As cores que deram o tom na moda de outono/inverno e trouxeram a ideia de uma retomada do entusiasmo após o período mais grave da pandemia ajudaram a animar as vendas dos malheiros da Serra. Embora o inverno siga até setembro, o período mais importante de vendas para o setor já se encerrou e o balanço é positivo, mesmo sem dados definitivos — até porque, embora o trabalho já esteja voltado para as próximas coleções, o frio intenso na última semana trouxe um fôlego para as vendas.
Aliás, esse é o fator de maior influência para o comportamento do consumidor na hora de decidir pela compra ou não. As temperaturas baixas, principalmente no início do outono, costumam ser presságio de boas vendas. Foi o que aconteceu nesse ano, com marcas baixas nos termômetros ainda em abril e sem o tradicional veranico de maio. Em julho, as temperaturas um pouco fora do padrão que se estabeleceu neste ano fez com que a saída de peças diminuísse, mas não a ponto de derrubar os índices de comercialização na temporada toda.
— Um inverno excelente, começou cedo e permaneceu. Terminou um pouco antes do que a gente esperava, porque já em julho, fez dias com temperaturas fora do normal para o inverno. Mesmo assim para o setor atacadista, foi ótimo. O que a gente espera é que agora o tempo auxilie os nossos compradores, que vendem no varejo, a liquidarem suas compras para que vendam todos seus estoques — aponta Paulo Dalsóchio, presidente da Associação dos Centros de Compras da Serra Gaúcha (Acecors).
De acordo com ele, uma percepção dessa temporada é de que os varejistas preferiram fazer mais viagens para os polos malheiros da Serra fazendo compras mais assertivas e em menor quantidade. As vendas se concentraram para os três Estados do Sul, os mais frios do país. Sem arriscar números, o presidente da Acecors diz que a comercialização ficou nos mesmos patamares ou ligeiramente acima que no ano passado.
Estavam todos preparados, todos querendo vender.
PAULO DALSÓCHIO
Presidente da ACECORS
ESTIMATIVAS
Um fator importante é que a base de comparação é 2021, quando as vendas já tinham sido boas para o setor em Farroupilha e arredores, um dos principais polos malheiros do país.
— A gente pode estimar um crescimento em torno de 10% na comparação com o ano passado. Só não foi melhor em função do calor que teve agora (entre julho e agosto). Mesmo estando em liquidação, o consumidor acaba não comprando mais. Então, deu uma atrapalhadinha. Mas, no começo foi bem bom. O Dia das Mães, que é uma data forte para o comércio, a gente teve grandes vendas — conta Elias Biondo, vice-presidente do Sindicato das Indústrias de Fiação, Tecelagem, Malharias, Vestuário, Calçados e Acessórios da Serra Gaúcha (FitemaVest).
Com um perfil mais voltado às vendas para o consumidor final, malharias de Nova Petrópolis e Picada Café, que formam outro importante polo malheiro do Estado, também comemoram o bom inverno. As empresas das cidades, diferente da região de Farroupilha, ainda sofreram no ano passado, porque entre os principais pontos de venda estão feiras e o público consumidor é principalmente os turistas da Região das Hortênsias.
Esse ano reanimou o setor no sentido de voltar a ter esperança nos dias melhores.
MÁRCIO KNY
Presidente da Associação de Malheiros de Nova Petrópolis e Picada CAfé
Por isso, o presidente da Associação de Malheiros de Nova Petrópolis e Picada Café, Márcio Kny, usa como base de comparação outros períodos. Segundo ele, é possível estimar aumento nas vendas de 30% a 40% em relação a anos bons, como 2016 e 2017. Esse cenário fez com que o setor se animasse para o futuro próximo:
— A perspectiva é muito boa, tanto é que se voltou a falar em investimento em maquinário, nossos fios, texturas. A nossa leitura é que o mercado é promissor, porque nesse ano, ainda em função de falta de matéria prima, parece que o produtor não conseguiu comprar tudo o que queria.
Esse ano reanimou o setor no sentido de voltar a ter esperança nos dias melhores.
Crescimento real deve chegar a 5%
Uma das principais marcas do setor malheiro no país, a Anselmi projeta fechar a temporada outono/inverno com um crescimento real de 5% nas vendas em comparação com o ano passado. O percentual é resultado de um início da estação com temperaturas mais baixas e aquecimento na reta final.
O diretor industrial da empresa, Eduardo Anselmi, diz que julho teve redução nas vendas em comparação com o mesmo período de 2021 e que agosto também deve fechar assim. Segundo ele, a inflação do setor ficou em torno de 15% por causa do aumento do custo de insumos e outros gastos de produção.
— A gente ia até os fornecedores para comprar matéria-prima, implorava para ser atendido. Agora, está o contrário. A gente está começando a receber ligação com oferta de produtos até com descontos. Então, a gente está sentindo uma mudança de cenário. O que por um lado preocupa: se está sobrando matéria-prima, agora o setor têxtil está começando a desacelerar bastante. É o que a gente tem ouvidos dos grandes fornecedores que atendem todo o Brasil.
A gente nem estava esperando tanto frio assim tão cedo e causou uma corrida enorme por malha, até faltando produtos no início da estação.
EDUARDO ANSELMI
Diretor industrial da Anselmi
A nova coleção da malharia, que tem 550 funcionários trabalhando em três turnos, sai em outubro. Com sede em Farroupilha, a Anselmi promete muitas novidades para a próxima temporada de outono/inverno:
—A gente vem de uma pandemia com uma moda mais focada no conforto, no estar em casa e menos elaborada. O que a gente está preparando para o ano que vem é um mundo de cores. Se perguntar que cor vai ter no ano que vem, é difícil falar. É uma cartela de cores muito ampla, de fato. E com a volta de pele e outros adornos, trazendo toda uma sofisticação, saindo da moda focada no conforto, um pouco mais sóbria para algo mais alegre, até focando em um pós-ciclo de pandemia, de guerra.
