Com a orientação para que as pessoas evitem sair de casa diante da pandemia do coronavírus, as autoridades de segurança pública ficaram em alerta. O temor era que aumentassem os casos de violência doméstica, o que parecia ser uma tendência mundial. No entanto, o primeiro mês de restrições teve redução nos casos atendidos pela Lei Maria da Penha no Rio Grande do Sul. A Polícia Civil cogita que a queda nas estatísticas aconteça mais pelo fato da falta de comunicação das agressões, já que as vítimas não estão saindo de casa, do que por uma real redução na violência.
Em março, 1.793 mulheres gaúchas foram agredidas fisicamente por familiares. O número, que ainda é considerado alto, foi o menor do trimestre — uma redução de 13% na comparação com a média de janeiro e fevereiro. Em Bento Gonçalves, os casos de lesão corporal caíram pela metade: 10 em março contra 21 em fevereiro.
— Entendo o número oficial reduzir como uma diminuição das comunicações (dos fatos), mas não acredito que representem a realidade. É histórico e fático que a violência aconteça muito mais quando as pessoas passam mais tempo em casa. A probabilidade de que esta violência esteja acontecendo é grande, como sempre aconteceu — opina a delegada Deise Brancher, da Delegacia Especializada em Atendimento à Mulher (Deam).
Os números também tiveram redução em Caxias do Sul, principalmente nos registros de ameaça. As duas maiores cidades da Serra são as únicas da região com delegacias especializadas contra a violência doméstica. No entanto, ambas reduziram os atendimentos presenciais em razão do novo coronavírus.
— Era uma tendência mundial (o aumento da violência contra mulher), mas ainda não conseguimos observar por aqui. Houve diminuição na procura pela delegacia, mas ampliamos as informações por telefone. Antes, pedíamos para (as vítimas) virem até a delegacia, para ter este "corpo a corpo" e entender o caso. Agora, optamos por fazer por telefone — aponta a delegada Carla Zanetti, que ressalta o crescimento dos registros online no período.
— De 16 a 31 de março, foram 992 registros na delegacia online, que é um número considerado alto. Ainda mais pensando que é uma ferramenta nova (para registros de Lei Maria da Penha).
A Coordenadoria da Mulher também aponta redução nos atendimentos e em abrigos na Casa Viva Raquel. O fato de os filhos também estarem mais em casa pode ser um fator para possíveis vítimas evitarem procurar ajuda.
— Há o medo de sair de casa e se expor ao vírus, mas também é um momento em que todos podem estar mais acomodados. As crianças estão sem escola, então as mulheres precisam controlar mais a situação. Os bares também estão fechados, afinal geralmente é alcoolista que faz este tipo de violência. São vários fatores sociais e psicológicos envolvidos — aponta a coordenadora em Caxias do Sul, Vera Lúcia Prá Rech.
Número de feminicídios se mantém, o que preocupa
Em março, 11 mulheres foram assassinadas em razão de gênero no Rio Grande do Sul. É o maior número de feminicídios em um mês deste ano, mas o dado é semelhante a média do ano passado, por isso não é possível relacionar com as restrições do coronavírus. Ainda assim, o número preocupa. No ano passado, foram 97 feminicídios no Estado e o primeiro trimestre de 2020 já contabiliza 23 casos. Foram dois feminicídios na Serra em 2020, em Nova Petrópolis e Canela, ambos no mês janeiro.