Considerado por economistas um paliativo sem efeito para melhorar o cenário fiscal, o pacote anunciado pelo governo federal para compensar o sepultamento da reforma da Previdência abriu conflito entre Congresso e Planalto. Enquanto especialistas criticam as medidas, interlocutores do presidente Michel Temer tentam apaziguar os ânimos.
Principal fiador da política econômica, o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, ressaltou a importância das propostas e disse que a intenção não é interferir na autonomia do Legislativo para ditar as votações.
— Evidentemente que o Congresso é soberano e compete aos presidentes das Casas definir a pauta de cada um. A lista é algo que analisa e prioriza os diversos projetos de lei que já estão em tramitação. É uma definição técnica, objetiva, de quais são, na nossa visão, os projetos mais importantes — contemporizou Meirelles.
O mercado, contudo, permanece cético quanto à efetividade do pacote. A economista-chefe da XP Investimentos, Zeina Latif, classifica a lista do governo como incompleta e sem prioridades. Para ela, a escassez de tempo devido ao calendário eleitoral devia levar o Planalto a contemplar ações com maior impacto fiscal.
— Não está claro que há uma estratégia de governo — avalia.
Para o professor do Departamento de Economia da Universidade de Brasília José Luís Oreiro, não há no conjunto de iniciativas nenhuma medida capaz de atenuar, no médio e longo prazo, a situação fiscal do país:
— Ao trocar a reforma da Previdência pela intervenção no Rio, o governo ficou sem pauta econômica. Daí pegou um monte de coisas que estavam na gaveta, mas que não têm capacidade de solucionar o desequilíbrio das contas públicas.
Nos cálculos do Planalto, seria possível obter R$ 48 bilhões caso as propostas sejam aprovadas. A estimativa projeta o resgate de R$ 24,6 bilhões com a extinção do Fundo Soberano, R$ 12 bilhões com a venda da Eletrobras, mais R$ 11 bilhões com a reoneração da folha de pagamento.
Em contrapartida, o déficit previsto para 2018 é de R$ 153 bilhões. Os especialistas, contudo, alertam para possível frustração nas receitas.
— Pode ter um erro de projeção muito alto. Veja o exemplo da repatriação em 2017: o governo esperava um valor elevado e conseguiu só R$ 1,6 bilhão — lembra a pesquisadora do Instituto Brasileiro de Economia, da Fundação Getulio Vargas, Vilma Pinto.
No dia seguinte ao anúncio do pacote, feito na segunda-feira, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), classificou a relação de medidas como "café velho e frio", em referência ao fato de que os projetos, em sua maioria, já estão em tramitação e não são novidade. O presidente do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE), também reagiu ao que classificou de tentativa do Planalto de determinar a pauta do Legislativo.
Nesta quarta-feira (21), o ministro da Secretaria de Governo, Carlos Marun, botou panos quentes e disse que qualquer "mal-entendido" foi superado.
— Talvez, e sou uma pessoa que sou muito franca, antes de anunciar devêssemos ter trazido aqui e comunicado, mesmo que tivesse havido algumas discussões, alguns contatos, talvez. Mas isso já é coisa superada.