A história de Daniel Ricardo Linck, 26, que teve o rosto estampado em jornais e na TV após ter sido flagrado assaltando um estudante no Campus Central da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), na Capital, segue uma cartilha conhecida de famílias que lidam com filhos viciados em crack.
Antes de ser apontado como o homem que foi preso e solto 16 vezes por roubos e furtos desde 2009, Linck era um adolescente que ganhava um bom salário, planejava casar com a namorada e contribuía com as finanças da casa que dividia com a mãe e o único irmão num bairro da zona norte, em Caxias do Sul. Mas um dia conheceu um amigo que gostava de maconha. Ele tinha 17 anos quando experimentou o primeiro cigarro da droga e quis mais. Da maconha, partiu para substâncias mais pesadas e foi fisgado pelo crack.
A vida dele e da família virou do avesso. Para saciar a fissura, trilhou o mesmo caminho de tantos viciados: vendeu tudo que era dele, foi preso diversas vezes e virou morador de rua. No final de 2015, deixou de contatar a família e se mudou de Caxias. Não foi surpresa para familiares quando Linck reapareceu numa reportagem do SBT segurando uma faca e mantendo um refém na UFRGS em Porto Alegre, no início do mês.
– Uma prima me avisou sobre a prisão. Fico irritado e triste. Não o defendo, mas sei que ele ainda não é um bandido, vejo que rouba mais pelo crack – diz o irmão de Linck, quatro anos mais velho, casado e com filhos.
Temendo constrangimentos, ele pede para não ter o seu nome e o da mãe divulgados.
– Minha mãe sofreu demais, ficou doente. Agora, a gente tenta refazer a vida – justifica.
Para o irmão, o envolvimento de Linck com drogas e a criminalidade seria uma resposta à separação dos pais. O casal morava em Caxias e se mudou para Santos, no litoral paulista, nos anos 1980. Lá, nasceram os irmãos. Linck era um bebê quando os pais terminaram o casamento. A mãe voltou para Caxias com os filhos. O pai ficou em Santos e, mais tarde, retornou para o RS, onde ainda reside. A reportagem não conseguiu contatá-lo.
Primeiro emprego
O caçula teve uma vida tranquila até a adolescência. Conquistou o primeiro emprego na marcenaria de um tio, na zona sul da cidade. Com o salário, comprou eletrodomésticos e outros utensílios para montar a casa que planejava dividir com a namorada. O irmão não esquece do amigo que ofereceu o primeiro cigarro de maconha a Linck:
– Esse cara ficou só na maconha, meu irmão não.
Um ano depois, Linck já consumia crack. Desempregado, abandonou a escola, se desfez de roupas, fogão e TV para manter o vício. Depois, carregou os objetos da casa da mãe e não poupou os bens do irmão. Nesse meio tempo, a família enfrentou a pressão de traficantes: eles vieram atrás de Linck porque haviam recebido dinheiro falso como pagamento pela droga.
Em abril de 2008, o jovem deu entrada pela primeira vez no Centro de Atenção Psicossocial (Caps) Reviver, em Caxias. Seria a primeira de muitas internações e consultas.
– Ele falava que a culpa de ser assim era da minha mãe pelo fato de a gente não ter tido o pai por perto – conta o irmão.
Fuga do tratamento
Segundo o irmão, a primeira prisão de Linck teve relação com o furto de uma moto quando ainda estava numa clínica, em 2009. O jovem pegou o veículo de um monitor e fugiu. Ficou quatro dias na cadeia e foi condenado a um ano de prestação de serviços comunitários. Desde então, foi preso mais 11 vezes em Caxias do Sul e quatro vezes em Porto Alegre. A maioria dos casos envolveu furtos de chocolate. Atualmente, responde a dois processos em liberdade: um por receptação de um carro furtado em Caxias do Sul e o outro por tráfico de drogas, na Capital.
Nos últimos dois ou três anos, após ser expulso de casa, o rapaz morou nas ruas e pedia dinheiro nas esquinas do centro de Caxias. Volta e meia, aparecia na moradia da família para pedir dinheiro ou surrupiar algo de valor.
Jovem buscava tratamento desde 2008
Cansada e depressiva, a mãe de Linck saiu de Caxias e se mudou para Santa Catarina no ano passado. Linck foi atrás. A mulher voltou para Caxias e o filho seguiu para Porto Alegre, onde ganhou a notoriedade pelo assalto na UFRGS.
– Virou um inferno. Fizemos de tudo e não adiantou. Larguei de mão e hoje não o quero mais perto de mim ou da minha mãe – desabafa o irmão.
Linck tem prontuário no SUS como usuário de drogas desde 2008. A família crê que somente uma internação compulsória, determinada pela Justiça e contra à vontade dele, pode resolver. A diretora da Política de Saúde Mental de Caxias, Vanice Fontanella, diz que essa alternativa raramente dá certo. Conforme ela, Linck frequentou o Caps Reviver de 2008 a 2011.
No período, foram solicitadas duas internações compulsórias. Os médicos que o atenderam, porém, entenderam que não havia necessidade. Entre 2013 e 2015, ele compareceu duas vezes no Caps. Em julho do ano passado, a Secretaria da Saúde tentou contatar Linck, mas não o localizou.
SAIBA MAIS
- Das 16 prisões de Linck, cinco foram em flagrante, com recolhimento em presídios e abertura de cinco processos criminais. Linck segue livre até o julgamento dos processos.
- Ele usa dois perfis no Facebook. A reportagem tentou contatá-lo por meio dos perfis, mas não obteve retorno.