Na parede do gabinete do deputado Edegar Pretto (PT), no 12º andar do Palácio Farroupilha, com vista para o Palácio Piratini e a Praça da Matriz, dois detalhes chamam atenção: o retrato oficial de Dilma Rousseff com a faixa presidencial e um quadro com a foto desbotada de um menino magricela, trovando com um dos líderes do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST), no acampamento da lendária Encruzilhada Natalino, em 1982. Sobre a foto, os versos cantados pela dupla naquele dia histórico. O homem é Adão Pretto, que em 1986 se elegeria deputado estadual, inaugurando a representação do MST no Legislativo gaúcho. O menino é "o guri do Adão", que nesta terça-feira assume a presidência da Assembleia.
Quarto dos nove filhos de Adão Pretto, João Edegar nasceu em Coxilha do Ouro, interior de Miraguaí, e cresceu sendo chamado assim: o guri do Adão. O pai, gaiteiro e trovador, compôs os versos que falam da preocupação com o futuro do filho, fadado a migrar para a cidade e trabalhar como empregado por falta de terra para exercer a vocação de agricultor. Embora a essência da trova seja o improviso, Adão Pretto escreveu os versos e Edegar decorou a parte que lhe cabia. Eram autobiográficos: a propriedade de 22 hectares não seria suficiente para tantos filhos. Ele trabalhou na roça até os 15 anos, quando trocou a enxada pela militância política.
Leia o artigo publicado em ZH nesta terça-feira:
Edegar Pretto: o Parlamento a serviço da democracia
Leia mais:
Mesmo com pressão de Meirelles, governo do RS descarta ceder Banrisul
Sartori espera fechar socorro financeiro da União em duas semanas
Estado pode perder 8 mil professores em 2017
Aos poucos, o menino que chegou a pensar em ser padre foi dominando a arte da trova. A gaita verde com que Adão se apresentava nos comícios e nos atos do MST ele jamais aprendeu a tocar. Herdou-a em fevereiro de 2009 quando o pai, no exercício do quarto mandato de deputado federal, morreu de pancreatite aguda aos 63 anos. O enterro trouxe a Porto Alegre o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva e sete ministros. Entre eles, sua chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff.
Com a morte de Adão, o grupo que o apoiava insistiu para que Edegar concorresse a deputado estadual. Ele já era íntimo da Assembleia. Primeiro, como filho curioso, depois como assessor dos deputados Antônio Marangon e Dionilso Marcon. Edegar concorreu em 2010 e foi eleito com 69.233 votos, o quarto na classificação geral e o primeiro entre os deputados do PT. Em 2014, ampliou a votação para 73.122 e foi novamente o campeão entre os candidatos petistas, credencial que garantiu a escolha como presidente da Assembleia no ano destinado ao partido.
Além dos eleitores do pai, herdou parte da equipe que trabalhava com ele, incluindo o dublê de cantor e motorista Severiano Telles e o gaiteiro Daniel Machado, que nesta terça-feira estarão em frente à Assembleia entretendo o público concentrado na Praça da Matriz para prestigiar a posse do filho do Adão. Os três integram o grupo Cantadores do Povo, que anima reuniões políticas e encontros do MST interpretando músicas regionais e canções compostas especialmente para tratar da luta pela terra.
No plenário, a cerimônia será sóbria. Edegar não pretende reinventar o protocolo, como outros presidentes já fizeram, nem tem projetos mirabolantes para os próximos 12 meses:
– A gestão é compartilhada. Temos um projeto de quatro anos. Vamos dar continuidade na administração. A Assembleia não é presidencialista. Quem decide a pauta é o colégio de líderes. E eu vou seguir o regimento interno.
Aos companheiros que esperam dele oposição ferrenha ao governador José Ivo Sartori, já avisou:
– Não esperem de mim nenhuma irresponsabilidade.
Se depender da vontade de Edegar Pretto, o que deve mudar, sim, em comparação com os últimos dois anos é o cenário na Praça da Matriz em dias de votações polêmicas. O futuro presidente não quer ver o prédio do Legislativo cercado por grades e protegido pela Brigada Militar. Para que medidas extremas não sejam necessárias, diz que vai conversar com os sindicatos:
– Queremos manter as portas abertas e resolver os conflitos pelo diálogo.
Nos últimos dias, a pretexto de entregar em mãos o convite para a posse, Pretto conversou com líderes de movimentos sociais e com representantes de outros poderes e instituições. Também tem sido permanente o diálogo com deputados da base do governo. Aos que temem a aceitação de um pedido de impeachment do governador José Ivo Sartori, como produto da disputa política, Edegar tranquiliza:
– Não serei um Eduardo Cunha. Se entrar algum pedido, ele será analisado pela Procuradoria da Assembleia, como foi o do Cpers, e arquivado pela presidente Silvana Covatti.
A relação com Silvana não poderia ser mais amistosa. Os dois são da mesma região. Com 13 anos, Edegar foi morar em Frederico Westphalen para trabalhar no comitê regional do PT na primeira campanha do pai. Quem era seu professor de matemática? Vilson Covatti, ex-deputado e marido de Silvana.
– Era um ótimo professor – elogia.
Formado em Gestão Pública, Edegar marcou a atuação na Assembleia pelo compromisso com duas causas: a defesa do pequeno agricultor e o combate à violência contra mulher. Foi ele o idealizador do Susaf, um sistema de fiscalização que pode ser definido como um passaporte para pequenos produtores venderem para outros municípios. Hoje, no dia mais importante de sua trajetória política até aqui, é provável que use uma gravata rosa ou lilás para reforçar o compromisso com as mulheres.
O perfil
Nome: João Edegar Pretto
Nascimento: 17 de junho de 1971, em Miraguaí, então distrito de Tenente Portela
Formação: gestão pública
Casado com a jornalista Aline Tyska, tem os filhos Yuri, 26 anos, João, um ano, e Ângelo, que nasce em setembro
Pais: Adão Pretto e Otília Tavares da Silva Pretto, já falecidos