As incertezas sobre novos desdobramentos da Operação Lava-Jato, que apura corrupção na Petrobrás, estão emperrando a venda de ativos de grandes empreiteiras envolvidas nas investigações. Em conversas adiantadas com a chinesa China Communications Construction Company (CCCC), as negociações entre a Camargo Corrêa e a gigante asiática pararam diante de um impasse: a falta de segurança jurídica para blindar a chinesa de heranças decorrentes das investigações da Lava-Jato, afirmaram fontes.
Também é o caso da Odebrecht Ambiental, do grupo Odebrecht, que foi negociada com a gestora canadense Brookfield. O fundo se comprometeu a comprar 70% da empresa, mas aguarda os processos de delação premiada e leniência do conglomerado baiano para concluir o negócio.
– O risco é que a punição se estenda a todas as empresas do grupo. Se não se sabe o valor da multa, fica difícil fechar o preço do ativo – disse um advogado que acompanha negociações entre construtoras e investidores estrangeiros.
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Parte de bancos estrangeiros, sobretudo de origem americana, também está impedida de assessorar transações de empresas envolvidas na Lava-Jato, afirmou uma fonte do mercado financeiro.
– Há muitos ativos à venda no Brasil e isso tem atraído interessados. Mas os investidores passaram a ter mais cuidado em fechar negócios com empresas envolvidas em corrupção – disse outra fonte.
No caso da Camargo Corrêa, que desembolsou um total de R$ 804 milhões por participação em cartel, fraude e corrupção, a empresa não encontrou dificuldades para vender a Alpargatas, em 2015, e a CPFL, no ano passado, por exemplo. Mas as conversas entre os herdeiros da terceira geração da família, que assumiram o comando dos negócios no ano passado, e a chinesa CCCC, representada no Brasil pelo banco Modal, foram interrompidas no fim do ano.
– Não havia um acordo assinado de exclusividade entre as empresas, mas um interesse mútuo de que o negócio seria levado adiante – disse uma fonte a par do assunto. O Estado apurou que o interesse da CCCC pelo "acervo técnico" da construtora continua, mas a estatal chinesa não tem mais tanta pressa de retomar as conversas.
No fim do ano passado, a CCCC comprou 80% da Concremat Engenharia, por R$ 350 milhões, e está em processo final para assumir o projeto do porto intermodal da WTorre, em São Luís, no Maranhão. Os chineses também têm interesse nas ferrovias Transnordestina – já sinalizou ao governo – e na Norte-Sul. Procurados, representantes da CCCC não comentaram.
Reestruturação
A construtora, fundada em 1939 por Sebastião Camargo, que deu início ao império da família, foi a primeira a admitir participação nos esquemas de cartel e propina na Petrobrás e setor elétrico. O grupo também teve o nome envolvido na Operação Castelo de Areia, deflagrada em 2009 e que investigou crimes financeiros e de lavagem de dinheiro.
A terceira geração da família está à frente de um amplo processo de reestruturação e nova governança do conglomerado, que migrou de um modelo de grupo empresarial para se tornar uma holding gestora de portfólio de empresas investidas.
Além de procurar um sócio minoritário para a Loma Negra, da InterCement, braço do grupo no setor de cimento, a Camargo também pode vender a participação de 50% no Estaleiro Atlântico Sul (EAS). O empreendimento, em sociedade com a Queiroz Galvão, tem uma dívida de cerca de R$ 2,5 bilhões e está em reestruturação.
– Todos os estaleiros no País estão à venda, mas ninguém vai comprar nada neste momento – disse outra pessoa a par do assunto. O grupo vai passar a investir mais em empreendimentos imobiliários.
– Na Andrade, tudo que não faz parte do core business da empresa está à venda – afirmou uma fonte próxima da companhia. ê o caso da PPP do Sistema Produtor São Lourenço, que também já despertou interesse da CCCC, e participação em empresas de energia, como a Cemig e Hidrelétrica Santo Antônio.
Com os ativos à venda, a companhia tenta se concentrar na busca de novos serviços. No ano passado, a empresa mineira, criada em 1948, conquistou dois novos contratos: de R$ 2 bilhões, para construir linhas de transmissão, e de R$ 100 milhões, para duplicar uma estrada no interior de São Paulo. Neste ano, conseguiu dois contratos de US$ 300 milhões para construir duas plantas industriais na Argentina.
A empresa, multada em R$ 1 bilhão pelo esquema de corrupção, também disputa alguns contratos importantes, como uma duplicação de rodovia no Paraná, da CCR - empresa da qual é sócia com a Camargo - e de uma barragem de rejeitos. "Ainda é muito pouco para uma construtora do tamanho da Andrade, mas é uma notícia boa no meio de tantas ruins", afirmou uma fonte do setor.
Empreiteiras traçam futuros distintos
Duas das mais tradicionais empresas de construção do Brasil, Andrade Gutierrez e Camargo Corrêa, colocaram à venda quase tudo que podem para se manterem de pé. A lista de empreendimentos vai de hidrelétricas a estaleiros e de estádios a cimenteiras, num movimento que começou depois da Operação Lava Jato, que escancarou esquemas de corrupção envolvendo empreiteiras, estatais e políticos.
Com o faturamento em queda e quase nenhum novo contrato em carteira, o movimento de venda de ativos se intensificou nos últimos meses e virou a principal saída para reforçar o caixa dos grupos. As estratégias, porém, são diferentes. Na Andrade Gutierrez, a ordem é voltar às origens e se focar na construtora. Na Camargo Corrêa, os herdeiros querem se desfazer da empreiteira e se tornar uma holding de investimentos.
Segundo o Estado apurou, a família controladora da Camargo estava em conversas firmes com a chinesa China Communications Construction Company (CCCC) para vender 100% da construtora, mas as negociações foram interrompidas em novembro passado. Havia uma expectativa de que as conversas fossem retomadas a partir deste ano. Mas, por ora, as chances de um acordo diminuíram. Fontes a par do assunto afirmam que o negócio é avaliado em cerca de US$ 1 bilhão.
Nos últimos anos, especialmente por causa das concessões, as empreiteiras viraram grandes investidoras em áreas estratégicas, como o setor de infraestrutura. No caso da Andrade, o objetivo hoje é pegar o caminho inverso. A empresa já se desfez de participações na Oi e na Sanepar (empresa de saneamento do Paraná).
Agora colocou à venda a participação na Cemig, no estádio Beira-Rio, em Porto Alegre, e no Sistema Produtor São Lourenço - uma parceira público-privada de saneamento em São Paulo. Por ora, o único ativo fora de qualquer negociação é a CCR, empresa que administra concessões na área de transportes e que também tem como sócia a Camargo Corrêa. Procurada, a Andrade não comentou.
Mudança
Na Camargo, com a decisão de sair da construção e virar uma holding de investimentos, ativos importantes já foram vendidos. No fim de 2015, a empresa se desfez da Alpargatas, por R$ 2,7 bilhões. No ano passado, vendeu a participação de 23% na CPFL para a chinesa State Grid, por R$ 5,85 bilhões.
Hoje, segundo fontes, a companhia quer vender sua fatia no Estaleiro Atlântico Sul (EAS) e busca um comprador para parte da cimenteira Loma Negra, da Argentina. Mas, assim como a Andrade, descarta vender sua participação na CCR.
Procuradas, a construtora e a InterCement, o braço da Camargo no setor de cimento, não comentaram o assunto. A Camargo disse que, com a efetivação da venda da CPFL, encerrou o processo de readequação do seu portfólio e que não venderá mais ativos. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
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