O cultivo de trigo não era algo muito comum até bem pouco tempo em Caxias do Sul. Alguns produtores ficaram motivados pela produção do Estado, que não para de crescer e deve bater um recorde em 2022. Em Caxias, o trigo é cultivado em 230 hectares. A maior parte dele está localizada no distrito de Vila Oliva, onde a agrônoma Cristiane Andreazza e o marido Alexandre, também agrônomo, passaram a produzir o cereal desde o ano passado.
— Até onde sabemos, fomos os pioneiros no plantio de trigo no município, depois de uns 50 anos. Era bem diferente, e basicamente para consumo da família. Identificamos potencial aqui para plantar também um cultivo de inverno, visto que, normalmente, plantamos culturas como aveia apenas para cobertura do solo. O trigo se enquadra bem para ser cultivado em uma parte da lavoura que terá o plantio de soja mais no final da janela — explica a agrônoma.
Logo no primeiro ano de cultivo, a produtividade alcançou 86 sacas por hectare e, como o valor de mercado foi atrativo, este ano Cristiane dobrou a área plantada. Hoje a produtora possui 150 hectares de trigo que estão divididos em dois locais: 75 em Vila Oliva e outros 75 hectares em São Francisco de Paula. A produção é vendida em municípios próximos, como Vacaria e Teutônia.
— Acredito que o cultivo do trigo possa ser uma alternativa, mas para áreas que possam ser cultivadas com outros produtos a partir de dezembro. Para culturas que precisam ser estabelecidas antes, não se mostra uma alternativa — comenta Cristiane.
A produção deste ano sofreu com geadas tardias e com ventos muito fortes. Possivelmente, os rendimentos serão um pouco menores do que no ano passado, em torno de 80 sacos por hectares.
— É um aproveitamento de área, de maquinário existente. O cultivo deixa uma grande massa de palhada cobrindo o solo, sem contar que estamos produzindo mais alimentos e viabilizando o nosso negócio - afirma a agrônoma.
Produção em Caxias ainda é pequena
O Rio Grande do Sul deve colher cerca de 4 milhões de toneladas de trigo, de acordo com a Emater-RS. A área dedicada ao cereal no Estado é de 1,413 milhão de hectares. Os 230 hectares produzidos atualmente em Caxias não representam muito em números. O município conta, por exemplo, com 3,6 mil hectares de produção de uva, segundo a Secretaria de Agricultura. O que demonstra que o cultivo ainda é pequeno, mas existe uma tendência de crescimento, principalmente nas regiões de campo como as do distrito de Vila Oliva. São áreas relativamente planas, onde o relevo permite a mecanização agrícola demandada pela cultura. Hoje, quatro propriedades têm áreas expressivas com produção de trigo em Caxias, de acordo a Secretaria de Agricultura.
A época de semeadura, segundo o Zoneamento Agrícola de Risco Climático (ZARC), para a cultura do trigo de sequeiro no Rio Grande do Sul foi entre 11 de junho e 31 de julho. O ciclo do cereal pode variar de 100 a 170 dias. No mês de novembro, normalmente ocorre a colheita, mas como o trigo ainda está em maturação fisiológica, só faltando perder umidade, vai precisar de mais duas semanas para ser colhido.
De acordo com o engenheiro agrônomo da Secretaria de Agricultura, Pecuária e Abastecimento (SMAPA),de Caxias, Thales Milanesi, o alto valor da saca de 60 kg, que gira em torno de R$ 90, tem atraído muitos produtores da região, se tornando uma boa alternativa como cultivo de inverno.
—Acredito que o principal motivo da inserção desta cultura nas pequenas e médias propriedades rurais seja a possibilidade da total mecanização do plantio na colheita, reduzindo muito a mão de obra requerida. Cada vez mais tem-se muita dificuldade no emprego no meio rural, nos dias atuais — aponta Milanesi.
A tendência, conforme o agrônomo, é de que cultivos anuais, como soja, trigo, milho e aveia ganhem cada vez mais espaço nas propriedades rurais do municípios. Entretanto, essa mudança de matriz produtiva só é possível em áreas mais planas, que permitem a mecanização agrícola. Milanese garante que a cultura do trigo é viável e rentável, tendo em vista que o custo de implantação e condução é relativamente baixo. Além disso, o custo com mão de obra é inferior, se comparado com verduras, legumes e frutas.
— Caxias do Sul possui clima favorável à cultura e solos relativamente bons. Estamos inseridos numa ótima condição de horas de frio (vernalização), o que favorece o aumento da produtividade e qualidade do grão. O principal ponto negativo é a falta de radiação solar no inverno. São muitos dias nublados, com garoas e umidade excessiva, o que favorece a incidência de doenças na cultura - destaca Milanesi.
Serra registra novos plantios
Algumas cidades da Serra registraram a retomada do plantio de trigo em 2022. Em Garibaldi, Carlos Barbosa e Coronel Pilar, há registros do cereal em pequenas e médias propriedades rurais. O fato chamou a atenção do extensionista rural da Emater Regional de Caxias do Sul João Villa.
— É curioso, porque não é tradicional atualmente cultivar trigo na região. Em Garibaldi, onde o grão foi produzido no passado, só em um área são 27 hectares de plantação. Talvez os produtores da Serra tenham sido motivados pelo preço. Ano passado, o saco de 60 quilos custava R$80 e, pela relação direta com a Guerra da Ucrânia, subiu para R$90. Mas isso não representa nada do cultivo da região. Na verdade, o trigo se torna uma alternativa de inverno, porém, não é o que vai "salvar a pátria" do agricultor — aponta Villa.
A Emater Regional de Caxias abrange os Coredes Serra, Hortência e Campos de Cima da Serra. Juntos, os três coredes possuem 45 mil hectares de cultivo de trigo. Destes, 85% da produção está em Campos de Cima da Serra. Vacaria, Esmeralda e Muitos Capões são os principais produtores, conforme o extensionista rural.
— Quase tudo vai para o mercado nacional, porque o Brasil é importador de trigo. Este ano, a colheita está atrasada em razão do frio de primavera. Em outros anos em Vacaria, por exemplo, pelo menos 50% da área já estava colhida. Neste ano, a colheita nem começou — aponta Villa.