Atrás do balcão da Pimentel Materiais de Construção, instalada há 20 anos no loteamento Rosário I, a foto de um homem sorridente parece zelar pelas pessoas que lá trabalham.
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para os 100 anos do Hospital Pompéia
Há dois anos, no dia 3 de maio de 2011, o personagem da fotografia, Adimar Luiz Pimentel, então com 49 anos, deixava a família órfã depois de sofrer um aneurisma. Ele sentiu-se mal um dia antes, enquanto trabalhava atrás do balcão da loja, como fazia todos os dias.
- Dezessete dias antes, ele tinha feito um check-up completo e deu tudo bem. No final de semana, fizemos um churrasco com o pessoal da loja, para comemorar o dia 1º de maio. Ele estava muito alegre. Na segunda-feira, perto do meio-dia, um funcionário me chamou dizendo que ele estava se sentindo mal. Levamos imediatamente ao Pompéia, onde ele foi examinado e operado. Na manhã de terça-feira, quando eu e minha filha viemos em casa para tomar um banho, ligaram dizendo que ele não tinha resistido. Não conseguimos nem nos despedir. Se eu soubesse, não teria deixado ele lá aquele dia - recorda a viúva Sueli Fabro Pimentel, 52.
A dor da perda, porém, não impediu que os Pimentel exercessem um ato de compaixão: as córneas do comerciante foram doadas e beneficiaram dois jovens de Farroupilha e Bento Gonçalves.
- Meu marido nunca manifestou em vida a vontade de ser doador, mas ele ficou tocado quando soube de uma pessoa aqui do bairro tinha recebido um rim. Achou bacana o gesto de salvar uma vida. Quando o pessoal do Hospital Pompéia veio conversar comigo e com os meus filhos sobre a doação, ninguém vacilou. Tivemos certeza de que ele concordaria com a nossa decisão - afirma Sueli.
Sem saber, ela e os filhos Fernanda, 30, Gleison, 25, e Rubia, 23, escreveram o nome de Adimar de maneira especial na história do Pompéia: ele é o 1000º doador de córneas da instituição. Uma placa na portaria central do hospital marcou o gesto e homenageia também as demais famílias que ajudaram a amenizar o sofrimento dos que estão na fila do transplante.
- A única coisa que peço a Deus é que as pessoas que receberam as córneas sejam tão boas de coração quanto o Adimar. Ninguém se conforma em perder um familiar, mas na vida a gente sabe que é preciso que alguém se vá para que outra pessoa se salve - reconhece Sueli.
Sem o pai, mãe e filhos precisaram reaprender a viver e a tocar o negócio que até hoje garante o sustento de todos. Sueli, que é formada em Letras e dava aulas na rede estadual, teve de aprender a ser comerciante do dia para a noite.
- Ele fez questão de trazer os filhos para trabalhar com ele na loja. Sempre dizia que o caminho estava aberto e que cabia a eles dar continuidade ao esforço dele. Quando o Adimar morreu, ficamos sem chão. Vieram os problemas e muita gente se aproveitou da nossa fragilidade. Mas estamos batalhando para seguir em frente.
Para a filha Fernanda, a decisão de doar os órgãos de Adimar foi acertada.
- Depois que ele morreu, não parei mais para pensar na decisão que tomamos. Mas hoje, analisando com mais atenção, acho que foi um gesto bom. As córneas do meu pai estão dando a alegria de duas pessoas enxergarem a vida. Ele tinha um bom coração, um carisma muito grande e tenho certeza que teria tomado a mesma decisão se estivesse no nosso lugar - acredita.
Para ela, além da dor da perda do pai, ficou a frustração de não tê-lo homenageado em vida, por tudo o que ele representava para a família. A placa afixada no corredor junto à portaria central do Pompéia, onde estão uma foto e uma mensagem póstuma dela, dos irmãos e de Sueli, porém, ajuda a compensar as palavras não ditas.
- É uma pequena homenagem e vai mostrar a todo mundo que entrar naquele hospital o grande homem que foi o meu pai - pondera Fernanda.
Marco
Conheça a história do milésimo doador de cornéas do Hospital Pompéia
Adimar Luiz Pimentel morreu em maio de 2011
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