BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - O presidente Jair Bolsonaro (PSL) voltou a radicalizar seu discurso público, em uma tentativa de blindar o governo e evitar desgaste de imagem com suspeitas de corrupção envolvendo assessores.
O maior receio, segundo auxiliares de Bolsonaro ouvidos pela reportagem, é a perda de apoio na base de eleitores do presidente, que foi eleito com discurso de tolerância zero com irregularidades.
Casos de suspeitas de corrupção tiveram repercussão nas redes sociais, impactando até mesmo o engajamento da base do presidente.
Três episódios recentes marcam o abandono do estilo conciliador que Bolsonaro tentava adotar desde o fim de setembro. O primeiro foi a operação da Polícia Federal contra o líder do governo no Senado, Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE), por suspeita de desvios em obras públicas. A ação foi no dia 19 de setembro.
Na semana seguinte, Bolsonaro disse que não falaria mais com a imprensa após seu discurso na Assembleia Geral da ONU, em Nova York.
O tom se acirrou ainda mais nesta semana, quando o jornal Folha de S.Paulo revelou, no último domingo (6), que um depoimento e uma planilha obtidos pela PF sugerem que recursos do esquema de candidaturas de laranjas do PSL em Minas Gerais foram desviados para abastecer, por meio de caixa dois, até a campanha de Bolsonaro.
Para o presidente, a Folha de S.Paulo foi "às profundezas do esgoto".
Para evitar aumento da rejeição, ele adotou estratégia que tem se tornado praxe na gestão. Em momentos de críticas, o Planalto eleva o tom na tentativa de enfraquecer o impacto de notícias negativas.
O governo, nessa reação, busca também dar munição para que sua base eleitoral continue a defender a administração de Bolsonaro.
O foco das críticas agora são os veículos de comunicação. Nesta terça (8), no Palácio da Alvorada, Bolsonaro chamou a imprensa de "fétida".
O presidente encerrou uma entrevista quando foi questionado sobre um apontamento feito pelo Ministério Público no Pará de que houve tortura na intervenção de presídios: "Parem de perguntar besteira". O caso foi revelado pelo jornal O Globo.
Antes, Bolsonaro pedira a um pastor que o aguardava na frente do palácio uma oração para a imprensa. "Fala para a imprensa de [livro da Bíblia] João 8:32 aí", disse ao religioso, que orou. O trecho bíblico diz: "E conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará".
Na segunda (7), Bolsonaro adotou linha semelhante. Ele afirmou que a cobertura jornalística não pode continuar com "covardia" e "patifaria".
"Eu lamento a imprensa brasileira agir dessa maneira. O tempo todo mentindo, distorcendo, difamando. Vocês querem me derrubar? Eu tenho couro duro, vai ser difícil. Continuem mentindo", disse.
Além da Folha de S.Paulo, o presidente fez críticas públicas a outros dois veículos -O Globo e Correio Braziliense-, acusando-os de mentir em reportagens sobre medidas administrativas estudadas pelo governo.
Desde que mudou de postura, Bolsonaro tem evitado responder a jornalistas que o esperam na frente do Alvorada, onde ele promovia desde junho entrevistas diárias.
Passou também a reclamar que não são feitas reportagens ou perguntas positivas sobre o mandato. "Não tem coisas boas para perguntar? Ralo o dia todo e não tem uma coisa para perguntar?", questionou, na última sexta (4).
Antes do episódio, em estratégia para suavizar sua imagem, Bolsonaro evitava demonstrar irritação com perguntas incômodas e chegou a fazer até afagos a jornalistas.
Em setembro, após café da manhã com diretores da Folha de S.Paulo, disse que não teria problema em se reunir com veículos de imprensa.
Agora, por recomendação de sua equipe de comunicação, tem priorizado conversas com os eleitores presentes no Alvorada, destacando pautas positivas e evitando assuntos incômodos, como o fato de não ter se pronunciado sobre a morte da menina Ágatha Félix, no Rio de Janeiro.
Bolsonaro também suspendeu os cafés que promovia com veículos de comunicação. No último deles, em julho, ele se referiu a nordestinos como "paraíbas" e disse que não havia fome no Brasil.
A última pesquisa Datafolha, divulgada em setembro, mostrou que a reprovação ao governo aumentou nos últimos meses até em grupos que eram simpáticos à gestão, como eleitores mais ricos e moradores da região Sul do país.
A estratégia de radicalização já havia sido adotada em julho, quando o presidente acirrou o tom após ser criticado pela indicação de um de seus filhos, o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), para a função de embaixador nos Estados Unidos.
Na época, ele criticou os jornalistas Miriam Leitão e Glenn Greenwald e atacou o então diretor do Inpe, Ricardo Galvão.