Via de regra, não falta água para consumo nas áreas urbanas das cidades da Serra por problemas na capacidade de captação e tratamento. Em geral, os problemas de desabastecimento ocorrem na rede de distribuição por problemas nas tubulações, que são antigas e, segundo as prefeituras, recebem pouca manutenção. A reportagem verificou como algumas cidades se prepararam para mais um verão de pouca chuva, influenciado pelo fenômeno La Niña. Em alguns municípios, a Corsan diz que investiu para ampliar reservação ou capacidade de captação e para evitar perdas nas tubulações.
Farroupilha
Extensões de rede resolveriam falta de água no interior
Em Farroupilha, a barragem do Burati está um pouco abaixo do nível normal. No verão passado, se a estiagem se prolongasse por mais duas semanas haveria problemas no abastecimento, segundo a prefeitura. Isso acabou não ocorrendo. Contudo, a situação foi crítica para 50 famílias das cerca de 800 que moram no interior. Os moradores, principalmente da localidade de Caravageto, dependem de poços que acabaram secando. Eles foram abastecidos com água potável por meio de caminhões pipa pela Corsan e pela prefeitura para os animais. Essa é uma das localidades que, segundo a prefeitura, poderia ser atendida com investimento em extensões de rede para a área rural. Ocorre que na maioria dos municípios os contratos com a estatal preveem apenas o abastecimento nas áreas urbanas. Nas comunidades do interior, a água vem de poços, mas chega encanada nas residências por tubulações custeadas pelas famílias com apoio da prefeitura para a perfuração e instalação.
Em Farroupilha, partes da zona rural próximas à cidade já são abastecidas pela Corsan com extensões de rede, como Nova Milano, Linha São Miguel, Nova Sardenha e Linha Julieta, entre outras. Nos últimos meses, a companhia realizou obra para elevar o nível de água na barragem, que chegou ao limite mínimo com a seca do começo de 2020, e investiu em dois reservatórios – 85% da população tem água encanada, segundo a prefeitura.
Garibaldi
Falta manutenção na rede de distribuição
Garibaldi não teve investimentos por parte da Corsan, segundo a prefeitura, neste último ano. O problema por lá não é falta de reservação, porque a barragem é grande, mas sim a falta de manutenção na tubulação da rede de distribuição que é muito antiga. Quando rompe uma adutora, o abastecimento somente retoma ao normal dois a três dias depois.
Se a reservação atual não preocupa, o município prevê dificuldades de abastecimento para os próximos anos, caso não haja investimento por parte da estatal. É que a cidade está expandindo para bairros mais afastados, em função de novos loteamentos. Com isso, bairros em pontos altos da cidade terão falta de água.
São Marcos
Corsan atuou para reduzir perdas na distribuição
São Marcos foi outro município da Serra que viu a represa chegar ao nível mínimo no último verão. Para manter o sistema operando, a Corsan precisou abastecer o reservatório natural – que tem a chuva como fonte de acúmulo e o bombeamento feito no Rio Ranchinho – com caminhões pipa. A água vinha do Rio São Marcos. Mesmo assim, não houve racionamento ou desabastecimento da população, que é atendida em 100% por água tratada na área urbana. A medida adotada foi a de pedir consciência sobre o consumo racional.
Segundo o secretário de Meio Ambiente, Fabiano Varela, devido ao relevo do município os problemas enfrentados ao longos dos anos são de falta de pressão na rede para que a água chegue aos pontos mais altos. A Corsan estaria atuando para solucionar isso.
– Investimento e infraestrutura para tentar reduzir o risco de uma eventual estiagem, não houve. Foi feita manutenção visando redução de vazamentos e uma correção de vazamento na represa – apontou Varela.
Segundo o secretário, o município tenta fazer com que a companhia cumpra o que está estabelecido em contrato, renovado em 2010 e com vigência de 25 anos, e amplie a capacidade de armazenamento que é a mesma desde que a cidade foi fundada, há 50 anos.
– Em princípio, não houve tratativa para o município encampar o serviço que a Corsan presta. Teria que comprar toda a estrutura. Seria inviável – ponderou Varela.
O gestor municipal da Corsan em São Marcos, André Viana, disse que a estatal investiu no combate à perda de água tratada por meio de vazamentos no sistema de distribuição. Segundo ele, o índice médio nacional de perda é de cerca de 40%. O município tinha percentual de 54%, em setembro de 2018. Passou a 40%, no verão passado, e atualmente é 19%.
– Foi investido bastante em macromedição, setorização. Basicamente, se investiu em combate à perda – diz o gestor, sem especificar valores.
Viana projeta que essa água que deixou de se perder da rede já está ajudando a manter o nível da represa, que, na semana passada, estava 70 centímetros abaixo do máximo. Ainda, conforme o gestor, desde 1971, foram feitas duas elevações no reservatório – a última teria sido em 2014. Outro investimento neste ano foi na ampliação do bombeamento de água do Rio Ranchinho para a represa de 30 para 40 litros por segundo. Existe um trabalho em andamento para aumentar para 60 litros por segundo.
A gestão local disse que solicitou à Corsan abertura de poços, mas a prioridade é atender aos municípios que estão em situação de emergência.
