Comprar itens de sites estrangeiros que oferecem grande diversidade de produtos a preços tentadores se tornará prática regulamentada. Uma portaria, publicada pelo Ministério da Fazenda na última sexta-feira (30), isenta, a partir de 1º de agosto, o Imposto de Importação. A isenção do tributo enquadra compras de até US$50 feitas por pessoas físicas, mas cobrará na fonte a arrecadação de 17% do ICMS.
No entanto, o benefício para quem compra no e-commerce acende o alerta para comerciantes de lojas físicas, fabricantes nacionais e entidades ligadas ao comércio em Caxias do Sul. A concorrência com o mercado eletrônico e a possibilidade de sites estrangeiros exportarem compras acima de R$ 200 sem taxação de importação é vista como concorrência desleal.
Até então, apenas a importação de medicamentos, no valor de até US$ 10 mil por CPF, era isenta do imposto. As demais encomendas internacionais, destinadas à pessoa física ou jurídica, estavam sujeitas à alíquota única de 60%, mas nem sempre taxadas, e limitadas ao valor de US$ 3 mil.
Para a empresa fazer a venda com o imposto zerado, é necessário que ela seja inscrita no sistema "Remessa Conforme", da Receita Federal, e que realize o recolhimento do tributo estadual (ICMS) incidente sobre a importação.
Nesse caso, o pagamento do tributo estadual, pela empresa de comércio eletrônico é antecipado, para que a Receita faça previamente a gestão de risco da encomenda e ela chegue com maior rapidez ao consumidor.
No viés do governo trata-se de uma regularização a um mercado que disparou as vendas nos últimos anos, principalmente de sites asiáticos, e que necessitava de regulamentação. Mas a isonomia da decisão é questionada por entidades como a Câmara de Dirigentes Lojistas (CDL) de Caxias do Sul.
— A portaria regulamenta as compras vindas dos sites internacionais, o ICMS de 17% estará garantido, porém, o comércio é contra, porque o nosso comércio não tem a mesma isenção — questiona o gerente administrativo da entidade, Carlos Cervieri.
Formada por 95% de associados vindos de micro e pequenas empresas, a CDL entende que isenção cobre o mesmo valor médio gasto hoje pelos consumidores nas lojas da cidade. A compra em um comércio estabelecido no país, segundo Cervieri, gera renda, empregos e faz a economia circular, diferentemente de compras realizadas de sites com base no Exterior e principalmente na China.
O questionamento é compartilhado pela vice-presidente do Sindilojas de Caxias do Sul, Márcia Costa, que aponta a falta de isonomia fiscal, princípio onde todos devem ser submetidos às mesmas regras.
— Não estamos pedindo regalias, é um absurdo o que o governo faz incentivando sites estrangeiros e indo contra o nosso comércio, isentando justamente um valor de compra muito próximo à média que é vendida pelo pequeno comércio — afirma.
Além disso, de acordo com Márcia, é importante atentar para o fato de os consumidores, como forma de driblarem as regras, realizarem mais de um compra, sempre abaixo dos US$ 50, para fugir da taxação. A medida pode ainda criar um mercado informal de comerciantes comprando como pessoas físicas e revendendo nas lojas às quais são proprietários.
— Um comerciante sério vai pagar 60% de imposto, às vezes mais, para importar e precisa repassar esse valor para o consumidor. A portaria pode ser driblada com diversas pequenas compras — disse.
Consciência coletiva para valorizar o que é daqui
Importados por sites baseados fora do país, os produtos com preço baixo são tentadores também para comerciantes. É preciso lidar com uma balança que tem nesse modelo de compra e venda comércios que, ao mesmo tempo em que são concorrentes, podem ser fornecedores.
Proprietária de uma loja de acessórios na Avenida Júlio de Castilhos, no Centro de Caxias, Marília Kuquert, 26 anos, tem expostos produtos comprados em São Paulo e importados da China. Mas também calçados fabricados em solo gaúcho.
— O comércio do centro já sofre com uma forte concorrência estrangeira que se instalou na cidade e vende importados. Nossa estratégia é incluir roupas e buscar um consumidor que ainda ache mais garantido comprar presencialmente — conta Marília.
A aposta de Marília é com o vestuário que, muitas vezes vindo da China, chega com tamanhos diferentes do imaginado pelo consumidor. Além disso, contar a história do produto e valorizar sua fabricação nacional pode, segundo ela, alterar os hábitos de consumo.
— Acho que é preciso reforçar a brasilidade, isso falta um pouco, uma consciência coletiva de valorizar o produto e a mão de obra daqui. As pessoas buscam preço e hoje gostam de dizer que pagou barato, mesmo que saiba que seja um produto fabricado em grande escala e em outro país. Precisamos fazer um trabalho de conscientização e valorização do que é nosso — opina.