Consultas reduzidas, suspensas ou canceladas, colocação de bolsas de infusão em um maior número de pacientes para realizar a quimioterapia em casa, e receitas médicas estendidas. Essas têm sido algumas das novas estratégias na área de saúde para garantir atendimento a quem precisa em meio a pandemia de coronavírus.
- Os pacientes em tratamento para câncer, renais, gestantes, e aquelas pacientes com gravidez de alto risco, por exemplo, não tem como parar o atendimento. Esses pacientes continuam com as consultas e exames normalmente. Eles seguem se deslocando para os hospitais que são referência de cada munícipio para o atendimento - explica a titular da 5ª Coordenadoria Regional de Saúde (CRS), Tatiane Misturini Fiorio.
Caxias do Sul é referência para 49 municípios da Serra Gaúcha, que abrange 1,5 milhão de pessoas. Antes das medidas necessárias para combater o contágio pela covid-19, a cidade recebia centenas de pacientes vindos de municípios vizinhos para seguir tratamentos pelo Sistema Único de Saúde (SUS).
Neste momento, os cancelamentos das consultas e cirurgias eletivas são necessários, mas provocam transtornos para quem espera, às vezes, há anos por um diagnóstico, que pode resolver um problema de saúde. A longa espera por exames ou consultas com especialistas aumenta a cada dia e, com a demanda, faz crescer a angústia e a ansiedade de quem está na fila. Soma-se a isso o fato de que cada hospital ou instituição de saúde tem um protocolo de atendimento e de higienização, que foi intensificada, para combater o avanço do vírus.
- As consultas e exames continuam, com uma série de cuidados de prevenção. Tanto os hospitais, quanto os centros de referência têm um protocolo de atendimento com higienização, uso de equipamento de proteção individual, de máscaras e orientações aos pacientes. Eles (pacientes) já têm debilidade na saúde, então há uma série de cuidados para manter as consultas - ressalta Tatiane.
UBSs reduzem pela metade o número de atendimentos
Nas Unidades Básicas de Saúde (UBSs) de Caxias do Sul a rotina também mudou. As consultas que não são consideradas de urgência e emergência foram canceladas para evitar circulação de pessoas e garantir vagas de atendimento a pacientes com quadro de doenças respiratórias ou suspeitas de coronavírus. Para se ter uma ideia, de 19 de fevereiro a 18 de março deste ano, pouco antes de começar o isolamento social, 58.035 pessoas foram atendidas nos postos de saúde. De 19 de março, quando as consultas eletivas foram canceladas, a 14 de abril, foram registrados 29.247 atendimentos.
- Em um mês tivemos uma redução de quase 50% no número de atendimentos para focar nos casos de pacientes com sintomas respiratórias e nos casos suspeitos de coronavírus. Os casos de dores agudas, como dor de ouvido, dor abdominal, ou alguma queixa de dor intensa e frequente são avaliados e atendidos nas UBSs. A indicação é procurar os postos de saúde, e evitar ir até as Unidades de Pronto-Atendimento (UPAs) para que esse serviço atenda apenas urgência e emergência - orienta Patrícia Farina, diretora da Atenção Básica da Secretaria de Saúde.
Uma das medidas adotadas foi estender os prazos de validade das receitas de seis para nove meses, nos casos de medicação de uso contínuo.
- Os pacientes hipertensos, diabéticos e os que estão em tratamento para doenças cardiopatas tiveram as receitas estendidas para que não precisem de consultas ou nova ida à UBS. Com essa medida, reduzimos a circulação. Os medicamentos controlados, ampliamos de dois para seis meses - explica Patrícia, que ainda aponta um cuidado específico com as gestantes:
- O pré-natal continua sendo feito nas UBSs e temos protocolos de atendimento e orientações para manter a prevenção e os cuidados com as pacientes. É feito todo o acompanhamento, mas nos casos de uma gestação tranquila, sem indicação de risco, as consultas podem ser mais espaçadas. Passamos os atendimentos de 30 para 45 dias.
A diretora ainda afirma que consultas de crianças na UPA devem ser evitadas neste momento:
- Caso elas apresentem sintomas, os pais devem levar nos postos de saúde dos bairros onde moram e, se não tiver pediatra, ele será encaminhado à unidade mais próxima.
