Uma senhora simpática, que gostava de caminhar e conversar com os vizinhos na rua. É assim que os moradores do bairro Fátima Alto descrevem a aposentada Eva da Silva e Britto, 76 anos. Foi numa dessas voltas pelo bairro que a idosa foi vítima de uma bala perdida e morreu na madrugada sexta-feira para sábado (8). Quatro dias após o crime, a Polícia Civil ainda busca por pistas e testemunhas para identificar o atirador. Vítimas de balas perdidas causam espanto, mas esse tipo de crime não é tão comum em Caxias (leia mais abaixo).
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O ataque que matou Eva aconteceu em frente a um bar na Avenida Dr. Renato Del Mese, a menos de 500 metros da casa da idosa. O alvo seria Júlio César dos Santos, 24 anos, que morreu no local. O proprietário do estabelecimento confirma que a dona Eva não estava no bar e nem acompanhava Santos.
— Era quase meia-noite, quando ele (Santos) chegou, pediu uma cerveja e foi para fora. Quando saiu, já foi recebido a tiros. Só percebi isso, as balas voando. Depois, já vi a dona Eva caída. Ela não entrou no bar, estava apenas passando (na calçada). Era uma pessoa boa que conversava com toda a vizinhança. Deu os tiros contra o homem, e atingiu ela também — lamenta Antônio Vilmar Silveira Ferreira.
Dona Eva morava havia 25 anos no bairro Fátima e deixa três filhos e 10 netos. A aposentada morava sozinha e cuidava de gatos e cachorros, uma paixão que sempre passou a família.
— Ela comprava briga com todo mundo para defender os bichinhos. Sempre dizia que o melhor amor que se tem é o dos animais. Ela era uma pessoa muito lúcida aos 76 anos. Se não fosse esta fatalidade, tenho certeza que ela passaria dos 100 anos. A minha mãe estava muito bem, caminhava muito, por horas todo o dia. Era muito disposta — conta o filho Enaldo Jorge Britto de Freitas.
Sobre o crime, a família não tem muitas informações. No bairro, há um boato que o ataque seria resultado de uma desavença antiga de Júlio Cesar dos Santos — o alvo dos tiros. Freitas aguarda pelas investigações da Polícia Civil, mas o principal sentimento é de desolação pela sua mãe estar passando pelo local errado na hora errada.
— Sempre escutamos na televisão casos de balas perdidas, principalmente com crianças. Nunca imaginei que fosse acontecer com alguém da minha família. Não tem o que fazer, tu está apenas caminhando e ser atingida por um tiro. Ela era minha heroína. Era minha mãe e meu pai. Era tudo para mim — lamenta.
"Vítima de uma circunstância", afirma delegado
Apesar de evitar falar sobre investigações, o delegado Adriano Linhares confirma que Eva foi vítima de uma bala perdida. O titular da Delegacia de Homicídios não comenta se já foram identificados suspeitos e se algum automóvel foi utilizado no crime.
— É uma vítima de uma circunstância. Foi uma fatalidade, de fato. Ela é uma vítima, não era o alvo do criminoso. (Para a investigação,) não faz diferença. É um duplo homicídio. (O autor) assumiu o risco de matar (mais pessoas) — afirma Linhares.
Desde 2016, Caxias do Sul contabiliza 487 assassinatos. Destes, 390 foram cometidos com armas de fogo. Muitos desses homicídios são praticados com diversos tiros, principalmente quando estão relacionados com o tráfico de drogas. Felizmente, o número de vítimas de balas perdidas são baixos. O último caso seria de setembro de 2016 (veja quadro abaixo).
A estatística surpreende até o responsável pela Homicídios. Ainda assim, o delegado Linhares ressalta que este tipo de crime não pode ser banalizado e, por isso, precisa de uma resposta eficiente pelas forças do Estado.
— Têm tiros a toda hora. Agora, precisamos apurar com maior propriedade, rigor e intensidade. Para que não se repita. Estamos trabalhando. Mas, ainda é muito cedo. Homicídio é um crime complexo. Qualquer coisa que falarmos pode prejudicar — comenta.
Inicialmente, a Polícia Civil descarta que o ataque no bairro Fátima tenha relação com o outro assassinato registrado na noite de sexta-feira. Esse crime aconteceu cerca de 30 minutos antes do duplo homicídio, quando Eleandro Perotti, 45, foi encontrado baleado na Rua Maravilha, no bairro Industrial. O delegado Linhares também prefere não se manifestar sobre esta investigação.
OUTRAS VÍTIMAS DE BALA PERDIDA
29 de março de 2018
Meninas baleadas em saída de escola
Duas meninas de seis anos foram baleadas durante um ataque a tiros na saída da Escola Fundamental Luciano Corsetti, no Kayser. O alvo era Josué da Silva Castilhos que também foi atingido e sobreviveu. Os dois autores estavam em uma motocicleta e realizaram o ataque justamente no horário de saída dos estudantes. As duas meninas baleadas sobreviveram. Castilhos seria assassinado em julho daquele ano.
A investigação identificou dois primos como sendo os autores. Eles foram denunciados pelo Ministério Público por tripla tentativa de homicídio. O réu João Vitor Soares da Silva responde em liberdade, enquanto Daniel Grade da Silva permanece em prisão preventiva. Ambos foram pronunciados e aguardam pelo Tribunal do Júri, que ainda não tem data para acontecer.
18 de setembro de 2016
Jovens mortos durante ataque em saída de festa
Érica da Silva dos Santos, 20 anos, e Iago Jacinto da Motta, 23, morreram durante um ataque a tiros na saída de uma festa no Clube Rodeio, na Avenida São Leopoldo. Segundo a investigação da Polícia Civil, os tiros não eram para eles: um homem teria saído do estabelecimento e voltado em seguida para atingir um segurança, mas errou o alvo.
Sete dias após o ataque, a Polícia Civil capturou Daniel da Rosa Jordan, o Carpa. Ele permaneceu recolhido até 12 de janeiro de 2017, quando foi autorizado a responder o processo em liberdade. Ele responde por duplo homicídio triplamente qualificado e outras três tentativas de homicídio.