Dormir na própria loja ou passar a madrugada acordado e de olho nas câmeras de segurança. Estas foram algumas das medidas adotadas por comerciantes da Rua Pinheiro Machado, em Caxias do Sul, diante de uma recente sequência de arrombamentos e furtos. Os relatos de empresários vizinhos no bairro São Pelegrino são de que os arrombamentos são mais comuns aos finais de semana, mas também ocorrem durante a semana. E as ações são rápidas: em poucos minutos, os criminosos arrebentam uma porta ou janela, invadem, recolhem objetos de valores e desaparecem. Quando os seguranças particulares ou policiais militares chegam, depois que os alarmes tocam, os criminosos já sumiram.
— Estamos neste ponto há quase 15 anos. Antes, era um caso ou outro, algo bem esporádico e com crimes de menor prejuízo. Agora é toda a noite. Desde o início do ano é um problema, mas está se intensificando e ficando cada vez pior. Agora (em setembro), os ataques ocorreram quase todo dia. Dificilmente passa duas noites que não tenha tentativa de invasão — conta um lojista que trabalha próximo da Rua La Salle.
Um dos mais prejudicados foi um empresário de 54 anos, que teve seu empreendimento atacado três vezes nos últimos quatro meses. O primeiro arrombamento foi quase no amanhecer de 24 de junho. Os criminosos voltaram um mês depois, em 25 de julho, por volta da 1h. No terceiro caso, os bandidos estouraram a corrente, na madrugada de 26 de agosto, mas o alarme tocou e eles fugiram sem levar nada.
— Entre vidros quebrados, grade, ferramentas e dinheiro do caixa, foram mais de R$ 12,5 mil de prejuízo. Sem falar outras tentativas menores (flagradas pelas câmeras, como mostra o vídeo abaixo). A gente trabalha o dia inteiro para vir uns delinquentes desses... É uma vergonha. Não cheguei a dormir (na loja), mas continuo pensando em tomar essa atitude. Preciso fazer alguma coisa, né? — reclama o empresário, que também tem a identidade preservada.
Os furtos e arrombamentos, costumeiramente, são relacionados a usuários de drogas. Em São Pelegrino, as imagens captadas recentemente próximo das lojas atacadas mostram suspeitos, em bicicletas, que ficam perambulando e checando fechaduras para cometer seus crimes. A partir das imagens e dos relatos compartilhados pelos lojistas, ação no bairro central parece ser organizada.
— Pelas câmeras de segurança, vemos os criminosos na madrugada, alguns de bicicleta, outros a pé, parece ter até carro dando apoio. Não consigo mais dormir. Vou para casa e fico no computador olhando as câmeras. Cheguei a flagrar cinco na frente da minha loja um: dois tentam arrombar a porta e os outros vão nas esquinas para cuidar a movimentação. Quando percebem a luz piscante (de uma viatura policial), eles desaparecem — relata outro empresário.
Par a lojistas, solução é mais policiais e guardas nas ruas
Baseada em suas estatísticas, que consideram os registros de ocorrência, a Brigada Militar (BM) afirma não perceber uma onda de crimes em São Pelegrino. Entre julho e 28 de setembro, foram registrados 12 furto/arrombamento, furto qualificado e outros furtos na Rua Pinheiro Machado, segundo o comando do 12º Batalhão de Polícia Militar (12º BPM). Os dados representam 2,5% do total de 473 registros no período, entre crimes tentados e consumados. O major Wagner Carvalho, subcomandante do 12º BPM, afirma ainda que a amostragem mostra uma redução neste tipo de delito: foram oito casos relatados em julho, três em agosto e apenas um em setembro. Estas ocorrências reúnem as feitas por policiais militares e também no pronto atendimento da Polícia Civil.
Os empresários relatam que são bem atendidos pela BM, tanto no módulo do Parque Cinquentenário quanto pelo telefone 190. No entanto, esperam por uma resposta da polícia.
— Nas madrugadas, quando ligo, a BM vai lá, chega em até cinco minutos, só que esses caras são organizados e fogem antes. Os policiais não podem fazer milagre. Eles dizem que não tem como ficar de guarda e que, para prender, teriam que pegar em flagrante (durante ou depois do arrombamento). É complicado — lamenta um dos empresários.
O grupo cogita fazer um abaixo-assinado para levar às lideranças da segurança pública.
— O movimento (de suspeitos) começa a partir da meia-noite, bastante gurizada. Não sentimos segurança e não passa uma viatura por aqui. Igreja, mecânica, hamburgueria, todo final de semana tem alguma vítima. Uma cidade como Caxias precisa ter policiais ou guardas circulando nas ruas. Até o busto levaram na cara deles. A cidade está uma vergonha — desabafa outro empresário lembrando o furto do busto do Duque de Caxias na Praça Dante Alighieri.
O major Carvalho ressalta que é importante fazer o registro de ocorrência mesmo em casos de pequeno prejuízo, como ações em que bandidos arrombaram uma fechadura, mas não invadem o empreendimento. Estes dados oficiais são utilizados pelo 12º BPM para entender os problemas da cidade, traçar estratégias de combate e distribuir o efetivo.
As vítimas já registraram boletins na polícia, mas estão desacreditadas:
— Chega lá, registra a ocorrência e tchau. É só para registrar e não acontece nada. Todos os outros (empresários) já fizeram, mas até agora não tivemos nada de resposta (da Polícia Civil). Depois (do prejuízo) pouco adianta também. O que precisamos é de segurança nas ruas.
Responsável pela investigação dos delitos na área central, o delegado Vitor Carnaúba, da 1ª Delegacia de Polícia, explica que identificar autores de furtos e arrombamentos é uma missão complicada. O processo fica ainda mais difícil quando envolve moradores de rua e usuários de drogas, que logo trocam os produtos levados em qualquer ponto de tráfico.
— O registro é importante porque, mais do que fundamentar a investigação, serve de apoio para orientar o patrulhamento da Brigada. Nos crimes de furtos, quando não é pego em flagrante, é difícil depois ter a prova, principalmente quando as imagens não ajudam na identificação. Outro ponto é que, no crime de furto, mesmo com uma prisão, não significa que o autor ficará preso. Temos esta experiência que logo estão em liberdade de novo — diz o delegado.