A pandemia mudou os planos de muita gente, mas não impediu que eles se concretizassem. Alguns precisaram ser remodelados para ganhar vida, como a formação em educação financeira para professores da ação social Vida que Prospera, da Unicred Integração. No ar desde o início do mês, o curso é oferecido aos docentes das redes municipais de Bento Gonçalves, Caxias do Sul, Farroupilha, Vacaria, Lagoa Vermelha, Pelotas e Santa Vitória do Palmar pela internet. No total, são 351 profissionais inscritos.
Alinhado com os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) e a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) no que se refere à educação financeira, as aulas têm uma abordagem psicológica da relação com o dinheiro. A intenção, conforme Fabrícia Bisol Finco, coordenadora pedagógica do Vida que Prospera, é proporcionar aos professores autoconhecimento para que eles possam trabalhar melhor o assunto com os alunos.
— É preciso se conhecer para trabalhar educação financeira. Como vou, por exemplo, falar sobre finanças se estou passando por dificuldades financeiras? — questiona.
Entre as atividades sugeridas aos profes, está a de que peçam aos alunos que escrevam em um papel três coisas que gostariam de comprar naquele dia. Essa lista deve ser guardada e revisitada três meses depois para ver quais desejos se mantêm. Com isso, é possível mostrar aos alunos como tratar o dinheiro de forma mais consciente. Para a psicanalista e coordenadora de educação financeira do projeto da Unicred, Márcia Tolotti, o momento de crise econômica gerada pelo coronavírus é, aliás, ideal para se repensar o consumo.
— Quando se começou a falar de educação financeira, se batia nessa tecla de não se endividar, de ter uma reserva para emergências, de um consumo com propósito. Quem conseguiu fazer isso ao longo dos anos está sofrendo agora, mas menos. Não tem a ver com quanto se ganha, mas o que se faz com o que ganha. Neste momento se prova a eficácia de ter um planejamento, de ter uma reserva — destaca.
Não se trata, segundo Márcia, de deixar de consumir, afinal, a economia precisa girar, mas de ressignificar o uso do dinheiro naquilo que realmente é importante.
— É um momento de repensar. A gente acha que fazer planejamento é ser cerceado. Que anotar gastos é ser muquirana, sovina. Não. É um jeito de se organizar o que se tem — acrescenta.
Certificação
O curso tem quatro aulas, uma por semana. Vídeos e textos estão disponíveis no site vidaqueprospera.com.br, nas plataformas das secretariais municipais, e também são enviados por e-mail ou aplicativo de texto. Ao final, lives serão realizadas com os participantes. Os professores receberão certificado.
"Não é só matemática, é postura"
Há algum tempo, a professora Ângela Beatris Lazzari, 51 anos, vinha se preocupando com a forma como lidava com o seu dinheiro. Em março, procurou uma consultoria financeira para organizar melhor os recursos. Quando surgiu a chance de fazer o curso de educação financeira da Unicred, não teve dúvida:
— Estou gostando, é bem organizado, não toma muito tempo e é bem objetivo. Tem uma atividade para definir o perfil da pessoa e deu que sou equilibrada, fiquei bem satisfeita.
Com poucas aulas, a educadora já percebeu que pode aproveitar melhor o capítulo destinado ao dinheiro e à cidadania no livro de matemática do 5º ano do Caldas Junior, escola municipal onde ela trabalha em Caxias do Sul. A profe, que leciona há 29 anos, já imagina aulas discutindo, por exemplo, quem da turma ganha mesada e que destino dá ao dinheiro que recebe.
— A gente trabalhava com dinheiro, com conhecer a moeda, fazer cálculo. Sempre se trabalhou, mas não sob a perspectiva da educação financeira. E não é só questão matemática, é postura de vida. Quero trabalhar não só o cálculo, mas a consciência financeira. Se gasto tudo o que ganho e aparece algo especial que quero comprar, não vou poder porque não tenho reserva — reflete Ângela.
OS TRÊS TIPOS DE COMPRAS
O período de pandemia e de crise econômica é oportunidade, segundo a especialista em educação financeira Márcia Tolotti, para rever definitivamente o consumo praticado no dia a dia.
— São pontos para pensar. Vale a pena trocar horas da minha vida trancada em uma sala, trabalhando, por algo qualquer sem sentido? Se a gente não pensar nisso agora, não vai pensar nunca mais — propõe.
Os três tipos de compras definidos por ela podem ser reavaliados:
Compra por necessidade
Aquela que envolve itens essenciais, como comida, papel higiênico, sabonete.
Compra por merecimento
Aquela quando você se presenteia e que não pode fazer você se endividar.
Compra sabotagem
Quando você não precisa, não pode e não merece. Às vezes, você nem vai se endividar com ela, mas é apenas um subterfúgio.