Ao pedir as prisões de Eduardo Cunha (RJ), José Sarney (AP), Renan Calheiros (AL) e Romero Jucá (RR) – os quatro do PMDB –, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, aterrorizou Brasília. Ao mesmo tempo em que temeristas e dilmistas tentavam projetar o impacto no processo de impeachment, as duas coalizões se uniam em torno de um tema: o receio de que as prisões de parlamentares se banalizem.
– Precisa da denúncia, investigação, um processo normal para poder condenar e prender. Na medida em que se começa a prender todo mundo, não vai sobrar ninguém – ponderou o senador Paulo Rocha (PT-PA).
Leia mais:
Janot deve ter elementos ainda não conhecidos para pedido, dizem juristas
Isso é uma brincadeira com o Supremo, diz Gilmar Mendes
Rosane de Oliveira: Pedidos de Janot ameaçam futuro do governo Temer
Acuados pela extensão da Operação Lava-Jato e das delações, parlamentares das bases de Michel Temer e Dilma Rousseff adotaram tom cauteloso, repetindo a necessidade de acesso ao conteúdo da solicitação de Janot ao Supremo Tribunal Federal (STF). Nos pedidos sobre Renan, Jucá e Sarney, são esperados elementos além das gravações do ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado.
– A situação é gravíssima. Acredito que a PGR (Procuradoria-geral da República) tenha mais provas. Apenas os áudios são insuficientes para determinar prisão de parlamentar – avaliou o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP).
Dos quatro pedidos, o que teve maior repercussão interna foi o de Renan, presidente do Senado. No caso de Cunha, nada de surpresas. O deputado já havia sido alertado do risco diante das novas manobras para atrapalhar investigações no Conselho de Ética da Câmara e na Justiça. Um integrante do conselho, inclusive, relatou à PGR que foi ameaçado pela tropa de choque do presidente afastado da Casa.
Referendo de eventuais detenções em debate
A blindagem de Renan também protegeu Jucá e Sarney. Até petistas, que herdam a presidência do Senado caso o alagoano seja afastado ou preso, foram comedidos, pois não há certeza de que o STF acatará a demanda de Janot. No Planalto, a aposta é de que Renan é fundamental para efetivar os acordos de bastidores que viabilizam a aprovação do impeachment. Aliados de Temer e Dilma sabem que, se o Supremo segurar o senador, ele será decisivo no resultado do julgamento.
– Temos de esperar a decisão do Supremo, não temos como julgar ainda – disse o senador Humberto Costa (PT-PE).
Parlamentares de PMDB, PT, PSDB, DEM, PP e PSB já discutem o que fazer caso as prisões de Renan, Jucá e Cunha sejam autorizadas, o que obrigará votações nos plenários da Câmara e do Senado para confirmar ou relaxar as detenções. A tendência é seguir a posição do STF, como no caso do senador cassado Delcídio Amaral.
A cautela para discorrer sobre a situação dos caciques do PMDB é distinta do tratamento conferido a Delcídio. Depois da surpresa matinal pela prisão do então senador, ele se tornou "indefensável" com a divulgação das conversas em que tramava a fuga de Nestor Cerveró.
– O caso é parecido com o de Delcídio, mas não sou eu quem vai dizer se deve haver prisão ou não – disse Cristovam Buarque (PPS-DF).
Um dos senadores que votou a favor do processo de impeachment, Buarque admite possibilidade de rever posição. Reforça a articulação por novas eleições para a Presidência, também defendida pela Rede e por setores do PT, que cobram a suspensão do processo de impeachment até que o STF defina as prisões.
Congressistas questionam intimidação ao parlamento
Causou desconforto no Congresso alguns dos motivos que estariam nos pedidos de prisão de Renan Calheiros (AL), Romero Jucá (RR), José Sarney (AP) e Eduardo Cunha (RJ), todos do PMDB. Deputados e senadores consideram que apontar intenção de modificar leis como tentativa de obstruir apurações seria exagero da Procuradoria-Geral da República (PGR).
Em uma das conversas gravadas pelo ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado, Renan defendeu mudanças na legislação sobre delação premiada, que, na visão de integrantes da PGR, dificultariam as apurações da Operação Lava-Jato. Parlamentares entendem que é prerrogativa da função apresentar projetos e que eventuais manobras a favor da impunidade devem ser derrubadas na tramitação das propostas.
– Pedir a prisão por uma possível tentativa de mudar uma lei é um motivo frágil. Por isso, esperamos o conteúdo completo dos pedidos – afirma o senador Lindbergh Farias (PT-RJ).
A situação provocou constrangimento entre petistas da Câmara, que em fevereiro aplaudiam projeto do deputado Wadih Damous (PT-RJ) para permitir delações apenas de acusados ou indiciados em liberdade, na contramão do que é feito na Lava-Jato.
– A colaboração premiada ficará isenta de coação, impondo clara e inafastável liberdade do colaborador em querer ajudar a Justiça – explicou Damous à época.
Reclamação por "censura" de opiniões
Contrário à mudança, o deputado Henrique Fontana (PT-RS) prega análise caso a caso para indicar eventuais manobras:
– Há casos em que um parlamentar, em requerimento ou projeto, pode defender uma empresa ou alguém de forma criminosa, mas isso tem de ser provado.
Congressistas também reclamam de uma espécie de "censura" imposta pela PGR.
– Pensar, opinar e emitir juízo de valor sobre qualquer tema, até onde sei, não pode ser considerado crime – afirmou o líder do PSDB no Senado, Cássio Cunha Lima (PB).
OUTRAS REPERCUSSÕES
"(Não há) nenhum constrangimento (no governo em razão dos pedidos de prisão). Não acho nada. Estou aguardando os desdobramentos dos acontecimentos para, aí, achar alguma coisa".
Geddel Vieira Lima (PMDB)
Ministro-chefe da Secretaria de Governo
"Já tivemos situação como esta (denúncia envolvendo o ex-ministro Romero Jucá que resultou em seu afastamento do governo Temer), e a bancada do governo não deixou que essas coisas contaminassem nosso trabalho aqui. A base está unida em torno da pauta de interesse do país".
André Moura (PSC-SE)
Líder do governo na Câmara
"Todos estamos perplexos, sem saber como vamos administrar isso (pedidos de prisão). Nos traz muita preocupação na medida em que estamos julgando um caso tão grave quanto é o processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff".
Ana Amélia Lemos (PP-RS)
Senadora
"Temos que esperar a decisão do Supremo. Não temos como julgar ainda, mas é claro que provoca instabilidade política".
Humberto Costa (PT-PE)
Senador
"Não se pode criar no Brasil um estado policialesco nem tampouco pedir prisão de quem quer que seja sobre opiniões emitidas sobre qualquer assunto".
Cássio Cunha Lima (PB)
Líder do PSDB no Senado
"Algo dessa gravidade tem que vir necessariamente acompanhado de um arrazoado, de um conjunto de informações que o justifiquem. Não tivemos ainda acesso a essas informações. Não seria adequado que nos antecipássemos".
Aécio Neves (PSDB-MG)
Senador