Escolas de Ensino Fundamental que atendem a menos de 50 alunos na zona rural de diversas cidades da Serra correm o risco de serem extintas. O baixo número de matrículas e a falta de mão de obra interessada em trabalhar nestas escolinhas, muitas vezes situadas a 20 quilômetros da sede do município, tornam difícil a continuidade das atividades nestas instituições. Ao todo, 17 escolas estaduais de 13 cidades estão sob análise, podendo ser fechadas durante o próximo letivo. Nenhuma delas está em Caxias do Sul.
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A portaria das matrículas das instituições estaduais, publicada em edital no início deste mês, dá embasamento à tese: cada turma deverá ter, no mínimo, 16 alunos. No entanto, o artigo 23 do edital descreve que o fechamento deve ser previamente justificado formalmente, e a comunidade/escola precisam ser ouvidos antes de qualquer decisão, o que é assegurado pelos coordenadores regionais de educação. Na rede municipal de Caxias, seis escolas fecharam há mais de cinco anos, ainda na administração de José Ivo Sartori (PMDB), e agora serão extintas definitivamente. No entanto, não há previsão de novos encerramentos no âmbito municipal.
– No primeiro momento, as escolas são fechadas e o parecer de extinção acontece cinco anos após o encerramento das atividades. Geralmente, são instituições que ficam em torno da área urbana, e os alunos são transferidos para próximo dali – explica a coordenadora do Conselho Municipal de Educação, Márcia Carvalho.
A maior parte destas escolas de pequeno porte trabalha com o ensino multisseriado, ou seja, diferentes níveis em uma mesma sala de aula. Ainda que o método divida opiniões, é a saída para instituições onde há pequeno número de estudantes.
– O maior recurso despendido é o recurso humano, de professores. Há uma característica interessante nestas escolas: a comunidade participa e se engaja, então ocorre economia. Não gostaríamos que as crianças perdessem este vínculo local, sou uma defensora deste tipo de ensino – diz a secretária municipal de Educação, Marléa Ramos Alves.
As instituições municipais que deixaram de existir ficavam em Galópolis, na 5º Légua e em alguns distritos. Estas instituições representam, basicamente, a essência da comunidade a que pertencem. São escolinhas onde gerações de famílias estudaram e se sentem inseridas, por isso pedem pela permanência. Em Galópolis, o prédio da Escola Municipal Felipo Tonetta, na Estrada Geral de São Francisco da 6ª Légua, está desativado há mais de cinco anos. Chegou a ser espaço de invasão de moradores e, hoje, é de propriedade da subprefeitura. O local funciona como depósito de cascalho, segundo Velocino Uez, subprefeito de Galópolis. A tendência é que o ensino rural encolha com o tempo, conforme acreditam especialistas.
– Esse processo acontece desde a década de 1980, com mais ou menos força, dependendo da localidade. Eles acabam mudando o foco do investimento, não é economia, já que há outros gastos com deslocamento. Foi com o fechamento de muitas escolas do interior que houve o crescimento de vans escolares – analisa a professora da disciplina de Gestão Escolar da Universidade de Caxias do Sul (UCS), Lezilda Teixeira.
Colégio com oito alunos em Caxias
Os pequenos colégios que resistem em Caxias do Sul são uma ilha diante do cenário tumultuado e concorrido de grandes instituições de ensino. Na Linha 40, por exemplo, o número total de alunos da escola não chega a uma dezena. Apenas oito estudantes respondem à lista de chamada diariamente na Escola Municipal Doutor Liberato Salzano Vieira da Cunha, instituição que completa 60 anos em 2017. Ali, por exemplo, está uma cena pouco comum nas escolas municipais de Caxias: sobram vagas na educação infantil. As crianças que estudam na Linha 40 frequentam do ensino infantil até o 5º ano. Frequentam a mesma turma, têm a mesma professora, mas participam de atividades de diferentes níveis. Já que a comunidade ajuda – e o número reduzido de alunos ocasiona, consequentemente, menos gastos – alguns investimentos são feitos com mais facilidade. Na sala de aula, há wifi e um laboratório de informática, além do prédio cinquentenário ganhar reparos com frequência.
– Há poucos alunos porque muitos moradores da zona rural têm condições financeiras e acabam levando os filhos para colégios particulares, na área central. Mas há pais que fazem questão de mantê-los aqui. Nossa intenção é nunca fechar as portas – afirma a coordenadora pedagógica da Liberato Salzano, Samara Salvador.
Uma prova de que os custos do colégio são pequenos é que a instituição se mantem, anualmente, com valor de cerca de R$ 10 mil, incluindo repasses municipais e federais. Gastos com funcionários, água e luz são dispensados diretamente pela Secretaria Municipal de Educação. A coordenadora é quem serve a merenda, resolve assuntos diretivos e, junto da professora, é responsável pela limpeza do modesto prédio.
– A professora dá explicações um por um, dá aula quase que individualmente – elogia o aluno Marcos Ivan Drum, 10 anos.
Em Bento, luta para permanência
A história dos pequenos colégios rurais é tão significativa que a comunidade, muitas vezes, não permite que eles encerrem suas atividades. A resistência da instituição de ensino do distrito virou bandeira para os moradores de São Pedro, no interior de Bento Gonçalves. Os pais dos 16 alunos somaram-se aos ex-alunos da comunidade e criaram um abaixo-assinado e um ato de manifestação, solicitando à 16ª Coordenadoria Estadual de Educação (16ª CRE) que não fechasse as portas da Escola Estadual São Pedro. O problema ali é a falta de uma professora que aceite dirigir o colégio, já que fica distante do centro da cidade.
– Não é nossa intenção fechar as portas do colégio, mas estamos com uma dificuldade enorme de encontrar professora e diretora. Há uma escola próxima dali que teria condições de absorver estes alunos. Acho bonito a comunidade brigar pelo colégio, mas não sabemos como resolver essa situação – justifica o coordenador da 16ª CRE, Leonir Olimpio Razador.
Pais não querem que a escolinha de 106 anos de história feche as portas. Mãe de dois alunos, Viviane Cristina Girelli é uma das envolvida na mobilização. As inscrições estão abertas para o próximo ano letivo, o que faz com que os pais respirem aliviados, mas é possível uma reviravolta durante as aulas de 2017.
– Ninguém quer que os filhos saiam daqui de perto tão pequenos. Vamos lutar para que fiquem ali – resume Viviane.
A escola conta com dois professores, uma merendeira e uma auxiliar de limpeza, e funciona somente meio turno. A redução de alunos ano após ano é significativa: em 2014, recebia cerca de 45 crianças das comunidades de São Pedro, São Miguel e Santo Antônio.
A Região
Colégios estaduais com menos de 50 alunos na Serra:
:: Garibaldi: duas escolas
:: Farroupilha: um colégio indígena
:: Bento Gonçalves: uma escola
:: Nova Bassano: duas escolas
:: Garibaldi: uma escola
:: Flores da Cunha: uma escola
:: Jaquirana: uma escola
:: São Francisco de Paula: duas escolas
:: Vacaria: uma escola
:: Bom Jesus: uma escola
:: Ipê: uma escola
:: Monte Alegre dos Campos: uma escola
:: Pinhal: duas escolas
** Todas as escolas são estaduais, e os dados foram repassados pelas Coordenadorias Regionais de Educação. Não há garantia que estas escolas sejam fechadas, entretanto, cada caso será avaliado. Escolas indígenas e de assentamento não podem ser fechadas.