A pandemia de coronavírus teve impacto direto nos processos para requerer cidadania italiana. Se antes buscar a cidadania, via Consulado Italiano, demorava de 10 a 15 anos, agora com os processos adiados, quem sonha em se tornar cidadão italiano terá que esperar ainda mais. Para driblar essa demora, a saída era viajar para a Itália, quando a documentação estivesse pronta, e residir no país, pelo tempo mínimo exigido por lei para obter a cidadania. Com as restrições impostas pelo vírus, essa possibilidade também se torna inviável. Diante disso, a via judicial, encaminhando a documentação diretamente no Tribunal de Roma se tornou a alternativa mais procurada em escritórios especializados no assunto em Caxias do Sul.
Essa possibilidade tranquiliza Michael Fernando Camillo, 37 anos e a família dele, que aguardam ansiosos pela cidadania. Ele, a esposa Meiri Moreira Mendes, 34, o pai dele João Nelson Camillo, 63, a mãe Lourdes Mara Camillo, 59, as irmãs Luciana Camillo, 41 e Letícia Fernanda Camillo, 30, os sobrinhos Vinícius Camillo Pinheiro, 15 e Larissa Laura Camillo Pinheiro, 12 e o cunhado José Maurício Diniz Pinheiro, 45 pretendiam viajar para a Itália para requerer a cidadania em agosto de 2020. O processo para reunir toda a documentação necessária começou a cerca de um ano e meio. Com todos os documentos separados em uma pasta, crescia a expectativa da família pela viagem:
- Ingressamos com todos os papéis necessários para obter a cidadania. Somos em sete pessoas da minha família que entraram com o recurso. A nossa ideia era ir agora em agosto...de certa forma adiou (o sonho) pois quando se solicita a cidadania na Itália, o processo é mais rápido, em torno de um a três meses - conta Michael Fernando Camillo.
Sem poder viajar ao país, onde precisam fixar um tempo mínimo de residência necessário para obtenção da cidadania, os caxienses podem requerer o reconhecimento diretamente no Tribunal italiano. Assim, não precisam permanecer anos nas filas do Consulado, e também não é necessário viajar à Itália. Essa alternativa tranquilizou a família:
- O processo judicial leva em torno de um ano e meio. Estamos tranquilos porque é uma boa alternativa visto que a fila do Consulado Italiano dura muito tempo.
Até 31 de julho, estava proibida a entrada de brasileiros na Itália, e até mesmo de italianos que tenham circulado pelo Brasil nos últimos 15 dias. A restrição é uma tentativa de evitar novos casos no país que foi assolado pela pandemia. Só podem entrar na Itália, italianos que residem lá, ou quem comprovar que está indo a trabalho. Camillo aguarda ansioso a chance de viajar, mesmo que o processo esteja correndo sem necessidade dele fixar residência no país:
- Pretendo viajar para a Itália assim que liberarem o ingresso no país...vou para lazer e para negócios também, torcendo para que já tenhamos a cidadania
OPORTUNIDADE
Se para Camillo, a pandemia adiou o sonho para Bruna Brisotto, 28, foi o contrário. Ela aproveitou o tempo de isolamento social para pesquisar e encontrar uma consultoria para ajudar a reunir todos os documentos. Além de Bruna, estão no mesmo processo Jovani, 22, Rafael 27, Maira, 32, Fabiana 38, Maicon 40, Tervino, 55, Giórgia 12, Luísa e Isabela, nove, e Martina de quatro anos. O marido dela, Gabriel Beneton, 33, também está com processo via judicial para requerer a dupla cidadania.
- O sonho era antigo, e na correria do dia a dia eu não ia atrás, mas a pandemia me ajudou, porque eu tive tempo de me dedicar e avaliar o que era necessário para requerer a cidadania.
Meu tio começou a procurar os documentos em 1992. Na época, ele encontrou vários empecilhos e acabou desistindo, porque é um processo demorado, e não é simples encontrar todas as certidões necessárias.
Para mudar isso e seguir com o sonho, ela procurou uma consultoria:
- Tivemos acesso a informações que não conhecíamos, como a possibilidade de conseguir um processo mais rápido, sem esperar pelo Consulado, e também sem a necessidade de residir na Itália pelo tempo necessário para obter a cidadania, que é a diretamente no Tribunal de Roma. Sem consultoria não saberíamos dessa possibilidade que é o caminho para tornar nosso sonho real. Também foi importante ter uma pessoa para organizar todo o processo.
