Em vigor há mais de dois anos no Rio Grande do Sul, o instrumento conhecido como autolicenciamento ambiental está no centro de um julgamento iniciado no Supremo Tribunal Federal (STF). O mecanismo permite a emissão da licença pela internet, sem etapas de análise prévia da documentação apresentada pelo empreendedor.
Aprovada pela Assembleia Legislativa em 2019, na reforma do Código Ambiental proposta pelo governador Eduardo Leite, a Licença Ambiental por Compromisso (LAC) foi implementada em 2022, para 49 atividades. Antes disso, em 2020, a Procuradoria-Geral da República ingressou com ação no STF pedindo a nulidade da legislação estadual.
Quase quatro anos depois, a solicitação da PGR foi submetida a julgamento no plenário virtual da Corte. Relator do caso, o ministro Cristiano Zanin votou para que o autolicenciamento seja concedido apenas para atividades de baixo impacto ambiental.
De imediato, o ministro Gilmar Mendes pediu vista, interrompendo o julgamento. Agora, Gilmar terá até 90 dias para devolver o processo à apreciação dos colegas.
Se prevalecer o entendimento de Zanin, o governo estadual terá de restringir a concessão dessa licença apenas para atividades de baixo potencial poluidor. Atualmente, das 49 que tiveram o autolicenciamento liberado pelo Conselho Estadual do Meio Ambiente (Consema), somente 18 apresentam essa característica. As demais são consideradas de médio ou alto impacto.
No entanto, os outros ministros do Supremo podem divergir do relator, seja para manter a legislação atual em vigor, seja para invalidar por completo o instrumento.
Visões distintas
O autolicenciamento ambiental é alvo de discussão no Rio Grande do Sul desde 2019, quando o governador Eduardo Leite propôs e a Assembleia aprovou a ferramenta, na reforma do Código Ambiental.
A providência agrada o setor produtivo, que a considera fundamental para reduzir a burocracia para os empreendimentos.
O vice-presidente da Federação da Agricultura do RS (Farsul), Domingos Velho Lopes, rejeita o termo "autolicenciamento", argumentando que o instrumento exige a mesma documentação apresentada para licenças ordinárias.
— Nossa visão é de que, caso o conselho estadual (Consema) concorde com a licença por adesão e compromisso, esse é um bom instrumento e uma boa iniciativa trazida na reforma do código ambiental, que dá celeridade ao licenciamento sem perder a qualificação e a segurança — diz Lopes.
Por outro lado, a ferramenta é criticada por entidades ligadas à defesa do meio ambiente. O presidente da Associação Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural (Agapan), Francisco Milanez diz que o autolicenciamento não deveria ser liberado.
Para ele, o Estado não poderia abrir mão da prerrogativa de fiscalizar os empreendimentos e, para agilizar o licenciamento, deveria ampliar o quadro técnico da Fundação Estadual de Proteção Ambiental (Fepam).
— O autolicenciamento é contrário ao interesse dos próprios empreendedores. Quando o Estado licencia, está protegendo o produtor. Se houver um problema, a responsabilidade dele é menor, já que o Estado também falhou — aponta Milanez.
Mesmo dentre as atividades liberadas, o autolicenciamento não pode ser aplicado em locais que demandem retirada de vegetação ou estejam em uma área de proteção permanente. Nesses casos, o empreendedor é direcionado ao formato tradicional.