A lista de indiciados pela Polícia Federal por tentativa de golpe de Estado, abolição violenta do Estado Democrático de Direito e organização criminosa inclui dois gaúchos. Ambos são militares aposentados do Exército: o major Ailton Gonçalves Moraes Barros, reformado (afastado de forma definitiva do serviço) e o coronel Carlos Giovani Delevati Pasini, da reserva (pode ser convocado de volta à ativa, em determinadas circunstâncias).
Ailton Gonçalves Moraes Barros
Natural de Alegrete (região da Campanha, no Rio Grande do Sul), ele se mudou para o Rio de Janeiro ainda criança, acompanhando o pai, cabo do Exército. Barros é velho conhecido da PF: foi preso pelos federais em maio de 2023, acusado de fraudar dados de cartões de vacinação contra covid-19. O major reformado aparece com destaque na trama golpista investigada pela Polícia Federal (PF). Era interlocutor frequente do tenente-coronel Mauro Cid, ajudante de ordens do ex-presidente Jair Bolsonaro. Ambos teriam tramado a falsificação de cartões de vacina para que Bolsonaro pudesse viajar ao Exterior. Barros era também assíduo em conversas com o chefe da Casa Civil Walter Braga Netto.
Em um dos diálogos recuperados pela PF, Braga Netto encaminhou a Barros uma mensagem que teria recebido de um militar de forças especiais do Exército: "Meu amigo, infelizmente tenho que dizer que a culpa pelo que está acontecendo e acontecerá é do general Freire Gomes (na época, comandante do Exército). Omissão e indecisão não cabem a um combatente". Em resposta, Barros sugere continuar a pressionar o comandante e, caso ele insistisse em não aderir à ideia do golpe de Estado, passariam a um plano B: "Vamos oferecer a cabeça dele aos leões". Ao que Braga Netto teria assentido: "Oferece a cabeça dele. Cagão".
Formado oficial na Academia Militar das Agulhas Negras (Aman), foi paraquedista. Em 2006, quando capitão, teria se envolvido em uma negociação com traficantes cariocas pela devolução de fuzis roubados de um quartel. Naquele mesmo ano, foi reformado do Exército por transgressões diversas. Ao ser mandado embora, o capitão foi promovido por antiguidade a major. Na vida civil, estudou Direito e passou a advogar na área criminal. Buscou a carreira política, mas não teve sucesso nas tentativas de se eleger a deputado federal, vereador e deputado estadual, sempre por partidos de direita. A última filiação foi ao PL.
Carlos Giovani Delevati Pasini
Nascido em Santiago (região central do Rio Grande do Sul), Pasini é coronel da reserva e reconhecido intelectual. É apontado como um dos quatro redatores da "Carta ao Comandante do Exército de Oficiais Superiores da Ativa do Exército Brasileiro". Essa correspondência, segundo investigações da Polícia Federal, foi utilizada como instrumento de pressão ao então comandante do Exército, General Freire Gomes, para que ele aderisse a um golpe de Estado em 2022. Ele não aderiu.
Pasini foi indiciado num Inquérito Policial Militar (IPM) a respeito dessa carta. O Exército concluiu que ele cometeu crimes militares de críticas indevidas e incitação à indisciplina, cuja pena pode chegar a quatro anos e dois meses de detenção. A 2ª Procuradoria de Justiça Militar em Brasília decidirá se apresenta denúncia ou arquiva o caso. Pasini, na última quinta-feira (21), foi também indiciado pela PF por tentativa de golpe de Estado.
Pasini é graduado em Ciências Militares na Academia das Agulhas Negras (Aman), fez curso no Centro de Instrução de Guerra Eletrônica. Cursou também pós-graduação e mestrado em Ciências Militares. É graduado ainda em Língua Portuguesa e Literatura, com mestrado em Educação. Por último, fez doutorado em Educação. Atuou ainda como professor em colégios militares, na mídia em Santa Maria e Santiago (RS), inclusive sendo membro de academias voltadas para letras e poesia nessas cidades. Escreveu 10 livros e organizou dezenas de outros.
CONTRAPONTOS
O que diz Carlos Giovani Delevati Pasini:
O defensor dele, Matheus Pires, diz que não teve acesso integral ao inquérito. "Mas reiteramos que o coronel Pasini não elaborou e nem assinou nenhuma carta antidemocrática, tampouco se associou a outras pessoas para cometimento de atos antidemocráticos".
A reportagem não localizou a defesa de Ailton Gonçalves Moraes Barros. O espaço está aberto para suas alegações.