Carlos Barbosa
Abastecimento por poços garante água à população
Carlos Barbosa tem uma peculiaridade em relação aos demais municípios da região: é abastecido totalmente por poços artesianos. A cidade não tem barragem. Na área urbana, a administração dos 17 poços, o tratamento da água e a distribuição são feitos pela Corsan. No interior, são perfurados pela prefeitura e mantidos por associações de moradores. Segundo a prefeitura, não houve problemas no abastecimento no verão passado na cidade, apenas em algumas localidades da área rural que precisaram ser abastecidas por caminhões-pipa. Neste ano, um poço já foi aberto e outros dois foram licitados. A expectativa é que, nesta estação, as comunidades não passem por dificuldades, se as chuvas de verão se mantiverem como têm sido.
Adilson Pasa, que até a semana passada respondia pela Defesa Civil municipal, informou que foi comprado um reservatório para levar água para o interior, caso seja necessário. Ele conta que não houve investimento, por parte da Corsan, na área urbana.
Allan de Castro Rosa, gestor local da unidade da companhia, disse que de forma geral, só ocorre desabastecimento quando há problema em algum dos poços. A água desses poços vai direto para a casa dos moradores e o que sobra do consumo vai para os cinco reservatórios (um de 500 mil litros, dois de 200, um de 100 e um de 15). A dificuldade é que essas caixas d'água conseguem dar conta do abastecimento apenas por algumas horas.
– O ideal seria que a água fosse para o reservatório e, depois, para distribuição. Mas aqui ocorre o contrário. Por conta disso, muitas vezes temos excesso de pressão e rompimento de tubulações – explica o gestor.
O controle dos níveis dos reservatórios é que dão o indicativo sobre como está o consumo na cidade, se há problema em determinado poço ou vazamento na rede. A Corsan está com processo adiantado para operação de novo poço no limite dos municípios de Garibaldi e Farroupilha, em um projeto de extensão de rede para área rural, que deve beneficiar cerca de três mil moradias. A abertura já foi feita e a ideia é começar a operar no segundo semestre de 2021, porque é preciso construir a estrutura, instalar bomba e ligar na rede elétrica. O contrato da Corsan com o município é por 25 anos e vence em 2032.
Canela e Gramado
Corsan investiu e município desistiu de municipalizar
Em Canela, a Corsan aumentou a capacidade de vazão de água e ampliou a reservação neste ano, segundo a prefeitura. A expectativa do secretário de Obras do município, Luiz Cláudio da Silva, é que não haverá falta de água neste verão como ocorreu em anos anteriores. Em alguns pontos da cidade, o desabastecimento era recorrente, conforme Silva. A administração municipal chegou a cogitar assumir os serviços de água e esgoto, mas como houve esse movimento por parte da Corsan em investir em obras, o município declinou.
– Eles (Corsan) prometiam investimento desde 2012. Fizeram poucas redes de tratamento de esgoto e de água menos ainda. Agora, nos auxiliaram bem mais. Acreditamos que a cidade não terá problemas de falta d'água, eles devem ocorrer no interior, onde já tivemos problemas e não tivemos condições de fazer investimentos para resolver – considerou o secretário.
A estatal também investiu em tratamento de esgoto, que deve alcançar 60% da população. A água tratada chega a cerca de 90% das residências da área urbana de Canela. O contrato com a Corsan é de 25 anos e se encerra em 2029. A água é captada em São Francisco de Paula, tratada em Canela e distribuída na cidade e em Gramado.
A área rural ainda está sendo atendida com água potável porque a situação das nascentes não normalizou. Um caminhão com reservatório leva o líquido às comunidades atingidas pela estiagem três vezes por semana. A prefeitura em parceria com os moradores fez um poço artesiano e uma extensão de rede, mas ela não atende a todas as famílias.
A companhia informou que vem realizando as melhorias no sistema de abastecimento em Canela e Gramado. Segundo o gestor da Unidade de Saneamento Especial (USE) Hortênsias, Lutero Cassol, foram perfurados cinco poços artesianos no segundo semestre deste ano, sendo que quatro deles concederam água e vão permitir a circulação de mais 70 litros de água por segundo.
Os poços artesianos estão sendo montados, em fase de conclusão. No momento, estão sendo finalizados os abrigos de tratamento e as bases dos reservatórios.
Além da perfuração dos poços, a primeira etapa das obras, que visam solucionar os problemas de desabastecimento, abrange a implementação de um reservatório de 3 milhões de litros, em Gramado, que já está em operação.
Bento Gonçalves
Relação é de cobrança e entrega
Depois do verão passado, em que Bento Gonçalves teve muitos problemas de desabastecimento, a prefeitura cobrou investimentos por parte da Corsan. Com obras de manutenção, diversos pontos de fuga de água tratada foram consertados. O percentual de perdas é de 30%. Além disso, a estatal trabalha para aumentar a reservação. A previsão é que janeiro, fevereiro e março registrem menos problemas do que o mesmo período do ano passado.
Bento é outra cidade da região que já cogitou municipalizar os serviços. Com a maior atenção da Corsan à cidade nos últimos dois anos, desistiu, e renovou contrato em 2019 com uma série de exigências quanto a ampliação do abastecimento e de esgoto tratado, que atualmente é de 11% e deve passar para 40%, com início da operação da Estação de Tratamento do Barracão, que está pronta.
Ainda conforme a prefeitura, as reclamações junto à Corsan são semanais de rompimento de tubulação, de abastecimento da região norte da cidade, porque é área alta. O contrato do município com a estatal é pode 35 anos.
– A gente faz substituições periódicas de redes mais antigas, atua na ampliação da reservação. O contrato de concessão que a Corsan tem não contempla o interior, mas, em parceria com a prefeitura e os interessados, fazemos ampliações pontuais assim que somos solicitados – disse Marciano Dal Pizzol, gestor local da Corsan em Bento.