SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Líder da tropa de choque de Fernando Collor, delator do mensalão e agora o mais novo melhor amigo do presidente Jair Bolsonaro.
O presidente nacional do PTB e ex-deputado federal Roberto Jefferson (RJ) acaba de se reinventar mais uma vez.
A nova roupagem bolsonarista mostrou-se claramente na noite de domingo (19), numa transmissão pela internet em que Jefferson abriu fogo contra o Congresso.
Escolheu como alvo especial o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), por supostamente articular o esvaziamento dos poderes presidenciais.
A live, uma conversa com o jornalista-ativista Oswaldo Eustáquio, teve 1,82 milhão de visualizações e foi compartilhada por Bolsonaro e diversos integrantes de sua base de ativistas digitais.
Na transmissão, Jefferson denunciou um suposto golpe que estaria sendo arquitetado com a participação de governadores e lideranças como o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, para aprovar o impeachment de Bolsonaro ou instituir um parlamentarismo branco.
O mesmo padrão tem se repetido nas redes sociais e em entrevistas. O Jefferson relativamente sóbrio (ao menos para seus padrões) de alguns meses atrás deu lugar a um integrante dedicado da base de militantes virtuais do presidente, inclusive no tom duro e até agressivo.
Nesta segunda, em entrevista à rádio Jovem Pan, ele disse que está disposto a ir para a rua para defender Bolsonaro da esquerda até armado, se precisar.
"Já estou desenferrujando meu revólver, limpando as raias do seu cano, porque ele está há muito tempo parado. Se precisar enfrentar essa gente, nós vamos enfrentá-los no meio da rua", afirmou.
Pouco antes, pelo Twitter, havia acusado FHC de ser "o maestro nessa orquestração do golpe". "Rodrigo Maia é o trombone, e [João] Doria, a flauta doce", completou.
O ex-deputado também tem copiado parte da retórica e da simbologia usadas por Bolsonaro. Num post recente, repetiu o bordão "Brasil acima de tudo" e elogiou o general João Batista Figueiredo, último presidente da ditadura militar, comparando-o ao atual presidente.
"Brasil acima de tudo. Amor à bandeira. Amor à pátria. Ele [Bolsonaro] diz isso no presente, Figueiredo dizia no passado."
Com exceção de uma aliança firmada com o PT entre 2003 e 2005, encerrada com o escândalo do mensalão, Roberto Jefferson tem se mantido no lado conservador do debate político.
Até o agravamento da crise do coronavírus, ele vinha mesclando elogios pontuais a Bolsonaro com críticas a seu estilo.
A recente adesão incondicional ao presidente surpreendeu aliados internos, que dizem ser um movimento individual de Jefferson, e não necessariamente de caráter partidário.
"Isso é uma coisa dele com o presidente. Não foi discutido internamente", diz o ex-deputado Benito Gama (BA), vice-presidente nacional do partido.
"Não conheço essa aproximação, não posso falar nada. A gente está em quarentena, não discutimos esse assunto", afirma o deputado federal Mauricio Dziedricki (PTB-RS), tesoureiro do partido.
Procurado pela reportagem, Roberto Jefferson não quis dar entrevista.
A aliança entre ele e Bolsonaro coincide com dois movimentos políticos recentes, um nacional, e outro da política carioca.
Nacionalmente, conforme revelou a Folha, o presidente tem buscado os partidos do centrão, bloco do qual o PTB é sócio-fundador, para isolar Maia. As conversas incluem a oferta de cargos, apesar da retórica do presidente de que não faz a política do "toma lá, dá cá".
Na entrevista à Jovem Pan, Jefferson admitiu a possibilidade de seu partido integrar o governo Bolsonaro, desde que fosse "em cima de uma plataforma escrita, de objetivos claros, de compromissos políticos publicáveis". "Toma lá, dá cá, em hipótese alguma", disse.
Além disso, a ex-deputada federal Cristiane Brasil, filha de Jefferson, se lançou pré-candidata a prefeita do Rio de Janeiro, com uma plataforma conservadora.
Embora o senador Flávio Bolsonaro tenha se filiado ao Republicanos, partido do prefeito Marcelo Crivella, que tentará a reeleição, ela acredita que pode disputar parte do eleitorado bolsonarista.
"Eleitores do Bolsonaro têm uma afinidade natural com os meus eleitores. Essa relação do meu pai com o presidente pode aumentar, sim, meu eleitorado, falando de forma pragmática", diz a ex-deputada.
Ela afirma, no entanto, que esse fenômeno seria uma consequência natural, não o resultado de algum acordo que envolva apoio partidário ou partilha de cargos.
"É um apoio ideológico do meu pai ao presidente. Ele está colocando a alma dele nisso, e com a felicidade de não querer nada em toca", afirma Brasil.
A artilharia do presidente nacional do PTB contra Maia, de acordo com a pré-candidata, é uma reação à tentativa do presidente da Câmara de ampliar sua atuação. "Ele quer mais poderes e aumentar seu próprio mandato", diz.
Não faz muito tempo, o tom de Jefferson com Maia era mais benevolente. Em 10 de julho de 2019, quando a reforma da Previdência foi aprovada na Câmara, ele viu com bons olhos a força do hoje inimigo.
"O presidente da Câmara, Rodrigo Maia, deu demonstração de força hoje na votação em 1º turno da reforma da Previdência, aprovada por 379 votos contra 131. Foi um grande avanço, e o povo brasileiro sai vencedor", escreveu o petebista numa rede social.
Da mesma forma, o ex-deputado costumava fazer reparos a declarações dadas por Bolsonaro, como a crítica feita por ele e pelo ministro Paulo Guedes (Economia) à aparência da primeira-dama francesa, Brigitte Macron, em setembro do ano passado.
"Fala do ministro Guedes reproduzindo o infeliz comentário do presidente Bolsonaro sobre Brigitte Macron foi no mínimo lamentável. Comentário nenhum hoje, ainda que entre quatro paredes, fica impune. Tá sobrando machismo no governo", escreveu.
Na nova fase de aliado fiel, o máximo a que Roberto Jefferson se permite é criticar a roupa usada pelo presidente na manifestação pró-intervenção militar a que ele compareceu no domingo (19), em Brasília.
"Presidente Bolsonaro, só não gostei da camisa. Eu não tenho nenhuma camisa vermelha", disse.