Documentos, provas e, principalmente, áudios entregues pela JBS e enviados ao Supremo Tribunal Federal (STF) nesta segunda-feira (4) levaram o procurador-geral da República Rodrigo Janot a anunciar revisão do acordo de delação premiada – o que pode até invalidá-lo.
Na manhã desta terça-feira (5), a revista Veja divulgou trechos de alguns áudios, mas o conteúdo completo do material ainda não é de conhecimento público.
A seguir, confira o que se sabe sobre o caso até agora:
1. Qual é o conteúdo dos áudios
A gravação de um diálogo com duração de quatro horas entre Joesley Batista, um dos donos da JBS, e Ricardo Saud, ex-diretor de relações institucionais do grupo, é o principal conteúdo conhecido até agora. O áudio seria o terceiro de um conjunto de quatro gravações repassadas em anexo referente ao senador Ciro Nogueira (PP-PI).
A conversa, segundo o procurador-geral, traz indícios "muito graves" de crimes, com potencial para anular o acordo de delação.
2. Quando ocorreu a gravação
A conversa entre Joesley e Saud teria ocorrido em 17 de março e registrada por equívoco, sem que os dois tivessem conhecimento. No início da gravação, o dois dão a entender que não têm certeza se o aparelho estava registrando a conversa. O áudio foi entregue pela própria JBS na quinta-feira passada (31).
3. De onde vieram os áudios
As gravações foram entregues pela defesa dos delatores da JBS à PGR, às 19h da última quinta-feira (31), para complementar as revelações feitas. O repasse do material em até 120 dias era uma das exigências para homologação do acordo, com o objetivo de confirmar as denúncias e para que não fossem acusados de omissão.
Os advogados da JBS pediram prorrogação do prazo por mais 60 dias, o que foi concedido pelo ministro Edson Fachin, relator da Lava-Jato no STF.
Mas a decisão só saiu na quinta-feira e a defesa não tomou conhecimento a tempo. Para não descumprir o acordo, entregou o material bruto.
4. Fachin decidirá sobre sigilio dos áudios
Na petição enviada ao STF, Janot pede que o ministro Edson Fachin, relator da Lava-Jato, decida a respeito do sigilo dos diálogos.
O Supremo tornou a gravação pública no início da noite desta terça-feira (5).
4. Por que será feita a revisão da delação
Devido à omissão dessas gravações, Rodrigo Janot determinou na segunda-feira (4) a abertura de investigação.
Pelo acordo, o colaborador está obrigado a falar sobre todas as condutas criminosas de que tem conhecimento. Por isso, o acordo de delação pode ser invalidado.
A revisão envolve três dos sete colaboradores: Joesley, Saud e Francisco de Assis e Silva, outro executivo da empresa.
5. Provas obtidas na delação não devem ser anuladas
Janot concedeu uma coletiva de imprensa na noite de segunda-feira (4) e entre suas afirmações disse que, mesmo que o acordo de delação venha a ser invalidado, as provas obtidas por meio dela e que levantam suspeitas inclusive sobre o presidente Michel Temer não devem ser anuladas.
6. Delatores podem ser punidos
A delação da JBS foi firmada em maio. Os donos da empresa conquistaram imunidade, com direito, inclusive, a deixar o país. Caso o acordo seja invalidado, eles podem perder todos os benefícios.
Os três colaboradores investigados pela JBS – Joesley, Saud e Assis e Silva – podem ser punidos também criminalmente e até presos.
Wesley Batista não é alvo do pedido de Janot e, com isso, a estratégia de poupá-lo e concentrar a autoria das irregularidades nas mãos de seu irmão Joesley deve ser intensificada com objetivo de dar seguimento ao processo de reestruturação do grupo J&F.
7. Quem mais pode ser prejudicado com os áudios
Ex-procurador Marcelo Miller: na conversa, Saud e Joesley falariam sobre a suposta atuação do ex-procurador Marcello Miller, que era assistente de Janot e, após deixar a PGR, passou a atuar em escritório de advocacia contratado pela JBS.
Segundo Janot, o áudio – gravado quando Miller ainda atuava na PGR – permite entender que o então procurador estaria auxiliando na confecção de propostas de colaboração para serem fechadas com a Procuradoria, o que configuraria, em tese, crime e ato de improbidade administrativa.
