Passava do meio dia de sábado, dia 7 de setembro, quando um grupo de manifestantes autoproclamados como Grito dos Excluídos e das Excluídas, aproximava-se do prédio da Eberle, na esquina das ruas Sinimbu com a Marquês do Herval, em Caxias do Sul. Entre eles, estavam estudantes, representantes dos movimentos de defesa dos direitos das mulheres, dos negros, do movimento LGBT+, e militantes progressistas.
Tudo transcorria em paz, apesar do esvaziamento da Sinimbu, porque o protocolo oficial do Desfile da Independência informou do final do evento assim que os últimos carros da Guarda Municipal aproximavam-se do palanque oficial, em frente à Praça Dante Alighieri, onde estava o prefeito Daniel Guerra e demais autoridades. Ou seja, mesmo antes de o grupo aproximar-se do palanque, as autoridades e parte do público já havia debandado.
Entre os gritos de ordem, dos manifestantes, estava a frase: "Tira a tesoura da mão e valoriza a educação!", que faz crítica aos cortes anunciados pelo governo Bolsonaro. A proposta orçamentária para 2020, prevê redução de 18% dos recursos totais do Ministério da Educação, além de restringir verbas de projetos sociais como o Minha Casa e Minha Vida e o Bolsa Família.
Na pauta de críticas desse movimento dos excluídos e das excluídas, que se mobilizaram em Caxias, estava também o grito a favor da preservação da Amazônia. Em meio aos manifestantes, haviam ainda pessoas com camisetas e cartazes em defesa do ex-presidente do Brasil Luiz Inácio Lula da Silva (PT), com o bordão "Lula Livre" sendo entoado.
A polarização literalmente ocupa as ruas, como se percebeu neste desfile em Caxias. Assim como o presidente Jair Messias Bolsonaro (PSL) tem proclamado que enfim o Brasil se vê livre da cor vermelha, em uma alusão aos partidos políticos assumidamente à esquerda, que usam a cor vermelha como símbolo de suas bandeiras, os defensores desse novo Brasil também assumem esse discurso. Enquanto que a oposição procura dar voz e vasão ao que entende ser um retrocesso toda essa mobilização por um país que caminha mais à direita.
Em um determinado momento, alguns manifestantes do Grito dos Excluídos e Excluídas aproximaram-se de um pequeno grupo de defensores do Brasil verde e amarelo, sob a tríade Deus, pátria e família e trocaram agressões verbais.
Logo essa discussão deixou de ser apenas verbal e passou para uma fase mais crítica, de confronto físico. Leia a seguir o relato, escrito por Raul Cardoso Silva, estagiário de psicologia do Centro de Referência LGBT+:
"Após encerrar nosso desfile com o Centro de Referência LBGT+, que ocorreu pacificamente, nos unimos ao Grito dos Excluídos e das Excluídas, composto pelos movimentos sociais estudantis, das mulheres, de pessoas negras, professores e demais militâncias.
Nós, do centro de referência, decidimos andar de mãos dadas, atrás de todo bloco. O público se dividia entre aplausos e vaias. Entre os que vaiavam, na altura da Catedral Diocesana, um grupo de aproximadamente seis pessoas usavam a bandeira de escudo para proferir ofensas e nos cuspir.
A Cleo (Cleonice Araújo), foi até a bandeira, sentou-se junto a eles e disse: "Eu também sou Brasil". Me dirigi até ela, temendo a reação dos demais. Foi então que começaram a nos empurrar, cuspiram na Cleo, e enquanto eu tentava apaziguar a situação, um homem se lançou sobre a Cleo, que por sua vez reagiu.
O tumulto se instaurou. Eu, que busquei conter a situação e apartar a briga, fui agredido pela Brigada, que surgiu violentando a Cleo, confundindo contenção com agressão. Então, a Cleo foi algemada, e eu agredido com cacetetes. O homem que a agrediu não foi. Qual critério adotam para definir uma situação de risco? A violência após o desfile a favor do patriotismo, revela a situação desta pátria pária, mãe hostil.".
A versão oficial da Brigada Militar, relatada através do Boletim de Ocorrência (BO), revela que: "ela (Cleonice Araújo) foi contida por uma guarnição da BM, que fez uso de força moderada". A seguir leia um trecho do BO que foi revelado ao Pioneiro. O texto integral não foi liberado pela BM.
"Cleonice (Cleunice Araújo) entrou em vias de fato contra duas pessoas, devido a elas irem de encontro à manifestação da Cleonice, que pisou na bandeira do Brasil. Cleonice teria se alterado e entrado em luta corporal, agredindo as pessoas. Logo após, ela foi contida por uma guarnição da BM, que fez uso de força moderada e conduziu a ela (Cleonice) e mais uma testemunha para a delegacia para o devido registro. Duas das vítimas (nomes preservados pela BM) tiveram pequenas lesões".
Confira a seguir um vídeo que mostra um dos momentos do confronto entre manifestantes de oposição e pro-Bolsonaro:
Confira a seguir galeria de fotos da manifestação do Grito dos Excluídos e das Excluídas:
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