A entrada de drogas e celulares nas cadeias gaúchas é um problema histórico, só que o combate está cada dia mais difícil com o crescimento do uso de drones para realizar as entregas por cima dos muros. Em Caxias do Sul, sete aparelhos já foram abatidos neste ano. Um deles tem preço de mercado de R$ 45 mil. A média de quase um drone apreendido por mês ainda é considerada baixa diante da quantidade de tentativas de entregas. A insistência criminosa levou representantes da segurança pública a procurarem universitários e a direção do aeroporto de Caxias do Sul em busca de uma alternativa.
A ideia é combater tecnologia com tecnologia, mas ainda não foi encontrada uma alternativa viável. No momento, a vantagem é dos criminosos. Os drones utilizados são capazes de ultrapassar os 80 metros de altura e voar a mais 70km/h, com capacidade de ficar 30 minutos pelos ares. Os relatos da guarda são de que os aparelhos se aproximam de forma silenciosa e dificilmente são avistados a olho nu.
Nos drones mais populares, a distância de transmissão do controle remoto chega a sete quilômetros quando não há interferência — o que é o caso na Penitenciária Estadual, no distrito do Apanhador, onde os equipamentos são mais utilizados na prática criminosa. Ou seja, além de não identificar o drone nos ares, os agentes da segurança pública também não conseguem localizar os seus operadores.
— São drones muito potentes, operados a distância por GPS, então não conseguimos nem identificar onde estão. Por vezes, nem o barulho conseguimos ouvir e visualizar. Estão cada vez mais complexos, sabem a coordenada para se aproximar e largar o pacote no pátio (do presídio). Já abatemos drone levando dois quilos de droga — relata o major Wagner Carvalho, subcomandante do 12º Batalhão de Polícia Militar (12º BPM).
Responsável pelo controle das cadeias gaúchas, a Superintendência dos Serviços Penitenciários (Susepe) não se manifesta sobre o problema. A justificativa, repassada pela assessoria de imprensa, é que está sendo feito um projeto "sobre a questão dos drones" e, só após, a superintendência irá se manifestar. O tal projeto ainda não tem uma data definida para conclusão.
Sobre a entrada de drogas e celulares nas cadeias de Caxias do Sul, o delegado penitenciário regional, Marcos Ariovaldo, admite que é um problema cada vez maior e afirma que toda semana acontecem apreensões — a Susepe não divulga estes números.
— Agora (com o relaxamento das medidas contra o coronavírus), tivemos a retomada das visitas íntimas, então tivemos a volta deste problema (pessoas que escondem drogas e celulares em seus corpos). Tem os arremessos (por cima dos muros), que são volumosos, e tem os drones também. São as três principais formas que flagramos. Geralmente, nos pacotes, vem os dois (droga e celular). Fazemos revistas no telhado, no canil e encontramos também no pátio. Por isso, é difícil precisar um horário, mas acontece de dia e de noite — admite Ariovaldo.
O uso de drones se acentuou nesta época de pandemia, justamente, pelas visitas, que eram a principal forma de entrada de ilícitos, terem sido suspensas por um longo período de tempo. Como são adquiridos para prática de crimes, os drones não são registrados e não respeitam regras impostas pela Agência Nacional de Aviação Civil (Anac).
Como os drones não são feitos para transporte de cargas, e sim fazer imagens, não há informações de quanto peso conseguem transportar. De acordo com os policiais caxienses, a maior apreensão foi a do pacote com dois quilos de drogas. Segundo a Polícia Civil, os aparelhos apreendidos estão parcialmente destruídos em razão dos tiros e não funcionam. Após o inquérito policial, eles serão encaminhados ao Poder Judiciário.
Uma possibilidade cogitada é a colocação de telas sobre os pátios na penitenciária do Apanhador. Contudo, conforme a Susepe, para isso, seria necessário reforçar as estruturas que circundam as áreas descobertas das três galerias para que suportem o peso da cobertura. Um estudo chegou a ser feito, mas não há definição sobre a questão, já que demanda investimento. Nos bastidores, é considerado que os presos poderiam romper a tela graças ao tempo livre que possuem e o baixo número de servidores para vigiá-los nos pátios. No presídio regional, apesar de o pátio ser circundado por muros, a estrutura também precisaria de reforço para a colocação de cobertura de tela. Da mesma forma, não há previsão para que isso ocorra.
Comportamento dos cachorros alertou sobre drone
Um dos sete drones abatidos em 2021 foi flagrado na noite de 26 de agosto. Os relatos dos agentes penitenciários foram de que o equipamento não foi ouvido ou avistado. Foram os cães da penitenciária que alertaram sobre a entrega. Com a audição aguçada, os cachorros se esconderam. Foi o sinal para os agentes vasculharem os céus.
Para fazer as entregas, os criminosos amarram um longo e resistente fio no drone. Ao se aproximar do pátio das galerias prisionais, o equipamento precisa baixar de altitude. Foi neste momento que os policiais penais avistaram o pacote pendurado e atiraram contra o drone. O abate resultou na apreensão de três celulares, três fones de ouvido e dois cabos USB — a pouca carga é mais um indício de que as viagens de drone são rotineiras.
A ação dos policiais penais recebeu um voto de congratulações do vereador Alexandre Bortoluz (PP).
— Sabemos que com a tecnologia avançando se tornou mais fácil a prática deste crime. Não é a primeira vez, é algo que está se tornando corriqueiro. São carregamentos de drogas e celulares que, volta e meia, os policiais penais e militares se deparam. É importante reconhecer a importância deste combate.
À frente da Comissão de Segurança da Câmara de Vereadores, Bortoluz afirma que a questão dos drones já foi debatida em encontros no Legislativo e se apresenta como um aliado neste movimento dos bastidores na busca por uma melhor forma de conter os equipamentos.
— Ainda tentamos achar um case (exemplo) específico para ver como podemos diminuir esta quantidade de ocorrências. A melhor forma me parece ser conseguir alguma tecnologia para combater esta tecnologia. Pretendemos agendar uma nova reunião, onde chamaremos especialistas, para tentar encontrar este caminho e, depois, pleitear mudanças com o Governo do Estado — afirma o parlamentar.
Drones são "importados" e investigação é complexa
Os sete drones em Caxias do Sul foram abatidos a tiros por agentes penitenciários e policiais militares que fazem a guarda externa nas proximidade da Penitenciária do Apanhador, que fica próximo a RS-453, na divisa com São Francisco de Paula. A origem e propriedade dos equipamentos estão em investigação pela Delegacia de Repressão às Ações Criminosas Organizadas (Draco).
— Rastrear (a compra) é uma linha de investigação, mas a maioria é adquirida no exterior, principalmente, no Paraguai. Alguns modelos nem tem no mercado nacional. Cada um tem suas especificações, mas pela distância (de operação) é muito raro acontecer uma prisão (em flagrante). Esta é uma investigação bastante complexa — relata o delegado Luciano Pereira.
Os inquéritos policiais estão em andamento, por isso, poucos detalhes são divulgados. A Polícia Civil confirma que nenhuma prisão foi feita referente aos drones apreendidos.
No ano passado, a BM efetuou uma prisão em flagrante envolvendo um drone avaliado em R$ 7 mil. O aparelho estava em um carro, com quatro tripulantes, que se aproximou da cadeia no Apanhador na tarde de 15 de abril. Na ação, foram apreendidos sete tijolos de maconha e 400 gramas de cocaína que seriam despejados na casa prisional.