Ministros do STF: os áudios citam os nomes de três ministros do Supremo Tribunal Federal (STF): Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes e a presidente da Corte, Cármen Lúcia. Em nenhum deles, há menção ou atribuição a algum tipo de crime, de acordo com informações apuradas pelo jornal O Estado de S. Paulo.
O ex-ministro da Justiça José Eduardo Cardozo também é citado em trechos das gravações.
No início da noite desta terça, Cármen Lúcia divulgou vídeo em que afirma ter enviado à PF e à PGR ofício exigindo investigação imediata "a fim de que não fique qualquer sombra de dúvida sobre a dignidade deste Supremo Tribunal Federal e a honorabilidade de seus integrantes".
8. Quem pode se beneficiar e se prejudicar da revisão do acordo
Michel Temer: embora essa seja a questão mais controversa, alguns especialistas avaliam que o principal beneficiado com a divulgação desses áudios deve ser Michel Temer. Isso porque o presidente deixaria de ser o grande alvo de Janot, que está finalizando novas denúncias contra Temer para esses dias. Além disso, se os deputados já recusaram a primeira denúncia, as seguintes chegariam ainda mais enfraquecidas.
PGR: a Procuradoria e o próprio Janot também podem sair prejudicados, já que o ex-procurador Miller saiu da PGR direto para o escritório de advocacia que atendia a JBS. A colunista d'O Estado de S. Paulo Eliane Cantanhêde avaliou que, na prática, significa "que ele colheu todas as informações privilegiadas na PGR e foi negociá-las com o investigado. Ou seja, foi usá-las para ganhar dinheiro com a defesa de quem ele antes acusava". Janot teria ficado em uma situação, no mínimo, constrangedora.
9. Quem já se pronunciou sobre o caso até agora
Michel Temer: na China, o presidente falou rapidamente com jornalistas, na noite desta segunda-feira (4), sobre a decisão da Procuradoria-Geral da República (PGR) de revisar a delação da JBS. "Eu não falo sobre isso. Realmente, tenho que ter a maior serenidade, como sempre tive. Respeito todas as decisões que forem tomadas pela Justiça, pela Câmara dos Deputados, pela Procuradoria-Geral. Eu tenho que respeitá-las, mas não devo falar uma palavra sobre isso", disse Temer.
J&F: o grupo controlador da JBS afirmou, nesta segunda-feira (4), em nota, que a decisão da Procuradoria-Geral da República (PGR) de revisar o acordo de delação premiada dos executivos do grupo se deve a uma "interpretação precipitada dada ao material entregue" pela defesa. De acordo com o grupo, situação será "rapidamente esclarecida, assim que a gravação for melhor examinada".
Gilmar Mendes: durante viagem a Paris, nesta terça-feira (5), o ministro do STF Gilmar Mendes voltou a criticar a delação da JBS, dizendo que ela é "extremamente problemática" e que o Supremo já havia levantado dúvidas sobre a legalidade do acordo.
Marco Aurélio de Mello: o ministro do STF afirmou que, ao não esclarecer quem são os citados nos áudios, o procurador-geral lança suspeita sobre os 11 integrantes da Corte. "Que se dê nome aos bois. Em nome da transparência, o procurador Janot deveria ter falado quais foram os ministros e procuradores citados no áudio. As pessoas vão achar que todos os ministros e todos os procuradores estão envolvidos em atos ilícitos", disse Mello.
Douglas Fischer: o ex-integrante da força-tarefa da Operação Lava-Jato em Brasília e o procurador regional da República afirmou que Joesley Batista poderá ser preso se o acordo de colaboração premiada for revogado pelo STF. A detenção, no entanto, só seria autorizada pela Corte caso o delator possa prejudicar as investigações.
João Otávio de Noronha: o corregedor nacional de Justiça, ministro João Otávio de Noronha, afirmou que "certamente" a imagem do Supremo Tribunal Federal (STF) já está arranhada em meio a menções de delatores do grupo J&F à Corte. No entanto, ressaltou que não acredita que qualquer ministro do STF esteja envolvido em irregularidades no caso.
Rodrigo Janot: o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, disse que viveu na segunda-feira (4) "um dos dias mais tensos" do cargo ao anunciar que pode rever o acordo de delação dos executivos da J&F. Ao falar sobre o cargo, ele afirmou que o momento da decisão é "solitário".
10. O que dizem os colunistas de ZH