BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - O ministro Sergio Moro (Justiça) afirmou nesta sexta-feira (14) que foi um "descuido" repassar pistas de apuração contra o ex-presidente Lula por um aplicativo de mensagens ao procurador Deltan Dallagnol.
Os dados enviados não foram formalizados nos autos do inquérito, como prevê a lei.
Mensagens atribuídas ao ex-juiz e ao procurador, divulgadas no domingo (9) pelo site The Intercept Brasil, mostram que os dois trocavam colaborações quando integravam a força-tarefa da Operação Lava Jato. Ele disse agora não ter cometido nenhum ato ilícito.
"Nós lá na 13ª Vara Federal, pela notoriedade das investigações, nós recebíamos várias dessas por dia. Eu recebi aquela informação e, aí assim, vamos dizer, foi até um descuido meu, apenas passei pelo aplicativo. Mas não tem nenhuma anormalidade nisso. Não havia nem ação penal em curso", disse, na sede da Polícia Rodoviária Federal (PRF), em Brasília, para anunciar o início da operação de segurança da Copa América, que começa nesta sexta.
Em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo, Moro defendeu a legalidade do repasse de informações que aparece na troca de mensagens.
"Isso está previsto expressamente no Código de Processo Penal, artigo 40, e também no artigo 7 da Lei de Ação Civil Pública diz que 'quando o juiz tiver conhecimento de fatos que podem constituir crime ou improbidade administrativa ele comunica o Ministério Público'. Basicamente é isso, eu recebi e repassei. Porque eu não posso fazer essa investigação", disse o ministro.
Os dois artigos citados pelo ministro, no entanto, colocam a necessidade de que a notícia-crime seja formalizada nos autos, o que não ocorreu.
"Eu acho que simplesmente receber uma notícia-crime e repassar a informação não pode ser qualificado como uma conduta imprópria", disse o ex-juiz, nesta sexta.
"Eventualmente pode ter havido um descuido formal, mas isso não é nenhum ilícito, se é a indagação nesse sentido. Eu não cometi nenhum ilícito e estou absolutamente tranquilo de todos os atos que cometi enquanto juiz da Lava Jato", completou.
No diálogo vazado, Deltan diz que o denunciante com a suposta pista sobre o ex-presidente se recusou a falar a respeito com o Ministério Público e afirma a Moro que pensava em fazer intimação oficial com base em noticia apócrifa.
Moro consente e diz: "Melhor formalizar entao".
O ministro também falou sobre as investigações em andamento para identificar autores dos ataques em celulares de autoridades.
Há pelo menos quatro inquéritos abertos, entre eles o que apura a invasão à conta de Telegram do ministro.
Até agora, a PF identificou que arquivos foram capturados apenas do celular de Deltan e não de outros alvos.
Moro disse acreditar que os ataques tenham sido feitos por um grupo contratado.
"A Polícia Federal está empenhada, mas essas investigações às vezes levam algum tempo dada a dificuldade de rastrear. Eu não acredito que seja um autor só, acho que é um grupo criminoso contratado para atacar as instituições brasileiras", disse.
"Se eles acham que as instituições brasileiras são frágeis e vão se intimidar, eles estão completamente equivocados. O que vai acontecer é que eles vão ser identificados e punidos na forma da lei", completou.
SAÍDA DESCARTADA
O ministro da Justiça, Sergio Moro, afirmou, em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo, que não pretende deixar o cargo no governo de Jair Bolsonaro e descartou ter cometido ilegalidade nas mensagens trocadas com o procurador Deltan Dallagnol, da Lava Jato.
"Eu me afastaria se houvesse uma situação que levasse à conclusão de que tenha havido um comportamento impróprio da minha parte", declarou, na entrevista publicada nesta sexta (14).
Na entrevista, Moro voltou a questionar a autenticidade das mensagens. "Não excluo a possibilidade de serem inseridos trechos modificados, porque eles não se dignaram nem sequer a apresentar o material a autoridades independentes para verificação", disse.
"Até onde sei, não conseguiram pegar o conteúdo do meu Telegram. Poderiam ter pego, não tem problema nenhum quanto a isso. Mas não conseguiram, porque não estou no Telegram. Não tenho essas mensagens", afirmou.
"Eu reconheço a autenticidade de uma coisa e amanhã aparece outra adulterada", acrescentou.
Sobre as investigações da Polícia Federal em relação ao ataque, Moro afirmou que existem várias possibilidades, mas disse acreditar ter sido uma ação de um grupo criminoso organizado.
O ministro afirmou que não atuou em conluio com a força-tarefa da Lava Jato.
"Sempre pautei o meu trabalho pela legalidade. Os meus diálogos e as minhas conversas com os procuradores, com advogados, com policiais, sempre caminharam no âmbito da licitude. Não tem nada ali, fora sensacionalismo barato", disse.
"Quanto à natureza das minhas comunicações, estou absolutamente tranquilo", afirmou. "Nunca houve esse tipo de conluio. Tanto assim, que muitas diligências requeridas pelo Ministério Público foram indeferidas, várias prisões preventivas", ressaltou o ministro. "Se quiserem publicar tudo antes, publiquem, não tem problema."
"Sei que tem outros países que têm práticas mais restritas, mas a tradição jurídica brasileira não impede o contato pessoal e essas conversas entre juízes, advogados, delegados e procuradores", declarou ao jornal.
Segundo ele, o aplicativo de mensagens era apenas um "meio" de comunicação para coisas urgentes e esse tipo de conversa não compromete as provas e as acusações. "Até ouvi uma expressão lá de que eu era 'chefe da Lava Jato', isso é uma falsidade", disse.
Para o ex-juiz, o episódio das mensagens não terá impacto na condenação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva por causa do tríplex de Guarujá. "Foi um caso decidido com absoluta imparcialidade com base nas provas, sem qualquer espécie de direcionamento, aconselhamento ou coisa que o valha", afirmou.