ALTERNATIVA
Diante da pandemia, a alternativa é ingressar com processo no Tribunal de Roma. Para isso é necessário um representante legal. Em um escritório especializado em processos de cidadania que atende em Caxias do Sul há cerca de 80 processos judiciais de caxienses em andamento.
- Essa possibilidade de requerer o reconhecimento da cidadania diretamente no Tribunal italiano, sem precisar permanecer anos nas filas consulares e sem ir à Itália, existe há muito tempo. Não era tão usada, mas agora com a impossibilidade de viagem, tornou-se a opção mais viável - explica o consultor David Manzini.
Ele ressalta ainda que é preciso que o cliente assine uma procuração para ser representado em juízo no tribunal ordinário de Roma, que é competente para quem reside no exterior, para que o escritório que também tem sede em Caxias, possa seguir com o processo na Itália.
Manzini lembra que há uma situação grave de atraso da administração pública italiana no Brasil devido ao grande número de pedidos protocolados.
- Trata-se da famosa fila para o reconhecimento que, dependendo do Consulado, pode levar até 15 anos - afirma.
Para evitar a espera, a opção é residir na Itália e direcionar o pedido diretamente ao Comune italiano onde, não há fila e assim os pedidos são rapidamente atendidos:
- Momentaneamente, devido à pandemia, esta forma de reconhecimento deve aguardar a liberação das fronteiras mundiais.
A demora no atendimento por parte dos Consulados italianos é completamente ilegal, segundo o especialista. Ele explica que levando em conta as normativas italianas, a análise e definição do pedido de reconhecimento da cidadania, por parte da administração pública no exterior (Brasil), deve ser finalizada em até dois anos:
- A grande demora no atendimento que de fato acontece na maioria dos Consulados italianos, configura-se em uma lesão de um direito pessoal de relevância constitucional que impõe a faculdade de recorrer à Autoridade Judiciária italiana. A jurisprudência na Itália está consolidada e reconhece o interesse de agir do cidadão, cujo direito à cidadania é negado devido ao tempo de espera.
ENTREGA DE PROCESSOS ADIADA
O advogado Lonis Stallivieri, afirma que os processos que foram agendados para entregas no Consulado Italiano tiveram as datas adiados:
- Não sabemos sequer se estão trabalhando internamente porque perdemos totalmente o contanto. Com isso, surge essa possibilidade de ingressar no tribunal de Roma que leva um tempo menor.
Ele complementa que apesar de não ser uma novidade, começou a trabalhar com essa alternativa para casos que não envolvam a linha materna há pouco tempo. A linha materna se refere a perda da nacionalidade da mulher nascida na Itália ou filha de italianos ao se casar com um não italiano. A lei válida até 31 de dezembro de 1947 estabelecia que a mulher passava a ter a nacionalidade do esposo, então todos os filhos de italianas nascidos até esse período perderam a cidadania italiana.
- Para tornar inconstitucional essa lei, que é um preconceito, ingressamos no Tribunal de Roma e há diversas sentenças favoráveis. Para os demais casos, ainda não tenho nenhum parecer favorável, mas é possível sim e existem sentenças favoráveis. Temos advogados parceiros para representar nossos clientes em Roma junto ao Tribunal - finaliza.
CIDADANIA ITALIANA
Quem tem direito?
Todo e qualquer cidadão que possui na sua árvore genealógica, em linha reta, um antepassado de origem italiana, que veio da Itália, pode solicitar o reconhecimento da cidadania, sem limites de gerações.
Quais os documentos necessários?
O reconhecimento da cidadania italiana se baseia no direito de sangue. O cidadão interessado deverá demonstrar documentalmente ter origem italiana. Os documentos previstos por lei são as certidões de nascimento e casamento desde o antenato italiano até o requerente. Será necessário também demonstrar que o antepassado não tenha se naturalizado brasileiro antes do nascimento do seu filho, mediante a emissão da Certidão Negativa de Naturalização.
Onde apresentar o pedido de reconhecimento?
O órgão italiano responsável para analisar e determinar o pedido de reconhecimento da cidadania do interessado que reside no Brasil é o Consulado competente pelo estado de residência do cidadão.
Leia também
Vendas para o Dia dos Pais em Caxias devem registrar queda de até 50%
Mortes por acidente de trânsito caem 31% na Serra
Três municípios seguem regras mais brandas definidas na Serra para o distanciamento social