Uma rede que envolva prefeitura, Estado e diferentes segmentos como saúde e assistência social pode ser o antídoto para frear uma estatística preocupante: a evasão escolar em Caxias do Sul. Somente em 2016, foram 2.724 crianças e adolescentes que não voltaram para a sala de aula, forte indicativo da desestruturação familiar e da formação de cidadãos vulneráveis à violência – e que acabam crescendo sem criar grandes vínculos com a sociedade. Ao todo, naquele período, 4.211 alunos foram dados como infrequentes, ou seja, se ausentaram por cinco dias seguidos ou mais, o que corresponde a 6% do total dos cerca de 70 mil jovens matriculados na rede pública.
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Não há sinais de que o número vá baixar em 2017: até o dia 27 de abril, o Conselho Tutelar recebeu 629 encaminhamentos de alunos infrequentes. Isso significa que 13 crianças e adolescentes abandonaram a escola por dia, em apenas 48 dias de ano letivo.
Os dados abrangem da Educação Infantil ao Ensino Médio, além da Educação de Jovens e Adultos (EJA). Mesmo que difícil, a tarefa de reduzir esse índice é desafio já instalado dentro de cada escola. Desde o ano passado, uma indicação do Ministério Público (MP) orienta que núcleos de trabalho sejam formados em cada colégio com pais, professores e membros da comunidade para resgatar esses alunos.
A partida da discussão são as Fichas do Aluno Infrequente (Ficais), documento preenchido pela escola na ausência do aluno. O ideal é que o documento seja elaborado a partir do sexto dia de ausência, mas nem sempre é o que acontece, segundo o Conselho Tutelar.
– A maioria das escolas encaminha a ficha depois de três meses, por exemplo, o que dificulta muito esse trabalho de resgate do aluno – avalia a conselheira Rosane Formolo.
Reuniões mensais que debatem o assunto e tentam organizar uma rede de informações sobre os alunos são conduzidas pela promotora pública Simone Martini. Da secretária de Educação à assistente social, todos os setores da sociedade estão sendo alertados para um trabalho conjunto contra a evasão.
– Se o aluno não está vindo, quem pode me dizer o que está acontecendo é um agente de saúde que visitou a família, é o agente do Primeira Infância Melhor, é uma liderança comunitária. Os representantes de entidades que integram a rede devem traçar estratégias – ressalta Simone.
Conselho Tutelar e MP conseguiram levar de volta quase 1,5 mil alunos no ano passado.
– Muitas vezes, o jovem precisa arrumar uma renda para a família e que pode envolver tráfico ou prostituição. Nesta situação, é mais difícil recuperá-lo – avalia a presidente do Conselho de Educação, Márcia Fernandes.
Se o ambiente escolar é o ideal para distanciá-los da criminalidade e aproximá-los de um futuro melhor, difícil é articular o combate aos fatores que retiram os jovens da sala de aula, tarefa a ser trabalhada nos próximos meses.
– Há negligência familiar e de violência no entorno da escola, mas percebemos que cresce o número de alunos que deixam de ir à escola por dificuldades de aprendizado. Isso só é possível reverter com suporte dentro do colégio – pondera Márcia
De acordo com relatório do Ministério Público, 4.211 Fichas do Aluno Infrequente (Ficais) foram abertas em 2016:
:: O número de estudantes que retornaram às escolas no ano passado foi de 1.487.
:: Resistência e negligência familiar são os dois itens que lideram a lista de justificativas para evasão escolar em Caxias.
:: Distorção entre a idade e a série frequentada, além da dificuldade de aprendizado, são outros motivos expressivos.
:: Segundo o MP, a taxa de retorno de alunos à sala de aula via encaminhamento da escola é de 54%. Em situações encaminhadas pelo Conselho Tutelar é de 29% e via Ministério Público é de 41%.
:: Alunos dos anos finais do Ensino Fundamental correspondem a uma fatia expressiva do levantamento do MP, com 35% dos encaminhamentos. Em segundo lugar, estão alunos do Ensino Médio, com 24%. Os anos iniciais do Ensino Fundamental figuram em terceiro, com 19%. A Educação de Jovens e Adultos (EJA) e Educação Infantil são os que menos aparecem na listagem.