Após pedir demissão do governo Michel Temer nesta sexta-feira, o ex-ministro da Cultura, Marcelo Calero, acusou o ministro de Governo, Geddel Vieira Lima, de tê-lo pressionado a produzir um parecer técnico para liberar uma obra que favorecia seus interesses pessoais. As informações são do jornal Folha de S. Paulo.
Segundo Calero, Geddel teria o procurado pelo menos cinco vezes para que o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), órgão ligado ao Ministério da Cultura, aprovasse um projeto imobiliário nos arredores de uma área tombada em Salvador, base de Geddel. Conforme Calero, Geddel teria afirmado possuir um apartamento no empreendimento que dependia da autorização para sair do papel.
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Em entrevista ao jornal Folha de S. Paulo, Calera afirmou que assim que assumiu a pasta foi alertado pela então presidente do Iphan, Jurema Machado, que um empreendimento imobiliário na Bahia despertava interesses imobiliários. Jurema teria ainda recomendado especial atenção com possíveis mobilizações políticas em torno do assunto.
Segundo Calero, demorou menos de um mês para que Geddel o procurasse pela primeira das cinco vezes. Calero descreve assim uma das ligações, recebida na noite de uma sexta-feira:
– Ele pedia minha interferência para que isso acontecesse, não só por conta da segurança jurídica, mas também porque ele tem um apartamento naquele empreendimento. Ele disse: "E aí, como é que eu fico nesta história?" – disse Calero à Folha.
Em outra ligação, Geddel teria levantado rumores de que o Iphan nacional iria negar a construção. De acordo com Calero, a conversa foi em tom agressivo:
– Ele disse: "Então você me fala, Marcelo, se o assunto está equacionado ou não. Não quero ser surpreendido com uma decisão e ter que pedir a cabeça da presidente do Iphan. Se for o caso eu falo até com o presidente da República" – conta Calero.
Após a ligação, em 28 de outubro, Calero teria conversado sobre a situação com a nova presidente do Iphan, Kátia Bogéa, e levantando a possibilidade de ambos se retirarem do governo.
– Avisei que se ela saísse, eu sairia também. Mas sairemos com a cabeça erguida – afirma Calero.
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Em 16 de novembro, na última quarta-feira, o Iphan embargou a obra, determinando que a empreitera adequasse o projeto para 13 andares – o projeto original previa 30 andares. O empreendimento que gerou o conflito está no entorno de uma área tombada e, por isso, é sujeito a regramento especial.
De acordo com o ex-ministro da Cultura, em um evento no mesmo dia da determinação do Iphan, Geddel acionou vários interlocutores para pressioná-lo a rever a decisão.
– Mas eu estava tranquilo porque a decisão tinha sido técnica – diz Calero.
O ex-ministro pediu demissão nesta sexta-feira. Em entrevista à Folha, ele afirmou que não se enquadra na "lógica" dos políticos:
– Estou fora da lógica desses caras, não sou político profissional. Não tenho rabo preso. Não estou aqui para fazer maracutaia. Nós precisamos ter a coragem de dizer: "Daqui eu não passo". Vou voltar a ser um diplomata de carreira que passou em quinto lugar num concurso, estudando e trabalhando ao mesmo tempo.