Retomada de eventos e turismo impulsionou novos negócios
Com a característica de vender principalmente para o consumidor final em feiras e na megastore localizada às margens da BR-116 em Picada Café, a Tricoart celebra a retomada do turismo e dos eventos em 2022. Essas atividades, que seguiam prejudicadas em 2021 mesmo com a reabertura de alguns setores, agora estão a pleno vapor, o que embala as vendas junto com outros fatores:
—Muitos consumidores estavam com um consumo freado no período da pandemia e agora que começaram a retomar a vida social, tiveram que fazer compras de novo de artigos de inverno, de malha tricot, que o que a gente atua. As malharias também desenvolveram coleções muito boas, na minha opinião. Então, são vários fatores que contribuíram para um inverno histórico, que foi bem acima da média, como vinha acontecendo antes da pandemia — explica Jonas Knorst, proprietário da Tricoart.
Com vendas também pela internet, a empresa segue tendo o Sul do país como principal mercado consumidor. A coleção para o próximo outono/inverno, que será desenvolvida em setembro e outubro, vai seguir a tendência de cores vibrantes que já se instalou neste ano.
— A gente acompanha os estilistas que temos mais simpatia e o que eles vêm nos apresentando, a gente faz uma releitura. Muitas vezes, eles trazem tendência pura. A gente aplica isso ao nosso jeito de fazer tricot, pensando no nosso cliente e aplica a tendência juntamente com uma peça versátil, que a gente saiba que o cliente vai usar bastante, vai aplicar no seu dia a dia — detalha Knorst.
Para o início da produção, a empresa, com oito funcionários, já estará com a fabricação no novo prédio junto com a megastore. Hoje, a fábrica e a loja estão em lugares diferentes, mas a ideia é garantir o total aproveitamento do prédio adquirido recentemente pela empresa, às margens de uma das principais rodovias do país, ou seja, bem às vistas dos turistas que vão para a Região das Hortênsias.
Franquias para ampliar presença no país
De olho em novos mercados, as empresas do setor malheiro também buscam diversificar modos e locais de atuação. Um exemplo disso é a Ballardim Malhas, tradicional marca de Caxias do Sul, que deve fechar essa temporada com vendas no mesmo patamar do período outono/inverno do ano passado. Para ampliar a participação no mercado, a empresa lançou neste ano primeira franquia do setor no país, que fornecerá as peças de maneira consignada.
— A gente acabou se reinventando. Tivemos o lançamento das franquias. Então, a gente lançou, em maio, o nosso programa de franquias, onde as pessoas podem passar a adquirir uma loja nossa. Conseguimos focar nisso e adiantar o projeto para maio. A gente também acabou adquirindo um terreno em Farroupilha para comprar um terreno lá — detalha Adriele Daniel, diretora de marketing da Ballardin.
Com esse terreno em Farroupilha, a empresa pretende abrir uma nova loja própria. Hoje, a presença na cidade, que é o principal polo da venda de malhas para o setor atacadista do Estado, é em um shopping. O novo prédio ficará próximo ao Centro de Compras Farroupilha, na região do bairro Pio X. Além disso, a Ballardin também pretende ampliar a fábrica em Caxias. Está negociando um terreno para instalar um espaço de cerca de 5 mil metros quadrados, o quadruplo em relação ao atual.
Além das lojas, a empresa trabalha com revendedoras. São cerca de 14 mil cadastros já realizados ao longo da história da empresa, mil deles abertos neste ano. A malharia, que viu se ampliar neste ano a demanda por saias e calças e peças inovadoras, como cropped em malha, além de ter apostado nas candy colors, prepara agora a coleção de verão.
— Estamos agora em arte e fabricação da coleção de verão. A ideia é que seja lançada por setembro. A gente deu uma atrasadinha no lançamento, por causa do frio que chegou. Então, a gente se organiza conforme o tempo muda — assinala Adriele.
Entre as tendências para a próxima estação, a Ballardin continuará com a aposta em manga princesa, detalhes vazados e candy colors.
Ainda não guarde as malhas
Embora as malharias já estejam com a produção para o inverno desmobilizada, mais ondas de ar frio devem atingir o Estado em setembro. É o que apontam as previsões meteorológicas. A partir da próxima quinta-feira (24) até o dia 31, a expectativa é de um aquecimento no RS, com temperaturas acima da média em quase todo o Estado.
Segundo a meteorologista Carine Gama, no entanto, tudo indica que setembro tende a ter chuvas um pouco acima da média especialmente no Norte gaúcho. Junto com isso, a previsão é de maior nebulosidade e entrada de massas de ar frio ao longo da primeira quinzena e início da segunda do próximo mês. Com isso, a temperatura fica ligeiramente abaixo da média histórica. Carine diz que há a possibilidade de mais um ou dois períodos de frio intenso, que podem causar geada ampla.
Tendências
- Tanto o próximo verão quanto o próximo inverno devem ser ainda de uma ampla variedade de cores nas peças;
- Detalhes de sofisticação, como uso de materiais para garantir adornos às malhas, devem aparecer nas malhas no próximo inverno;
- Detalhes nas peças, como vazados, estão entre as tendências para a próxima coleção.
- Uma observação importante é que a fase ainda é de pesquisa nas malharias locais, que devem seguir tendências que vão aparecer no próximo inverno na Europa.
Fontes: Eduardo Anselmi, Jonas Knorst e Adriele Daniel