A indústria já percebeu há anos que a inovação é necessária. Não é de hoje que o turismo projeta o crescimento por meio da profissionalização e de um plano de governo para o setor. E a agricultura só enxerga a sobrevivência com a flexibilização das leis sanitárias e ambientais, no fortalecimento do cooperativismo e da agroindústria. Esses são apenas alguns dos desafios listados pelas lideranças para a Serra gerar empregos, garantir a competitividade e se manter como sinônimo de pujança. Muito disso exige atenção do governo do Rio Grande do Sul e nem tudo depende de recursos públicos. Se temos muito para crescer, falta o impulso e a política de Estado para facilitar novas oportunidades e direcionar o que há de melhor.
Os números mostram a necessidade de crescimento. Desde 2013, ano em que a crise econômica começou, foram 21 mil postos de trabalho fechados nas principais cidade da Serra, a maioria em Caxias do Sul _ embora 2018 tenha sinalizado com mais contratações do que demissões. O setor que mais clama por apoio é o da indústria. O estágio de desenvolvimento com parque instalado, diversificado e especializado é um ponto forte, mas segmento se fragiliza pela baixa cultura voltada à tecnologia, a retração dos últimos anos, desigualdade de renda entre os municípios e desindustrialização forçada pelas importações da China, entre outros dilemas.
— Há um movimento de repensar a cidade para daqui 20/40 anos. Existe o que trouxe Caxias do Sul até aqui agora, mas hoje precisamos reavaliar modelos tradicionais, as matrizes da Serra, para atrair talentos. Aqui se perde muito os talentos por falta de incentivos. São empresas, startups, ideias que não encontram ambiente favorável para continuar, expandir — constata a diretora de Projetos e Inovação da Câmara de Indústria, Comércio e Serviços (CIC) de Caxias do Sul, Grasiela Tesser.
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Para o Conselho Regional de Desenvolvimento (Corede) da Serra, que abrange 32 municípios, o processo de inovação é imprescindível para a sustentabilidade do setor produtivo, com a criação de parques tecnológicos, arranjos produtivos locais e trabalho intensivo na área de tecnologia. Esse processo requer a constituição de grupos de pesquisa no âmbito das empresas da região, podendo contar com apoio de pesquisadores vinculados à Universidade de Caxias do Sul (UCS).
— Grandes empresas já possuem este histórico em nossa região. Agora, médias e pequenas empresas precisam difundir a cultura da inovação desde a direção da empresa até o piso de fábrica — pondera Mônica Mattia, coordenadora-executiva do Corede Serra.
Antes da inovação, porém, é necessário corrigir um problema histórico, reconhece a atual secretária estadual do Desenvolvimento Econômico, Ciência e Tecnologia (SDECT), Susana Kakuta.
— Precisamos ser um Estado de inovação. Para isso, é obrigatório gerar talento para esse novo futuro e a qualidade do ensino tem que dar salto quantitativo na educação básica — aponta Susana.
A opinião é compartilhada pelo professor Enor Jose Tonolli, coordenador do único Parque Tecnológico da Serra, o TecnoUCS, que vem dando um sopro de frescor na economia a partir da instalação de startups. O TecnoUCS surgiu há quase três anos para criar, atrair, instalar e desenvolver empresas de base tecnológica e científica e apoiar a competitividade por meio da pesquisa e outras ações. Não tem sido fácil.
— Temos dificuldades em fazer um desenvolvimento mais acelerado, porque justamente a tríplice hélice (governo, academia, iniciativa privada) não se articula adequadamente e a hélice mais deficitária de todas é o governo. Parques de Porto Alegre e São Leopoldo tiveram em algum momento iniciativas políticas de fomento e essas iniciativas desapareceram por 2013/2014. De lá para cá, não existe mais fomento ao desenvolvimento científico e tecnológico — recorda Tonolli, sugerindo uma maior clareza por parte do próxima gestão.
