Mesmo com seis meses previstos para prepararem a implantação da Lei de Acesso à Informação, raros órgãos públicos brasileiros se organizaram para atender os cidadãos. Segundo especialistas, isso é comum: a mudança mais profunda a ser provocada é cultural.
- Uma lei não muda um hábito de 300 anos de idade, que é o governo manter para si as informações - diz o norte-americano Charles Davis, diretor da Coalizão Nacional pela Liberdade de Informação, e professor de jornalismo da Universidade do Missouri.
Nos Estados Unidos, as leis de liberdade de informação existem desde os anos 1970. Segundo Davis, o processo de implantação foi semelhante: no início, não havia estrutura, treinamento e disposição para prestar dados aos cidadãos. Os avanços são significativos - sonegar listas de funcionários públicos, hoje, é impensável -, mas ainda há disputas.
- Ainda temos de brigar diariamente - ressalta o professor.
No Reino Unido, as normas que abrem o governo ao público entraram em vigor em 2005, e a pesquisadora da ONG Campaign for Freedom of Information, Katherine Gundersen, diz que o país ainda se adapta à legislação. Apenas com a contestação da imprensa e de organizações civis, muitas vezes na Justiça, foram definidas regras mais claras sobre o que é público e o que é privado - discussão que, no Brasil, vem sendo feita na questão da divulgação nominal de salários.
- No início, os governos eram muito cautelosos. À medida em que a sociedade insistiu, foram repassando mais dados - conta a inglesa.
Segundo o especialista em acesso à informação da FGV/SP Fabiano Angélico, apenas o governo federal fez treinamento e definiu normas internas para atender os requerimentos do público. Em Estados, municípios e nos poderes Judiciário e Legislativo, a lei enfrenta resistência.
- Muita gente não compreendeu o que a lei significa - afirma.
Segundo Angélico, mesmo em casos de dúvida - como, por exemplo, na divulgação nominal de salários dos servidores -, o espírito da lei deixa claro que a preferência é pela divulgação.
- É como no futebol, na regra do impedimento, que, na dúvida, manda dar o gol. Neste caso, na dúvida, se divulga - diz o especialista.