
No ano de 1975, Caxias do Sul era bem diferente da atual e pujante do século XXI. O vai e vem de carros e caminhões era tradicional, mas os som dos motores não são iguais aos modernos modelos que cortam o verde da Serra. Hoje, até elétricos passam pelo asfalto.
Naquele ano, a Serra celebrava o centenário da Imigração Italiana e o Juventude dava um passo gigante na sua estrutura física. O modesto estádio Quinta dos Pinheiros, primeira casa alviverde, se transformava na fortaleza jaconera.
— A Quinta surge quando o Juventude adquire esse terreno aqui na (rua) Hércules Galló com a família Corso, e é construído um primeiro campo. Mas esse era de forma muito amadora, a gente tinha só as linhas de fundo, um gramado tradicional, e a gente brinca que era só uma cerca de madeira que dividia onde estavam os jogadores e onde ficava esse público — explica Amanda Dal Cero, historiadora do memorial do Juventude, que completa:
— Com o passar dos anos, vamos vendo ali, principalmente na década de 1940 e 1950, o surgimento de uma arquibancada coberta, um primeiro pavilhão.
O terreno atual do clube foi adquirido em 4 de junho de 1919 e o campo foi reformado em 1946. Em 1954, o estádio deixa de se chamar Quinta dos Pinheiros e foi rebatizado para Alfredo Jaconi, dois anos após a trágica morte do ícone do clube.
— O Alfredinho participou de direções, foi conselheiro, foi diretor e foi presidente do clube também em três oportunidades. E foi justamente nessa terceira oportunidade que a gente começa a falar das construções e das reformas aqui do estádio. Ali nos anos 1950, quando a gente tem a profissionalização do esporte no Brasil — explica Amanda Dal Cero.
QUINTA REFORMADA

Com o crescimento do clube e da cidade, as discussões para a reforma e a ampliação tomaram conta dos anos de 1950 na casa alviverde. Inclusive, houve uma exigência da Federação Gaúcha de Futebol (FGF) para a participação do Juventude na recém-criada Divisão de Honra do futebol gaúcho. Assim, os dirigentes precisaram construir novas arquibancadas, como a ferradura norte, com lajes de pedra e degraus. Na sequência veio a arquibancada leste em madeira, acolhendo aproximadamente sete mil torcedores.
Newton de Carvalho lembra que o seu pai, o ex-presidente Lauro de Carvalho, ajudou na construção do espaço da ferradura norte e não foi uma missão muito fácil na época.
— O meu pai tinha uma amizade com uma pessoa que tinha uma pedreira e essa pessoa estava precisando de terra. Daí eles trocaram terra por pedras para fazer uma arquibancada, sem dinheiro nenhum. O cara veio tirar a terra, já foi escavando, e eles depois conseguiram uma vaquinha para comprar o cimento, mas não tinham dinheiro para pagar a mão de obra. E o pai disse que conversou com uns 20 pedreiros que se propusessem a fazer o trabalho no final de semana, e essas pessoas não pagariam para entrar no campo para assistir aos jogos do Juventude — recordou Newton.
OUTRA REALIDADE
Antigamente, praticamente a cidade acabava aqui
NEWTON DE CARVALHO
Filho do ex-presidente do Juventude, Lauro de Carvalho.
Hoje, o torcedor do Juventude se desloca com facilidade para assistir aos jogos do Verdão. Com o crescimento populacional de Caxias do Sul, o estádio ficou praticamente no coração da cidade, com diversos acessos. Contudo, em 1975, o espaço era rodeado de casas, nada das muralhas de concreto que dividem espaço na paisagem serrana.
— Era uma região de casas, um bairro normal, onde tinha um estádio. Praticamente a única coisa que tinha aqui era, justamente, o estádio. A rodoviária veio depois, aí sim mudou muito o movimento, ajudou a se formar o bairro, pra que se tornasse comercial. Antigamente, praticamente a cidade acabava aqui — recorda Newton de Carvalho.

Presidente do Juventude em 1977 e em outras três oportunidades, Carlito Chies lembra que chegou a jogar no antigo Estádio Quinta dos Pinheiros. Quando jovem, morava a 30 metros do estádio e seu pavilhão de madeira.
— Eu tive praticamente a minha ligação desde quando, aos 18 anos, eu vim jogar aqui, era centroavante. Nós jogávamos aqui quase de noite, com luzes jogadas aqui em cima. E o cara via até metade (do campo), depois dali do meio para lá não tinha mais — contou o ex-presidente.
O NOME DA REFORMA
Willy Sanvitto vai e faz o que a gente conhece hoje como o caldeirão nebuloso, como essa grande estrutura mística que é o Estádio Alfredo Jaconi
AMANDA DAL CERO
Historiadora do Memorial do Juventude.
Nos anos 1970, o Brasil vive uma onda de unificações e fusões dos times. Em Caxias do Sul não seria diferente. Em 14 de dezembro de 1971, devido a dificuldades financeiras, o departamento de futebol do Caxias e do Juventude se uniram. A "fusão" originou a Associação Caxias de Futebol, nas cores preto e branco, e durou até 1975, quando o Estádio Alfredo Jaconi ganhou um novo formato, que é visto atualmente pelos olhos mais fanáticos alviverdes.
— O coração juventudista de querer ter o seu estádio e ver o Juventude brilhando sozinho, com seu nome, reverberando toda a história que a gente teve, faz com que isso venha ainda mais forte. Assim, Willy Sanvitto vai e faz o que a gente conhece hoje como o caldeirão nebuloso, como essa grande estrutura mística que é o estádio Alfredo Jaconi — aponta Amanda.
A GRANDE REFORMA DE 1975

