A prisão do médico Valmir Venâncio da Silva, suspeito de abusar sexualmente de uma paciente grávida em São Leopoldo, levanta uma questão: se ele já havia sido indiciado e denunciado por três casos semelhantes em Caxias do Sul e havia sido demitido neste ano por envolvimento em outra denúncia de abuso na UPA Zona Norte, também em Caxias, por que ele seguia atendendo pacientes numa unidade de saúde?
Apesar dos inquéritos da Polícia Civil e de uma sindicância aberta pelo Conselho Regional de Medicina (Cremers) para investigar as denúncias em Caxias do Sul, não haveria impedimentos para o médico ser contratado na UPA do bairro Scharlau, em São Leopoldo, onde foi detido em flagrante no início da noite de quarta-feira e teve a prisão preventiva decretada nesta quinta-feira pela Justiça.
Em Caxias do Sul, ele foi demitido da UPA Zona Norte em fevereiro deste ano após denúncia de abuso. Ele também foi indiciado pelo crime no último dia 11 de abril, enquadrado no artigo 215 do código penal, que indica ato libidinoso mediante fraude.
Além do indiciamento de abril em Caxias do Sul e da prisão em flagrante em São Leopoldo, há um processo tramitando contra Silva na 2ª Vara Criminal de Caxias relativo a um inquérito com pelo menos três vítimas denunciando abusos durante consultas, crimes que teriam ocorrido num posto de saúde do município em 2016.
Apesar das denúncias, Silva não tem condenação. De acordo com o presidente do Cremers, Fernando Matos, o órgão não pode fazer com que um médico denunciado seja impedido de exercer a profissão até que se esgotem todas as possibilidades de defesa e ele seja considerado culpado.
Da mesma maneira, Silva poderia ser contratado enquanto responde judicialmente por acusações. Por outro lado, o presidente do Cremers faz um alerta.
— Quem contrata tem que ter o cuidado de fazer uma investigação (sobre o candidato) — alega Matos.
O Cremers está com uma sindicância em aberto para apurar o caso em Caxias registrado contra Silva em fevereiro e abriu uma nova sindicância para apurar a conduta do profissional em São Leopoldo. As sindicâncias podem determinar punições como o impedimento do exercício da medicina, mas somente após a conclusão da investigação interna do Cremers.
O advogado que representa o médico, Régis Eduardo Krauze, disse que a defesa ainda não vai se manifestar sobre a nova denúncia e os casos anteriores.
Em depoimento na Delegacia da Mulher em Caxias, o médico negou todas as acusações. Ele também ressaltou que não entendia o motivo de estar sendo denunciado, de acordo com a delegada Thais Norah Postiglione.
Depoimento de vítima
A vítima que denunciou o médico em fevereiro é uma mulher de 27 anos. Ela diz que quando soube da prisão de Silva em São Leopoldo logo imaginou que se tratava do médico que havia consultado na UPA Zona Norte. A situação descrita pela paciente de São Leopoldo era muito parecida com a que ela havia passado em Caxias.
A caxiense conta que esteve na UPA numa noite de fevereiro para averiguar uma picada de inseto no braço e um vermelhidão no pescoço. Ela estava usando um vestido de alça e disse ao médico que não havia nenhuma lesão nos membros inferiores. Mesmo assim, Silva teria pedido que ela tirasse toda roupa. Em seguida, segundo a mulher, o médico teria apalpado os seus seios e suas nádegas. Depois que ela se vestiu, o constrangimento continuou.
— Enquanto ele prescrevia o remédio, continuou em uma conversa muito longa e constrangedora, falando sobre posições sexuais e me fazendo perguntas — lembra a mulher.
A paciente foi medicada no ambulatório e, depois, diz ter sido chamada novamente por Silva no consultório. Ali, segundo ela, o médico pediu novamente que ela tirasse a roupa para o exame. Quando ela se negou a tirar o sutiã e se mostrou constrangida, o médico começou a se justificar.
— Ele tentou até o final. Quando viu que eu estava muito constrangida, me pediu desculpa — conta a vítima, que registou ocorrência no dia seguinte ao acontecido.
Sobre a prisão do médico, ela lamenta que tenha sido tardia
— Fico triste por ele ter feito isso com outras mulheres. Não precisavam outras vítimas para ele ter sido preso — desabafa.