A falta de circulação de pessoas pode até ter causado algum estranhamento entre os animais que vivem no jardim zoológico da Universidade de Caxias do Sul (UCS), como acredita a bióloga responsável pelo local, Claudia Borges Machado. Mas, segundo a profissional, a ausência de visitantes não interferiu na rotina e no atendimento dos animais.
— Não percebemos tantas mudanças (no comportamento). É claro que um ambiente tranquilo é bom pros animais, assim como a gente também gosta. Mas como nossos animais são acostumados com a visitação, provavelmente eles não estão entendendo por que tem menos gente.
As aulas presenciais na universidade foram suspensas em 16 de março do ano passado e, com elas, quase todas as ações desenvolvidas no campus. Na época, o zoo fechou as portas e, desde então, segue sem receber visitantes. Quando as medidas de contenção não eram tão restritivas, havia a autorização para abrir, mas as visitas permaneceram suspensas para segurança do público e da própria equipe, como explica Leandro do Monte Ribas, médico veterinário e coordenador do jardim zoológico.
A equipe do zoo é formada pelo coordenador, duas responsáveis técnicas, três funcionários e dois bolsistas estagiários. Na pandemia, os estagiários tiveram atividades temporariamente suspensas, mas já retornaram. Além deles, o zoológico abre vagas de serviço voluntário para estudantes da Biologia e da Medicina Veterinária. Esses profissionais já estavam habituados ao uso de luvas e álcool. A maior diferença de protocolos fica estampada no rosto:
— Mais é a máscara, que usávamos em algumas situações e agora a gente utiliza o tempo todo — relata Claudia.
Suporte à vida silvestre não para
Além de manter os animais que vivem por lá, as equipes veterinárias continuaram atendendo bichos vítimas de maus-tratos, atropelamentos e cativeiro e caça ilegais. Apesar do expediente reduzido e do revezamento dos trabalhadores, a assistência médica aos animais nunca parou, conforme Ribas.
Os bichos que vêm de resgates e apreensões geralmente são encaminhados pela Polícia Ambiental e pelas secretarias municipal e estadual do Meio Ambiente. O zoológico cuida dos animais e busca devolvê-los ao habitat natural, quando estão em condições de sobreviver por conta própria. Em função do trabalho de reabilitação que desempenham, Claudia diz que muitas pessoas levam os bichos que encontram direto para o zoo. Mas mesmo que as equipes estejam treinadas para dar orientações à comunidade por telefone, o atendimento funciona, durante a semana, apenas das 9h às 17h, sem fechar ao meio-dia, e, aos finais de semana, das 14h às 17h. Por isso, ao encontrar um animal silvestre, o primeiro contato deve ser realizado com a Polícia Ambiental ou com a Secretaria Municipal do Meio Ambiente. Até porque há situações em que os bichos nem precisam da interferência humana.
— Muitas vezes, o animal pode retornar ao ambiente natural. Isso acontece na primavera, por exemplo, quando as pessoas querem recolher filhotes de aves ou mamíferos pequenos. Às vezes, a mãe sai pra buscar alimento ou vai transportar o filhote e as pessoas acabam retirando ele do espaço. A gente sabe que é na boa vontade, por falta de conhecimento sobre o comportamento dos animais. Por isso, antes de agir, é melhor buscar informação. Esses órgãos já fazem uma avaliação e, se necessário, encaminham pro zoo — esclarece a bióloga.
O jardim zoológico acaba se tornando o lar permanente de bichos que sofreram mutilação e de órfãos que são criados ali desde filhotes. Claudia explica que a intenção é sempre enviá-los de volta à natureza:
— A gente quer que o animal venha, seja tratado e retorne ao ambiente. Os que estão aqui não têm como retornar. A gente tenta dar informação à população do porquê que cada animal está aqui. Não é pra exposição, não é pra bonito, como às vezes o pessoal acha. É porque ele teve uma interferência humana que agora culminou na questão do cativeiro — complementa.
Um novo tipo de visitante
Atraídas por um cenário mais tranquilo, outras espécies voltaram a povoar o entorno do zoológico. O fenômeno não é exclusivo da região. Em março de 2020, imagens de cisnes e peixes nos canais de Veneza, patos em Roma e até golfinhos na Sardenha, na Itália, viralizaram nas redes sociais. A quarentena reduziu o impacto humano nas ruas e encorajou os animais a voltarem a frequentar esses espaços.
Nos arredores do zoo da UCS, a maior parte das espécies encontradas são aves: o carcará, que é uma ave de rapina, gralhas, tucanos, jacus e saracuras, além dos passarinhos menores. Enquanto espaço de conservação da fauna, o jardim zoológico tem a importante missão de fornecer abrigo e comida para esses animais.
Retorno será gradual, mas sem previsão de data
Na bandeira preta, os locais como os zoológicos seguem sem autorização para abrir. No entanto, quando o cenário permitir e sempre mediante agendamento pela internet, Ribas adianta que a UCS planeja um retorno gradual das visitas ao espaço, com teto menor de ocupação:
— Nosso medo ainda é a conscientização das pessoas que, vendo que tem movimento, se desloquem até o local sem agendar e se aglomerem no portão de entrada. Sabendo que o zoo é um ponto de lazer de Caxias do Sul, da comunidade e região, as pessoas vão se deslocar. Estão cansadas de ficar em casa.
O coordenador antecipa que o zoo passa por um projeto de ampliação de atividades na área de conservação da fauna e trabalha com os gestores e com a Fundação Universidade de Caxias do Sul (FUCS) pela modernização do local. A comunidade ainda terá de aguardar mais um pouco para saber dos detalhes, mas trata-se de um projeto que pretende implantar ações de educação ambiental e de aumento do suporte médico aos animais silvestres da região.