O papel do Estado, na visão do professor, pode ser o de financiador ou de facilitador para que a iniciativa privada invista em pesquisas básica e aplicada. Hoje, as empresas investem por conta e risco. A continuidade de projetos, que não sejam suspensos ou interrompidos a cada quatro anos, também é um apelo entre a classe empresarial e acadêmica.
— Vários dos parques tecnológicos em Santa Catarina, São Paulo, Recife, Minas Gerais tiveram influência forte dos governos locais, facilitando implantação, acesso, reduzindo burocracia. O governo de Santa Catarina já nos deu um exemplo de que a continuidade é fundamental para que o Estado cresça. Não é em quatro anos que alguém vai conseguir fazer uma transformação radical — compara o professor.
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DIAGNÓSTICO
TURISMO
Quando se fala em turismo na Serra, a primeira relação que se faz no imaginário é com a da Região das Hortênsias, que recebe 1,5 milhão de visitantes somente no inverno. Fora daquele eixo, surge o Vale dos Vinhedos, na região de Bento Gonçalves, com uma média de mais de 400 mil visitantes por ano.
Mas o potencial da Serra, destino mais vendido no Estado, agrega outros atrativos que precisam de fortalecimento e organização. Segundo Mônica Mattia, do Corede Serra, a integração das regiões Termas e Longevidade, Uva e Vinho, Turismo Industrial-Patrimônio Histórico, Eventos e Compras e Aventura e Cânions é uma grande oportunidade para o fomento do turismo regional.
Pontos fortes: produtos, roteiros e equipamentos consolidados, estrutura de turismo receptivo, polo informal de enoturismo e atuação da governança local.
Pontos fracos/ameaças: estágios diferentes nos roteiros, dependência do trade turístico, pouca possibilidade de turismo-cidadão e da oferta espontânea, vulnerabilidade do setor de aviação e estradas, falta de planos regionais de turismo e não aproveitamento da capacidade ferroviária para o setor, desarticulação, dependência do turismo de lazer na Região das Hortênsias, formação de outros polos de enoturismo no país.
AGROPECUÁRIA
Segundo o último censo agropecuário, a Serra tem 31.050 propriedades rurais — redução de 8,1% em relação ao 2006 (data do censo anterior). Somente na região atendida pela regional dos Sindicatos dos Trabalhadores Rurais, que abrange 22 cidades, são 25 mil famílias que dependem do trabalho no campo.
O setor da agropecuária é muito importante na região com produção de frutas e hortaliças comercializadas no mercado estadual e nacional, na visão do Corede. A produção de alimentos como carnes e derivados, leite e derivados, farinha e derivados, também ocupa papel de destaque na região. Assim, segundo Mônica Mattia, a formação de um arranjo produtivo local de alimentos com apoio do Estado é altamente desejável.
Pontos fortes: alta produtividade da uva, clima favorável à cultura permanente, diversificação de culturas, perfil de agricultor empreendedor, disponibilidade de áreas agrícolas férteis, potencial para expansão de agroindústrias.
Pontos fracos/ameaças: envelhecimento da população, falta de sucessores no campo, péssimo sinal de telefonia e internet, rigidez das regras sanitárias e ambientais, baixo apoio às agroindústrias, dificuldade para expansão da pecuária e da agricultura por falta de território.
INDÚSTRIA
Setor que mais emprega na Serra em Caxias e região, o setor metalmecânico está com 25% da capacidade ociosa, fruto da retração da economia. É o segmento que mais luta pela inovação. Atualmente, são 50 mil postos de trabalho em 3,2 mil empresas de 17 cidades de abrangência do Sindicato das Indústrias Metalúrgicas, Mecânicas e de Material Elétrico de Caxias do Sul (Simecs), o que movimenta R$ 17,3 bilhões anuais de forma direta na economia da Serra e movimenta setores do comércio e serviços, que empregam mais de 80 mil pessoas somente em Caxias.
Pontos fortes: parque industrial instalado e diversificado, especialização por setores, empregos de alta e média tecnologia, inserção no comércio mundial.
Pontos fracos/ameaças: baixa cultura voltada à inovação, desindustrialização devido às importações da China, baixo nível de financiamento público, política de crédito restritiva.
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