Mais do que a economia, a imposição da lei por meio de operações como a Lava-Jato foi um motivo de otimismo sobre a América Latina, na quarta-feira, em uma sessão do Fórum Econômico Mundial. As investigações sobre corrupção no Brasil foram citadas como um dos sinais de avanço institucional na região. O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, sentado na plateia, foi convidado pelo coordenador do encontro, o professor Ricardo Hausmann, de Harvard, para falar sobre o caso brasileiro. Outros episódios foram lembrados.
A economista Rebeca Grynspan, ex-vice-presidente de Costa Rica e atual dirigente da Secretaria-Geral Ibero-americana, citou a queda, no ano passado, do presidente da Guatemala, o general aposentado Otto Pérez Molina. Acusado de corrupção pelo Ministério Público, depois de um ano e meio de investigação, o presidente guatemalteco perdeu imunidades, cassadas pelo Parlamento, e renunciou depois de manifestações em várias cidades.
Generais saem de cena e agora governos são confrontados por promotores, comentou Rebeca.
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O sucesso alcançado até agora pela Lava-Jato, disse Janot, reflete a afinação e a independência institucional do sistema de Justiça, tanto na promotoria quanto no Judiciário. O Ministério Público Federal, acrescentou, tem trabalhado com transparência e independência.
O chefe do MPF enfatizou, além disso, a cooperação entre as promotorias do Brasil e de outros países. Citou especialmente o Paraguai, representado no debate pelo presidente Horacio Cartes, e a Suíça. No fim da sessão, Janot cumprimentou Cartes, um dos debatedores, e elogiou o Ministério Público do Paraguai.
Instituições em funcionamento foram a grande novidade apresentada no debate, admitiu depois da sessão o professor Hausmann.
Ele não deixou, no entanto, de apontar um dado negativo: as investigações sobre a Odebrecht produziram resultados e respostas oficiais nos países latino-americanos, como Colômbia, Peru e Equador, mas o governo da Venezuela continuou em silêncio.
Ex-ministro do Planejamento da Venezuela e ex-economista-chefe do Banco Interamericano de Desenvolvimento, Hausmann usou duas vezes a palavra "catástrofe" ao mencionar a situação econômica e política de seu país de origem.
Sucesso
A presença do presidente paraguaio, convidado para participar do debate, é mais um sinal do recente sucesso de seu país entre os analistas econômicos. Em outubro de 2015, em Lima, o diretor do Fundo Monetário Internacional (FMI) para a América Latina, Alejandro Werner, contrastou o bom desempenho econômico do Paraguai com o mau estado de seus vizinhos e parceiros de maior peso, Argentina e Brasil.
Cartes falou das mudanças na economia paraguaia em termos muito simples. Há mais transparência, afirmou, e hoje qualquer um pode saber quanto ganha um agente público. O dinheiro manejado pelas autoridades é do contribuinte e preciso sempre lembrar esse fato e usar os meios públicos com cuidado, comentou.
– Não há milagre – disse.
Poderia ter citado a atração de investimentos estrangeiros, incluído grupos do Brasil, mas foi moderado. A economia paraguaia deve crescer 4% neste ano, repetindo o desempenho de 2016, comentou o presidente do Paraguai depois da sessão.
Repetindo o comentário feito há mais de um ano por Werner, do FMI, Hausmann chamou a atenção para a diferença entre a condição do Paraguai e a situação de Brasil e Argentina, ainda estagnados, e em seguida mencionou a "catástrofe" da Venezuela, com alguns dos piores indicadores econômicos do mundo.
De modo geral, os comentários sobre as condições econômicas da América Latina foram negativos. Afetada pela baixa dos preços dos produtos básicos, observou Hausmann, os países da região precisam buscar novas fontes de dinamismo e de sucesso comercial.
Inovação
O diretor-geral da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE), mencionou como dados positivos a realização de reformas no México e a melhora da situação no Paraguai. De modo geral, cobrou dos latino-americanos mais esforços para aumentar a produtividade e reduzir a informalidade e a desigualdade. Insistiu de forma especial no tema da inovação. Os países da região gastam de 0,5% a 0,7% do PIB com essa atividade. Na Coreia, o investimento no esforço de inovação chega a 4% do PIB. Não há, portanto, como competir, quando pouco se aplica em pesquisa tecnológica e científica e no desenvolvimento de competências.
Rebeca Grynspan defendeu maior empenho na educação, especialmente na qualidade, e também na inovação e na melhora da infraestrutura, como condições para aumentar o dinamismo e a competitividade da região.
Os temas de agora são os mesmos do ano 2000, disse o escritor e colunista do jornal O Estado de S. Paulo Moisés Naim, ex-editor da revista Foreign Policy, ex-ministro de Indústria e Comércio da Venezuela e hoje membro do Carnegie Endowment for International Peace. Para sair dos temas econômicos de sempre, lembrou a convivência com crime, um assunto menos discutido. A América Latina, disse, tem 8% da população mundial e 31% dos homicídios e pouco fazem os governos para cuidar disso.
O tom da conversa mudou somente quando reapareceu o tema da corrupção e Ricardo Hausmann pediu a Rodrigo Janot um comentário sobre as investigações no Brasil. Com a intervenção de Rebeca Grynspan o dado positivo se ampliou: algumas instituições estão funcionando na América Latina. Há algo mais, na região, que o bom desempenho econômico do Paraguai.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.