Os bastidores do MDB de Porto Alegre estão sobressaltados por um tema que ainda deverá causar uma série de discussões: a possível inelegibilidade do vereador Pablo Melo (MDB), filho do prefeito Sebastião Melo, na eleição de 2024. Uma regra constitucional barra candidatura de filhos do chefe do Executivo em área sob sua "jurisdição", "salvo se já titular de mandato eletivo e candidato à reeleição". Pablo Melo é suplente em exercício de mandato na Câmara Municipal.
As alternativas mais comentadas até o momento são Pablo decidir ficar de fora do pleito ou um vereador do MDB renunciar, o que lhe asseguraria o direito de buscar a reeleição como titular de mandato.
A hipótese de se manter na atual condição de suplente, ainda que no exercício do cargo, e partir para batalha jurídica pelo direito de concorrer não conta com a simpatia de Pablo. Ele entende que isso traria desgastes políticos para o pai e ainda dificultaria sua campanha, ante possível ofensiva de adversários que espalhariam que "Pablo estará inelegível no final e votar nele é desperdício".
Pablo recebeu 2.413 votos na eleição de 2020, quando seu pai foi escolhido pela população para ser prefeito de Porto Alegre, e é primeiro suplente da bancada do MDB, composta por três parlamentares titulares: Cezar Schirmer, Idenir Cecchim e Lourdes Sprenger.
Pablo está no exercício do mandato desde janeiro de 2023, quando Schirmer voltou à prefeitura para ser o secretário de Planejamento e Assuntos Estratégicos.
Ele já havia exercido a função parlamentar entre janeiro de 2021 e março de 2022, período em que Schirmer esteve licenciado da Câmara para chefiar a mesma secretaria do governo Melo.
No somatório, Pablo desempenha a vereança há pouco mais de dois anos, mas o problema é o artigo 14 da Constituição. Ele diz que, quando se tratar da mesma "jurisdição", é inelegível o filho de autoridade, incluindo o prefeito, "salvo se já titular de mandato eletivo e candidato à reeleição".
Essa norma foi estabelecida, à época da Assembleia Nacional Constituinte, com o objetivo de evitar que os chefes de Executivo passassem a eleger familiares a reboque. Uma tentativa de brecar dinastias.
Pablo é primeiro suplente em exercício, fato que o leva a fazer uma avaliação que pode ser considerada realista.
— A única forma pacífica de eu concorrer é ser titular do cargo até seis meses antes da eleição. Afora isso, teria de ser feita uma discussão jurídica que não me parece ser o caminho — diz Pablo.
A situação precisa estar resolvida até abril, seis meses antes da eleição, prazo para a desincompatibilização.
Diante disso, crescem nos bastidores os comentários a respeito da possível renúncia de um dos vereadores do MDB para que Pablo fique apto à disputa. Lourdes não é cogitada nesse cenário, e Cecchim tem dito que não renuncia e que deve concorrer novamente. As expectativas recaem sobre Schirmer, que há anos comenta com amigos a possibilidade de ir morar com as filhas em Portugal.
À reportagem, Schirmer afirmou que não é candidato à reeleição e não retomará o mandato de vereador em abril. Ele pretende seguir como secretário e, assim, Pablo se manteria em 2024 como primeiro suplente em exercício. Schirmer entende que estar no exercício já bastaria para Pablo buscar a reeleição, o que esbarra em outras interpretações jurídicas e na jurisprudência.
O tema já foi discutido inclusive na presença de Melo. Quem testemunhou diz que o prefeito tomou a palavra para deixar claro que não faria pedidos de renúncia a ninguém.
— Eu também não pedirei nenhuma renúncia. Não farei nenhum movimento. É uma decisão personalíssima. Ele (Schirmer) é experiente e está ciente, mas nunca sentamos para conversar sobre isso. Para o partido, é ruim nós dois não concorrermos. Se eu não puder, ele poderia concorrer. Pelo menos um de nós dois teria de ir. O partido ainda deve fazer essa discussão — projeta Pablo.
Ele tem conhecimento de uma decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), em votação dividida de 2021, quando foi deferida a candidatura a vereadora da cunhada da prefeita de Nazaré (BA), no pleito de 2020. No Tribunal Regional Eleitoral da Bahia, a candidatura havia sido impugnada, mas o TSE, por quatro votos contra três, entendeu que ela poderia concorrer por já ter exercido o cargo de vereadora por três anos e dois meses como suplente. Foi aberta uma "distinção" à jurisprudência. É um caso idêntico que poderia dar expectativa a Pablo, embora ele não demonstre disposição. Cita o desgaste político para o pai e a desconfiança do eleitor ante um candidato com potencial de impugnação.
— Não parto da ideia de fazer disputa jurídica — diz Pablo.
Para o advogado Antônio Augusto Mayer dos Santos, especialista em direito eleitoral e constitucional, uma tentativa de emplacar a tese seria difícil.
— A Constituição estabeleceu a titularidade do mandato. Tenho convicção de que, se o constituinte quisesse estabelecer distinção, teria incluído a ressalva de que o suplente em exercício poderia concorrer, mas não o fez. É uma questão em torno da literalidade do texto, me parece um obstáculo intransponível — avalia Mayer dos Santos.
Também especialista em direito eleitoral, Rafael Morgental entende que seria possível obter o registro da candidatura de Pablo em discussão jurídica.
— Se ele está no exercício do cargo, mesmo que por suplência, é o titular do mandato naquele momento do registro da candidatura e busca reeleição. Não podemos nos apegar ao entendimento de que só são titulares os eleitos nas vagas. O suplente é eleito e diplomado. Ele (Pablo) foi eleito com o pai e exerceu boa parte do mandato. Me parece preencher os requisitos para concorrer sem estar sujeito à inelegibilidade por parentesco — teoriza Morgental.