. Como a educação é um pilar importante no modelo cubano, existe uma qualificação técnica muito grande, mão de obra qualificada, e as empresas que vierem a se instalar na ilha poderão contar com uma boa base de profissionais.
Cuba tem algo a perder com a abertura?
Não. Como devem fazer tudo de maneira muito controlada, vão manter a essência. Os cubanos são muito fiéis ao nacionalismo, foram criados com um orgulho muito grande de seu país, apesar das dificuldades, e não vão querer perder isso.
Qual o principal ganho de Cuba com a abertura?
O turismo, a aproximação natural do cidadão americano, de empresários que visitem o país e comecem a se interessar por Cuba, levando investimentos. Volto a repetir que não será nada rápido, o reatamento de relações vai ser meticuloso. Para o Brasil, espera-se que seja positivo, porque sempre fomos parceiros da ilha. Exemplos dessa relação são o porto de Mariel e a Brascuba (empresa mista de tabacos, numa sociedade cubano-brasileira).