O Congresso tem pressa. Fustigados pela Lava-Jato e pelo descrédito na política, deputados e senadores correm para aprovar mudanças nas regras das eleições de 2018. A prioridade é a criação de um fundo eleitoral de R$ 3,6 bilhões em recursos públicos para custear as próprias campanhas eleitorais. Para entrar em vigor já no próximo pleito, as novas medidas precisam ser aprovadas em dois turnos, na Câmara e no Senado, até 7 de outubro.
Foi sob a ameaça desse prazo exíguo que os deputados invadiram a madrugada de quarta-feira (9) e a tarde desta quinta-feira (10) votando o relatório da comissão especial da reforma política. Criada em outubro do ano passado, a comissão trabalhou durante 10 meses, mas as mudanças aprovadas foram mínimas: em suma, as novidades são a implementação do voto majoritário para deputados federais, estaduais e vereadores, com a criação do chamado distritão, além do fundo eleitoral. Nesta quinta, após o debate de destaques da reforma se estender até o fim da tarde, a comissão ficou sem quórum e os trabalhos devem ser retomados na próxima semana.
– Trata-se de uma estratégia de sobrevivência política. Os deputados querem garantir a reeleição e manter o foro privilegiado, já que quase todo mundo usou caixa 2 – diz o analista político Antônio Queiroz, do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar.
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Considerada pauta unânime entre os congressistas, o dinheiro para as campanhas virá do chamado Fundo Especial de Financiamento da Democracia. Ele será mantido com 0,5% da receita corrente líquida da União e repartido entre as siglas de acordo com a representação de cada uma no Congresso. A medida é uma resposta à proibição ao financiamento privado das candidaturas, determinada em 2015 pelo Supremo Tribunal Federal (STF). A discussão sobre o suporte público das campanhas cresceu após a penúria enfrentada pelos partidos nas eleições municipais do ano passado, a primeira sem doações empresariais.
– A continuar do jeito que está, termina o processo eleitoral e vai todo mundo para o processo penal. Não tem condição de se fazer eleição sem perspectiva de financiamento. O passado vai se repetir e, repetindo o passado, vai estar todo mundo condenado – afirma o deputado Danilo Forte (PSB-CE), em referência à prática de caixa 2.
Mudança no sistema eleitoral ainda é impasse
Já a criação do distritão gera mais polêmica. O modelo prevê a eleição dos candidatos mais votados em cada Estado, diferentemente do sistema atual, pelo qual os mandatos são distribuídos de forma proporcional aos votos recebido pelos partidos ou coligações. Em 2015, a medida havia sido colocada em votação pelo então presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), mas acabou rejeitada em plenário. Agora, mais uma vez, atende aos interesses dos principais líderes do Congresso, entre os quais os atuais presidentes da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE).
A aprovação do distritão na comissão foi costurada em jantar oferecido por Eunício na terça-feira (8). Sentarem-se em torno de uma mesa na varanda da residência oficial do Senado 21 políticos – entre eles os ex-presidentes José Sarney (PMDB) e Fernando Collor (PTC-AL).
– O que ficou acertado aqui hoje é que há de se fazer mudanças no sistema eleitoral. Primeiro, com o distritão – disse o presidente do Senado ao final do jantar.
No dia seguinte, obedecendo às orientações, a comissão aprovou por 17 votos a 15 emenda do PMDB que criava o novo sistema. A medida teve apoio de PSDB, DEM, PP e PSD. O placar apertado projeta votação complicada em plenário e divisões internas – entre os tucanos, dois deputados desobedeceram à orientação partidária e se abstiveram. Boa parte da oposição e pelo menos quatro partidos da base governista já anunciaram que irão votar contra o distritão no plenário.
Eles estudam a formação de frente para manter o sistema atual, com o fim das coligações na eleição proporcional e criação de cláusula de barreira para impedir o acesso ao tempo de propaganda e ao fundo partidário às legendas que não obtiverem votação mínima.
– A ideia é manter o sistema atual, mas renovado. Quando se institui a cláusula de desempenho e com o fim de coligação, você já acaba com meio mundo de malandragem – justifica o líder da minoria na Câmara, José Guimarães (PT-CE).
Diante da resistência entre os deputados, Eunício reagiu. Questionado sobre a montagem de bloco contra a medida, disse que o assunto é pacífico entre os colegas:
– Se não vier assim da Câmara, nós vamos incluir o distritão aqui no Senado.