Se você tem a impressão de que está fazendo muito calor no inverno em Caxias do Sul, você tem razão. Mas engana-se quem pensa que a situação é atípica e recente. Levantamento feito pelo Pioneiro a partir de dados históricos do Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet) mostra que os dias frios são maioria durante o período da estação, que ocorre de junho a setembro no Brasil. Porém, picos de calor nessa época são registrados pelo menos desde a década de 1990. Para se ter uma ideia, entre 1° de junho e 30 de setembro do ano passado, em 66 dos 122 dias a temperatura ficou abaixo de 10°C; em 2015, no mesmo período, foram 36 dias de frio mais intenso. Seis anos antes, em 1999, foram 59 dias com menos de 10°C. Neste ano, dos 57 dias de junho e julho, 18 tiveram temperatura inferior a essa marca.
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O veranico que faz agora, pouco mais de um mês após o início da estação gelada - na terça-feira, a máxima foi de 28,2°C em Caxias - não espanta os meteorologistas. Eles ponderam, no entanto, que o clima é muito cíclico e vem sofrendo alterações no decorrer dos anos em função de inúmeros fatores, como aquecimento global e fenômenos meteorológico, como o El Niño, caracterizado por um aquecimento anormal das águas superficiais no Oceano Pacífico Tropical.
– Está difícil manter um padrão todos os anos. Não dá mais para dizer que o inverno de um ano será igual ao outro – garante a meteorologista Patrícia Cassoli, da Somar Meteorologia.
A variedade de temperaturas nos últimos seis invernos, pelo menos, vem chamando a atenção de Neusa Maria Salvador Machado, que desde 1979 coleta os dados na estação do 8º Distrito de Meteorologia (8º Disme), no Aeroporto Regional Hugo Cantergiani, e os repassa para meteorologistas na Capital, que utilizam os números para elaborar as previsões. Ela também acredita que vem fazendo mais calor nessa época que deveria ser mais gelada, mas acha que essa situação deve se repetir nos próximos anos:
– O tempo está muito louco, não é? O último verão foi muito quente e agora o inverno está parecendo mais curto, porém mais intenso. A geada do dia 18, por exemplo, foi muito sentida pelas pessoas. Parece que, como o clima está mudando de um dia para outro, em um está 22°C e o outro já baixa para 10°C, o corpo sofre mais e nossas percepções de frio e calor já não são mais as mesmas.
Inverno seco
Além de mais quente, o inverno, especialmente o mês de julho deste ano, está muito seco em várias regiões do Brasil. Em São Paulo, por exemplo, os moradores estão enfrentando o segundo mês de julho mais seco desde 1995, segundo o Centro de Gerenciamento de Emergências (CGE) da prefeitura. Em Caxias, a situação é semelhante: até sexta, choveu apenas três dos 28 dias do mês. Segundo dados coletados no 8º Disme, o acumulado pluviométrico foi de 25,7 milímetros, número considerado baixo, segundo Neusa Machado. No Aeroporto Regional Hugo Cantergiani, ela verifica itens como temperaturas mínima e máxima, volume de chuvas, quantidade de sol, pressão atmosférica e nebulosidade.
E a previsão indica que o tempo deve seguir seco pelo menos até setembro, quando deve voltar a chover na Serra.
Agricultura sente a mudança nas temperaturas
A percepção de que vem fazendo mais calor no inverno é quase um consenso entre os agricultores, principalmente os que produzem frutas. De acordo com o engenheiro agrônomo Daniel Tonet, a estação sempre apresentou dias de verão, mas há pelo menos 15 anos a sensação de que está mais quente vendo sendo mais sentida.
– Alguns produtores precisam do frio constante para que a produtividade seja boa. Para muitas frutas, é necessário que elas fiquem o máximo de horas em uma temperatura abaixo de 7,2°C. Neste inverno, esse tempo está muito reduzido e muitos estão tendo que apelar para sistemas, como a aplicação de produtos, que façam com que a produção supere a deficiência de frio – explica.
Tonet teme que este inverno seja tão quente quanto foi em 2015, quando muitos agricultores tiveram parte de suas produções comprometidas em função do grande número de dias de calor. Como mostram os dados do Inmet, 2015 foi realmente atípico: foi o único ano, nos últimos 15, que não registrou temperatura negativa. De 122 dias, referentes aos meses de junho a setembro, apenas 36 foram com termômetros marcando menos de 10°C.