Prevista na lei brasileira desde o ano passado, a conversão da prisão provisória em domiciliar para gestantes e mães de filhos pequenos que beneficiou a ex-primeira-dama do Rio de Janeiro Adriana Ancelmo pode influenciar futuras decisões judiciais. Não é uma determinação inédita, mas a repercussão do caso deve tornar o benefício mais usual.
– Há outras decisões semelhantes, mas pouco difundidas, justamente porque não se trata de uma pessoa "famosa". Mas esse caso vem em benefício de outras apenadas, pelo princípio da isonomia – diz a defensora pública Cíntia Luzzatto.
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A autorização para o cumprimento da prisão em casa está entre as mudanças no Código de Processo Penal conhecidas como Marco Legal da Primeira Infância, em vigor há um ano. A lei permite que presas provisórias (aquelas que ainda não foram condenadas) tenham a detenção convertida em domiciliar caso estejam grávidas ou sejam mães de crianças de até 12 anos – o benefício também está previsto para homens, desde que ele seja o único responsável pelo filho.
Ainda recente, a lei por si só não tem sido suficiente para converter a prisão. Normalmente, segundo a defensora pública, a liberação está condicionada a outros elementos do processo, como a presa ser primária. É que a regra dá a possibilidade de o juiz substituir a detenção, mas não a obriga.
– Essa medida tem repercutido nas penitenciárias femininas, onde houve uma redução no número de mulheres grávidas, porque começa a se ter a visão de que a mãe ou a gestante deve ser presa exclusivamente em casos efetivamente necessários. Não é algo totalmente estranho (o caso de Adriana) e também tem atingido mulheres de baixa renda, mas geralmente aquelas que são primárias ou cometeram crime sem violência – observa Patrícia Fraga Martins, juíza da Vara de Execuções Criminais.
No Rio Grande do Sul, um terço das 1.893 detentas do sistema carcerário são presas provisórias, ou seja, ainda aguardam julgamento. Não há, porém, um levantamento de quantas estão grávidas ou têm filhos pequenos e, consequentemente, poderiam ser beneficiadas pela mesma medida que favoreceu Adriana.
Acusada de corrupção, lavagem de dinheiro e organização criminosa pela força-tarefa da Lava-Jato no Rio de Janeiro, a ex-primeira-dama fluminense, mãe de um filho de 11 e outro de 14 anos, teve o benefício concedido em caráter liminar pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) na sexta-feira. Ela aguarda uma vistoria da Polícia Federal (PF) em sua casa, na zona sul do Rio de Janeiro, para deixar o complexo penitenciário de Bangu.
Após a transferência, Adriana não terá acesso a telefones celulares, telefones fixos e internet. O caso ainda passará pela análise do plenário e, se houve recurso do Ministério Público Federal (MPF), pode chegar ao Supremo Tribunal Federal (STF),
– Esse caso inaugura um debate sobre o assunto, e o que virá pela frente servirá como um divisor de águas na aplicação desse instituto. Haveria, por exemplo, um desequilíbrio no tratamento entre homens e mulheres porque o marido não pode se beneficiar dessa medida? – questiona o professor de Direito Penal na PUCRS Marcelo Peruchin.