Em toda a instituição que resiste a marca dos 100 anos, a evolução é intrínseca. Novamente, os abnegados entraram em campo para uma grande reforma no Alfredo Jaconi. Em 1972, sob o comando do histórico presidente Willy Sanvitto, algumas estruturas do estádio são colocadas abaixo e a madeira vai dando lugar a uma imponente estrutura de cimento e áreas internas mais profissionais. O escritor Francisco Michielin detalhou aquele período de transição.
— O antigo e saudoso pavilhão de madeira do Esporte Clube Juventude começa a se despedir, já com o gigante de cimento armado o enfeixando em suas costas. Era só o começo da obra, e já era possível perceber a diferença de tamanho das duas estruturas. A primeira, de 1946, a segunda, em 1974, para conclusão em 1975. Ao fundo, a cidade crescia lentamente — descreveu Michielin no livro Juventude: Paixão e Glória.
Ao final de 1974, o novo Jaconi já está praticamente pronto, mas é somente em 1975, no dia 23 de março, durante as comemorações alusivas ao centenário da Imigração Italiana, que o estádio está pronto. O jogo inaugural foi sem gols. O Papo recebeu o Flamengo-RJ e a partida terminou em 0 a 0.
A REFORMA DO TERCEIRO MILÊNIO
Por décadas o Estádio Alfredo Jaconi permaneceu com a sua estrutura igual a de 1975, com pequenos ajustes, como a inclusão dos camarotes e da área coberta. Neste período, o time foi campeão da Série B do Brasileirão, do Gauchão e da Copa do Brasil. O Jaconi viu o Juventude jogar a Copa Libertadores da América, algo inédito para um clube do interior do Rio Grande do Sul.
Após um começo de ouro na virada do século, o Verdão também ficou 13 anos longe da elite nacional. No entanto, conquistou o acesso à Série A do Brasileiro em 2021 e viu uma nova oportunidade.
Sob o comando do presidente Walter Dal Zotto Junior, os dirigentes e o conselho de administração viram que era necessário o clube modernizar internamente o Jaconi.
— Isso surgiu através do Conselho Deliberativo, na presidência do Luis Ozelame. Essa ideia de nós começarmos uma melhoria nas estruturas internas, com muito apoio do Conselho Deliberativo naquela ocasião. E depois eu acho que isso nos deu ânimo para nós evoluirmos também, em melhorias no gramado, melhorias de acesso, vestiários, e no Jaconi como um todo. Nós sentíamos que precisava de uma evolução. Acho que o que oportunizou tudo, com certeza, foi o acesso à Série A — comentou Waltinho.
Após o acesso, os ambientes internos do Jaconi viraram um canteiro de obras. Foram reformas em todos os vestiários, novo acesso ao campo atendendo ao padrão Fifa, gramado trocado, iluminação reforçada com sistema em LED, novas cadeiras, nova sala de imprensa e nova sala do Conselho Deliberativo, que leva o nome do pai do ex-presidente, Walter Dal Zotto.

Também foi na gestão de Waltinho, como é chamado pelos amigos, que o Juventude teve que fechar as portas do seu estádio para a torcida devido a uma pandemia de Covid-19.
— O Jaconi sempre foi para nós um talismã que nas grandes conquistas nos ajudou muito nesse aspecto. E esse acesso que nós tivemos da B para A foi na época da pandemia, e nos estádios vazios. Então, é um momento único, um momento ímpar que nós tivemos que nos reinventar em todos os aspectos — declarou Walter Dal Zotto Júnior, que completou sobre o futuro do Jaconi:
Eu te diria que daqui a 50 anos nós vamos ter um outro Alfredo Jaconi, com certeza. Porque as coisas são constantes e muito dinâmicas
WALTER DAL ZOTTO JUNIOR
Ex-presidente do Juventude
NO TERCEIRO EPISÓDIO...
A série "Fortaleza Alviverde - 50 anos do Estádio Alfredo Jaconi" falará dos jogos marcantes na casa alviverde, a partida da neve, a era Parmalat e as conquistas de 94, 98 e 99 contadas por ídolos e dirigentes históricos.