O ex-secretário-executivo do Ministério da Saúde Elcio Franco criticou, entre as cláusulas para a aquisição de vacinas da Pfizer contra a covid-19, o dispositivo que obrigava o governo brasileiro a publicar medida provisória e que esta fosse convertida em lei.
— Dentro do nosso Estado Democrático de Direito, os poderes são independentes. Então, não podemos garantir que ela fosse convertida em lei — disse Franco à CPI da Covid nesta quarta-feira (9).
Aos questionamentos do relator, Renan Calheiros (MDB-AL), sobre a demora do governo em propor alterações legais para o contrato com a vacina da Pfizer, Franco afirmou que o laboratório "foi irredutível em alterar qualquer uma das cláusulas".
— Inclusive, nas negociações do contrato, mesmo depois da lei 14.125, qualquer discussão do contrato eles levavam para o jurídico da Pfizer em Nova York — acrescentou.
Segundo o ex-secretário, cláusulas semelhantes foram encontradas no contrato para compra de vacinas da Janssen.
— Nós propusemos, pelo Ministério da Saúde, uma minuta de medida provisória que atenderia as demandas da Pfizer e da Janssen e houve uma falta de consenso entre as consultorias jurídicas dos ministérios que estavam participando da discussão com relação a de quem deveria partir a iniciativa uma vez que deveria ser convertida em lei. Dessa forma, esses artigos ou parágrafos foram retirados da medida provisória — narrou, de forma semelhante ao descrito pelo ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello.
Franco, entretanto, se recusou a responder de qual órgão partiu a iniciativa de retirar os trechos. Os dispositivos retirados tratavam principalmente da responsabilidade por efeitos adversos e da contratação de seguro pelo governo.
Segundo o vice-presidente da CPI e relator no Senado da medida provisória convertida em lei, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), os órgãos que assinaram a minuta encaminhada ao presidente da República e que continha as cláusulas citadas incluem Ministério da Justiça, Controladoria-Geral da União, Advocacia-Geral da União, Ministério da Economia, Ministério da Saúde e Casa Civil.
"Politização em SP"
No depoimento, Elcio Franco acusou o governo do Estado de São Paulo de "politização" da discussão sobre vacinas.
— As tratativas eram com o Butantan, não com o governador de São Paulo — afirmou.
Ao longo das entrevistas coletivas semanais do governo de São Paulo, o governador João Doria, ao lado de representantes do Butantan, repetidas vezes cobrou o governo federal e órgãos reguladores por mais agilidade e "senso de urgência" nas negociações para a aquisição de vacinas. Segundo o ex-secretário, a politização aconteceu pela pressa do governo estadual em iniciar a vacinação uma vez que o Butantan "só entrou com o pedido de uso emergencial no dia 8 de janeiro".
Franco, mais cedo, havia sido confrontado pelo relator Renan Calheiros sobre afirmação, à época em que esteve na pasta, de não haver "intenção de compra de vacinas chinesas". Segundo Calheiros, "esse vídeo, infelizmente, escancara uma contradição brutal sobre as negociações com o Butantan".
Franco justificou que a primeira oferta do Instituto Butantan, em julho de 2020, era para a importação de vacinas.