O capítulo mais ambicioso da relação de Caxias do Sul com o passivo ambiental que produz chama-se Plano Municipal de Saneamento, que estipula metas para universalizar o acesso ao tratamento de esgoto, o manejo e a drenagem de águas pluviais, o abastecimento de água, o saneamento rural e a gestão dos resíduos sólidos. Entre as metas, o maior desafio é o esgotamento sanitário, que exigirá grandes somas de dinheiro público para universalizar o acesso da população ao tratamento de efluentes em até 20 anos. Uma parceria público-privada, porém, poderia acelerar o cumprimento do plano e reduzir os danos produzidos na natureza e entre a população pelos milhões de litros de efluentes poluídos despejados todos os anos em rios e arroios.
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Recursos próprios devem ser suficientes para cumprir metas de saneamento em Caxias, segundo o Samae
Previstas em lei federal, as PPPs são modalidades de contratos de concessão entre o poder público e a iniciativa privada. No caso, uma empresa ou um consórcio assume um projeto de longo prazo (de cinco a 35 anos) mediante remuneração. É uma alternativa que também pode ser aplicadas em outras áreas como iluminação pública, segurança, saúde e educação, entre outros. Cogita-se a modalidade, por exemplo, para viabilizar o aeroporto de Vila Oliva. No caso de saneamento, a tarifa cobrada atualmente da população seria revertida para a PPP como forma de financiar obras. Em contrapartida, a empresa contratada poderia executar a obra no curto prazo e receber os dividendos posteriormente.
Em Caxias do Sul, o desafio é grande, a exemplo da degradação do Arroio Tega, conforme mostrado na edição de final de semana, e de outros mananciais. A poluição como é conhecida hoje teve origem na forma como sucessivas gestões priorizaram ou não o tratamento de esgoto na cidade e na falta de uma identificação dos moradores com o tema. A justificativa para postergar melhorias ou fazer intervenções a conta-gotas sempre esbarraram no discurso da falta de recursos, mesmo argumento dos donos de residências que resistem em ligar corretamente o encanamento à rede pública. Embora Caxias do Sul tenha avançado nos últimos anos com a construção das Estações de Tratamento de Esgoto (ETEs), ainda é longo o caminho para regularizar o setor.
O Samae acredita que os recursos próprios seriam suficientes para ampliar o serviço de esgoto tratado, sem a necessidade de uma parceria com a iniciativa privada. Isso implica obviamente na execução gradual das melhorias, que englobam 300 quilômetros de encanamento. A dúvida é se a autarquia terá condições financeiras para bancar sozinha o investimento de R$ 200 milhões estimados para cumprir os objetivos — o sistema Marrecas custou R$ 300 milhões, por exemplo, e teve financiamento federal.
As duas décadas previstas para a universalização do tratamento de esgoto também são tempo suficiente para o município ter até quatro prefeitos diferentes e a população crescer consideravelmente, o que pode deixar o plano e suas metas defasados.
Piracicaba no topo do ranking
Margarete Bender, diretora de infraestrutura e política urbana da Câmara de Indústria, Comércio e Serviços (CIC) de Caxias do Sul, vê com bons olhos os investimentos que podem ser gerados por meio de uma PPP. Para ela, já há uma tendência de deixar com o poder público os gastos com educação, saúde e segurança e delegar os investimentos de infraestrutura para a iniciativa privada. Contudo, Caxias do Sul não teria o perfil para estabelecer a parceria no âmbito de saneamento, segundo ela.
— Já temos uma empresa com certa eficiência na prestação desse serviço, que é o Samae. A PPP serve mais para regiões sem a estrutura administrativa consolidada no setor — pondera Margarete.
Piracicaba, município de 400 mil habitantes no interior de São Paulo, buscou a parceria público-privada para cumprir a meta de tratar todo o esgoto conforme exigia um termo de ajustamento de conduta (TAC) acordado com o Ministério Público. Hoje, a cidade paulista figura na seleta lista de municípios de grande porte rumo à expansão total do saneamento básico, com taxa de 100% de tratamento, conforme ranking da Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental (Abes). A instituição usa dados do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (Snis) do Ministério das Cidades para comparar os investimentos e resultados nos municípios brasileiros.
Caxias do Sul está no grupo de municípios empenhados na universalização com taxa de 47,95%, segundo a Abes. Diferentemente dos dados do ranking, o Samae diz que a taxa de tratamento na cidade é de 60%.
Em Piracicaba, o tratamento é responsabilidade de uma empresa privada, que assumiu a missão de concluir uma estação de tratamento de esgoto (ETE) após assinar contrato com a prefeitura em 2012. Na cidade paulistana, antes da PPP, o acesso ao tratamento de esgoto era de 70%, índice que foi possível com investimentos do município, a exemplo de Caxias do Sul. A tarifa básica de esgoto tratado em Piracicaba é R$ 18,01 enquanto que Caxias cobra R$ 21,84. No país, só há 9 PPPs municipais de saneamento celebradas, segundo a empresa de consultoria Radar PPP, sendo sete delas focadas em esgotamento sanitário.
METAS
As metas do Plano Municipal de Saneamento abrangem cinco áreas. Abaixo, confira os objetivos para o esgotamento sanitário, setor que exigirá investimento de peso:
Curto prazo (5 anos)
:: Revisão do Plano Diretor de Esgotamento Sanitário para adequação ao novo perímetro urbano conforme o Plano Diretor Municipal.
:: Realização de estudos para definir a capacidade de suporte dos corpos d'água receptores de efluentes das ETEs (estações de tratamento de esgoto) em atividade.
:: Implantação do Sistema de Informações Geográficas, em conjunto com a prefeitura.
:: Recuperação de 5% do passivo com implantação de redes separadoras de esgoto (cerca de 50 quilômetros).
:: Geração de Banco de Dados, contendo indicadores representativos dos serviços de esgotamento sanitário.
Médio prazo (10 anos)
:: Elaboração de Plano Diretor de Esgotamento Sanitário para a zona urbana dos distritos e, também, para a zona rural do município.
:: Recuperação de 10% do passivo com implantação de redes separadoras de esgoto (cerca de 100 quilômetros).
:: Ampliação do tratamento de esgotos atendendo mais duas bacias.
:: Realização de estudos para definir a capacidade de suporte dos corpos d'água receptores de efluentes das ETEs a executar.
Longo prazo (20 anos)
:: Recuperação de 30% do passivo com implantação de redes separadoras de esgoto (cerca de 300 quilômetros).