Historiadores e sociólogos não gostam de relacionar guerras ou conflitos de fundo político com a violência comum. Não há como negar, porém, que a Revolução Federalista provocou estragos em todo Rio Grande do Sul e deixou um rastro de sangue e corpos em Caxias, tragédia vagamente detalhada em documentos oficiais, mas que sobreviveu na memória dos primeiros moradores de Caxias do Sul.
Há relatos de que sob a região do Estádio Alfredo Jaconi estão sepultados soldados maragatos, revolucionários contrários ao presidente do Rio Grande do Sul, Júlio de Castilhos. Os rebeldes discordavam do novo regime baseado no presidencialismo e lutavam por um sistema parlamentar. A guerra eclodiu em 1893, dividiu o RS entre federalistas e republicanos e se espalhou pelo três Estados do Sul, envolvendo brasileiros e também imigrantes na Serra.
Na manhã de 29 de junho de 1894, os colonos de Caxias acordaram com a invasão da cidade pelo exército maragato. Muitas famílias buscaram refúgio em matagais. Os legalistas, em menor número, conseguiram manter a defesa da cidade por meio de voluntários e soldados do 44º Batalhão da Guarda Nacional. Houve mortes. Na fuga, já no início da noite, os maragatos incendiaram diversos prédios e pilharam parte da cidade.
A vingança não tardou. Logo após o ataque, o exército republicano prendeu diversos rebeldes em Caxias, em São Marcos e nos Campos de Cima da Serra. Os prisioneiros foram trazidos para um barracão na esquina da Rua Os 18 do Forte com a Coronel Flores. Ali, muitos receberam a sentença de morte da época: a degola, meio empregado por ambos os lados para poupar munição.
Entre o grande grupo levado para um mato onde décadas depois foi erguido o estádio, estava um maragato chamado Lídio e o filho dele de 12 anos, conforme anotou o historiador João Spadari Adami (1897-1972) no livro A História de Caxias.
"O primeiro a ser sacrificado foi o menino, apesar de chorar desesperadamente e prometer ao degolador tenente Mangabeira que serviria o governo quando tivesse idade para tal", escreveu Adami, com base no relato de João Leonardelli, uma das testemunhas.
O garoto morreu na frente do pai, que acabou sendo executado. Os corpos deles e de outros maragatos foram enterrados em uma vala comum num banhado e esquecidos para sempre —boa parte era de origem polonesa, conforme a historiadora Loraine Slomp Giron.
A quantidade exata de execuções nunca veio à tona. A revolução só terminaria em 1895, com um saldo de 10 mil mortos no Rio Grande do Sul.
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