Centros de tratamento contra o câncer adaptam serviço
Em Caxias do Sul, há dois centros de referência para tratar o câncer: o Instituto do Câncer do Hospital Pompéia (Incan) e a Unidade de Alta Complexidade em Oncologia (Unacon) do Hospital Geral (HG). As duas instituições atendem pelo SUS e são consideradas exemplos de eficácia, com serviços de excelência. Entre os serviços estão o diagnóstico, consultas, quimioterapias, cirurgias, tratamentos, biópsias e pesquisas clínicas. São médicos, enfermeiros, técnicos em enfermagem, farmacêuticos, nutricionistas, fisioterapeutas, psicólogos e terapeutas ocupacionais preparados para oferecer tratamentos modernos e mais humanizados a quem luta contra o tempo para vencer a doença. Em função da pandemia, na Incan, esses atendimentos foram suspensos:
- As consultas com a equipe multiprofissional foram suspensas, mas quem faz quimioterapia ou precisa iniciar o tratamento segue em atendimento. Os médicos avaliam as agendas para que aqueles pacientes que já estão curados retornem em 90 dias para reduzir a circulação de pessoas no hospital. E também estendemos os prazos das receitas por mais tempo para buscarem menos o serviço presencial - afirma o coordenador do Incan, o hematologista Tiago Daltoé, que complementa ao falar sobre os cuidados pelo momento de pandemia:
- Precisamos optar por salvar vidas, mas de uma maneira segura. Ninguém irá perder a chance de ser curado. Então, os casos novos confirmados com os exames seguem sendo aceitos. Nós temos avaliado cada prontuário para garantir atendimento e tratamento a quem precisa e não pode ficar sem acesso à quimioterapia. Não podemos colocar a saúde deles em risco e nem sem acesso ao tratamento.
Atualmente, 1.208 pacientes seguem em tratamento contra o câncer, seja pelo SUS ou por convênios. O Pompéia implantou uma série de cuidados para quem não pode faltar às consultas:
- Nosso serviço tem uma particularidade, que é o atendimento no segundo andar. Então, antes do paciente de entrar no hospital e subir para o instituto, a equipe pergunta se ele teve febre, se tem sintomas gripais e, caso haja algum sintoma que sugira gripe, ele é orientado a ir ao pronto-atendimento.
RESTRIÇÕES NA UNACON
A coordenadora médica da Unacon, Rita Costamilan, explica que as agendas foram organizadas para não se ter muitos pacientes ao mesmo tempo no serviço:
- Na sala de quimioterapia fica somente o paciente. Antes, podia ficar um familiar também. Mas, agora, com exceção de pacientes idosos e que necessitam acompanhante, não fica mais. Também estamos fornecendo para os pacientes em tratamento kits de máscaras caseiras com orientações de cuidados em relação à covid-19. Essas máscaras foram todas doadas para o hospital.
Rita ainda explica que pacientes com diagnóstico recente estão sendo atendidos com agenda determinada, também para evitar grande circulação de pessoas.
Cuidados redobrados na quimioterapia
A jornalista Ana Carolina Azevedo, 34 anos, descobriu um nódulo na mama direita em uma viagem de férias, em junho do ano passado. Após passar por um processo de negação, realizou todos os exames necessários, descobriu um tumor de sete centímetros e iniciou a quimioterapia no Hospital Tacchini, de Bento Gonçalves. Ela conta que, mesmo com a pandemia, o tratamento seguiu:
- Comecei a quimioterapia no dia 3 de outubro e concluí o tratamento, que seguiu como o previsto, mesmo com a epidemia. Tomei o máximo de cuidado. Estou isolada desde o dia 16 de março e só saí para fazer as sessões de quimio e os exames pré-operatórios. No setor de oncologia eles só deixavam subir para o andar da quimio poucas pessoas por vez, subindo e já sendo atendido.
Nos últimos dias, ela aguardava com ansiedade a cirugia, que estava marcada para a última quarta-feira:
- Terminei as sessões de quimio e logo eles marcaram a cirurgia, uma dupla mastectomia. Fiquei em contagem regressiva para isso. O procedimento foi agendado porque ainda tem toda a estrutura de salvamento disponível, caso precise de leito na UTI. Tive mais cuidados do que nunca, porque se eu tivesse tosse, febre, a cirurgia é cancelada.
A cirurgia foi realizada e, na manhã da quinta-feira, a jornalista se recuperava no quarto. Ela afirmou que o procedimento foi mais tranquilo do que o esperado:
- Tenho muita dor, mas faz parte do processo. A cirurgia correu bem e foi mais tranquila do que eu tinha imaginado. Agora é focar na minha recuperação _ disse, confiante.
"Só saio de casa para ir ao médico", diz paciente do HG
Izélia Campos, 60, também luta contra o câncer desde junho do ano passado. Ela passou por duas cirurgias para a retirada dos tumores e por dois ciclos de quimioterapia.
- Meu tratamento segue normalmente, mas com todos os cuidados necessários para me deslocar até as consultas. Uso luvas, máscaras, levo álcool gel, e a equipe também tomou todos os cuidados durante o atendimento.
Paciente da Unacon, ela só sai de casa, no bairro Bela Vista, para ir até o Hospital Geral.
- Estou esperando o agendamento da terceira cirurgia. Estou em isolamento social. Só saio de casa para ir ao médico - garante ela.