Incomuns até poucos dias em postos de saúde do SUS, os paramentos de proteção contra o contágio do coronavírus agora são dura realidade na rotina nas equipes de Caxias do Sul. Macacões, protetores faciais, luvas grossas e outros apetrechos se tornaram itens de sobrevivência em meio a uma pandemia que sequer mostrou toda a sua força.
O uniforme azul do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu), por exemplo, cede lugar a uma vestimenta branca que cobre o socorrista dos pés à cabeça quando é há deslocamento de pacientes com sintomas suspeitos. Um paramento semelhante é obrigatório nas alas para doentes com sintomas gripais ou de covid-19 na Unidade de Pronto Atendimento (UPA) Central 24 Horas e da UPA Zona Norte onde profissionais se protegem com aventais e protetores de acrílico acoplados no rosto.
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São medidas como essas que tentam evitar o adoecimento das equipes, um dos maiores desafios da comissão de enfrentamento ao coronavírus. O grupo formado por especialistas da prefeitura concentra a atenção nos servidores das unidades básicas de saúde (UBSs) e do Centro Especializado de Saúde (CES), entre outros. Esse movimento é essencial, uma vez que dos 24 casos confirmados de covid-19 na cidade até a tarde deste domingo (5), 12 eram de médicos, enfermeiros e técnicos em enfermagem, a maioria ligada a hospitais privados. A médica infectologista Andréa Dal Bó, diretora das Vigilâncias em Saúde de Caxias, ressalta que parte dos profissionais contraíram a doença fora do local de trabalho.
A meta é capacitar e treinar os servidores municipais, com foco no uso correto dos equipamentos de proteção individuais (EPIs), nos cinco momentos de higienização e no trato com os pacientes. Seria um caos se a rede perdesse parte dessa força essencial para a pandemia, como ocorre em outros países e na capital de São Paulo.
O condutor socorrista do Samu Paulo Borges, 54, ainda tenta se acostumar à vestimenta que cobre todo o corpo e cabeça, mas sabe da importância de não virar uma vítima do coronavírus. Em média, a equipe atende de dois a três chamados envolvendo pacientes com suspeita de covid-19. É esse momento que exige a roupa especial. Em outros casos, os socorristas utilizam luvas, máscaras e aventais.
- Quando tem alguém que possa estar contaminado, a unidade se desloca com a proteção especial. Depois que o atendimento é feito, retiramos todo aquele material na base do Samu, descartamos, fazemos a higienização do que não é descartável e da unidade (ambulância) e depois partimos para a nossa higiene pessoal no local trabalho. Temos tido muito cuidado - conta Borges.
Entre outras regras repassadas às equipes, a comissão contra o coronavírus quer reforçar a mensagem de que são diferentes protocolos para variadas situações e cada detalhe não observado pode abrir caminho para o contágio. Como a Secretaria Municipal da Saúde tem 1.736 servidores, nem sempre é possível orientar cada profissional. Uma das saídas será a orientação por meio de vídeos explicativos, que serão disparados a partir desta semana.
- Para cada situação na área da saúde, há uma paramentação. Já passamos pela radiologia, em alguns postos e seguiremos indo a outros locais para tirar dúvidas, dar orientação sobre como usar a vestimenta e como tirá-la, pois a contaminação acontece nessa hora de retirar o paramento - alerta a médica infectologista Anelise Kirsch, da Comissão Municipal de Controle de Infecção Hospitalar, que tem deixado o próprio telefone à disposição para que ninguém fique em dúvida.
Estar atento à troca de roupa é crucial e a recomendação é de que o médico, enfermeiro ou técnico jamais faça o procedimento sozinho. No caso, é necessário que um colega supervisione, à distância, e alerte se algo está sendo realizado de forma errada _ como levar a mão à boca antes de lavar as mãos. Questionada se está exposta ao percorrer as unidades de saúde, Anelise é enfática:
- Quando estou na rua, guardo a distância de dois metros, que é segura. Consigo me manter assim e não examino ninguém. Sou obsessiva com os cinco momentos de higienização das mãos preconizados pela Anvisa.
Outra medida de prevenção é separar os pacientes com quadro respiratório e sintomas suspeitos de covid-19 do resto do público nas unidades de saúde. Além de proteger a população, o doente será encaminhado para profissionais devidamente precavidos, evitando o contato com o restante da equipe.
- Os pacientes são abordados na chegada da unidade de saúde. Se estão com sintomas respiratórios, ganham máscara cirúrgica. A equipe que o atenderá estará paramentada - detalha Anelise.
"Quanto mais pacientes, maior será a necessidade de EPIs"
Assim como nos hospitais, a escassez de EPIs é ponto discutido na rede municipal. O Sindiserv recebe relatos e cobra providência da Secretaria da Saúde, mas considera que não há falta permanente, apenas pontual.
Anelise Kirsch tranquiliza:
- Atualmente não nos faltam EPIs. O uso depende da demanda populacional. Quanto mais pacientes, maior será a necessidade de EPIs. Também é importante salientar que diferentes profissionais necessitam de diferentes EPIs. Por exemplo, um médico e um enfermeiro que necessitam realizar uma intubação precisam de EPIs diferentes do profissional que recepciona os pacientes nos postos de saúde - reforça a médica infectologista.
Nessa batalha contra o inimigo invisível, o profissional da higiene é o braço direito das equipes de saúde. Pode até passar despercebido do grande público, mas é ele quem precisa limpar corretamente as áreas por onde passaram os pacientes. Mas esqueça a vassoura, agora os higienizadores estão munidos de panos para não levantar poeira e espalhar o vírus.
- Eles usam luva de proteção mais grossa, uniforme (calças e blusa com manga comprida) e sapato próprio. Nesse caso, não usam máscaras - revela Anelise.
O município também busca uma forma de ampliar os exames entre os servidores da saúde. A coleta segue o protocolo do Ministério da Saúde. Atualmente são testados pacientes internados com suspeita de covid-19 e profissionais da saúde sintomáticos.
Caso a coleta ocorra fora desses parâmetros, as amostras não são analisadas. A expectativa é de que o governo federal amplie o número de testes, mas não há previsão quantitativa ou prazo.
- Há uma preocupação da prefeitura na compra por conta própria de testes em virtude da qualidade, uma vez que muitos já foram devolvidos por resultados falsos.