"Era fevereiro de 2020, iniciamos a pré-escola. Novos colegas, novas professoras, aprendizagens e diversão... Porém, chegou o mês de março e um vírus muito perigoso chegou à nossa cidade, fazendo com que a escola fechasse e ficássemos todos em casa, por muitos meses... Estávamos longe da escola, mas seguimos aprendendo, e quantas foram as aprendizagens..."
Assim começa o livro de lembranças que a professora Flávia Kramer, 38, quis deixar registradas na memória dos 19 alunos do Pré II B para os quais lecionou em 2020, pela Escola Municipal de Ensino Fundamental Henrique Bertoluci Sobrinho, que fica em Gramado, na Serra gaúcha. Com as aulas presenciais suspensas em função da pandemia, assim como em outras escolas, o processo de ensino da turma acabou sendo intermediado pelos pais, que semanalmente retiravam as atividades na escola e as aplicavam em casa para os filhos. Um grupo de Whats App foi a solução para que os vínculos fossem mantidos com os pequenos.
Segundo a professora, o engajamento foi além do esperado, rendendo imagens de inúmeras atividades que foram organizadas por ela resultando no material intitulado "Memórias da Minha Pré-Escola", e destinado a cada estudante no final do ano letivo, em dezembro, como forma de preservar boas recordações de um ano tão atípico.
— Foi um ano muito difícil e os pais falavam também sobre isso no grupo. Resolvi reunir, então, os registros que eles enviaram ao longo do ano, tanto de fotos como de vídeos, e separei por temas que foram trabalhados nas atividades. Não queria que lembrassem de 2020 apenas como sendo um ano triste — afirma a professora.
Flávia conta que, ainda no começo do distanciamento social, quando as aulas foram suspensas por 30 dias, ela teve a iniciativa de criar o grupo para sugerir algumas brincadeiras e manter o contato com os alunos, que têm idades entre cinco e seis anos, por intermédio dos familiares de cada um deles.
— Eu não me imaginava nem 30 dias longe deles. Autorizada pela direção, fui enviando algumas coias pra eles e, depois, com a suspensão sendo renovada, continuamos oficialmente com atividades que os pais retiravam na escola a cada mês — relata.
Em uma espécie de retrospectiva, Flávia elencou conteúdos que faziam parte do plano de aula e também experiências que fizeram parte do processo de aprendizagem das crianças ao longo de 2020, em tópicos como datas comemorativas, criações, cálculos, receitas e até mesmo a situação de isolamento social, que foi abordada.
O material de quase 80 páginas também conta com respostas dadas pelas crianças a perguntas relacionadas aos temas das atividades, tais como: "o que é tempo?"; "o que é generosidade?";"o que são emoções?"; com direito a respostas cheias de fofura: "Saudade é uma coisa que a gente sente falta de uma pessoa que ama muito”, disse o Joaquim.
— Gosto de ouvir a visão deles sobre o mundo e deixei os conceitos na linguagem deles mesmo — comenta a professora, que atua como educadora há 11 anos, sendo seis deles com turmas de pré-escola.
— Eu sou apaixonada pela escola e busco, tanto dentro, quanto fora da escola, meios para que as crianças possam aprender brincando, de uma forma prazerosa e lúdica. Os objetivos foram mais limitados, por causa do distanciamento, mas aproximou muito mais os familiares do processo de educação, eles se engajaram e garantiram que as crianças continuassem aprendendo — destaca a profe.
"Foi um verdadeiro presente pra gente", diz mãe de aluno
A mãe de Pedro Lersh Brock, 6, um dos alunos da turma que recebeu o livro, se emociona ao falar da dedicação e do carinho recebidos pela professora Flávia ao longo do ano, também depositados no material que ela organizou.
— Foi um verdadeiro presente pra gente. Foi bem desafiador conciliar a educação dele com com os cuidados à minha outra filha, que tem um ano e meio, mas as atividades que ela passava eram fantásticas e receber o livro foi uma surpresa incrível — afirma a mãe, Silvana Lersch Brock, 43.
Silvana era proprietária de uma academia mas acabou fechando a empresa durante a pandemia para dedicar-se à maternidade, algo que mudou completamente sua rotina e que os laços com o filho Pedro ficaram ainda mais estreitos com as vivências proporcionadas pelas atividades da escola.
— Tivemos um ganho na nossa relação de mãe e filho, ele com o pai, também, porque fizemos muitas coisas que a gente não faria se o ano letivo tivesse sido normal, com ele indo até a escola. Hoje vejo como é importante estar com os filhos. Claro que nem todo mundo pode fazer isso, mas eu não troco mais por nada — garante Silvana.