Designer-chefe na Mauricio de Sousa Produções, Bruno Honda Leite já criou muitos produtos nos quase nove anos de empresa. Propor novidades, aliás, é rotina para Bruno, que participou nesta sexta-feira (4) do Fórum de Economia Criativa, em Caxias — o evento continua neste sábado. Nesta entrevista, ele fala sobre o desafio diário de inovar em cima de uma obra já clássica, como a Turma da Mônica, e garante que é possível ser criativo em qualquer empresa e em qualquer momento da vida. Confira:
Como é criar em cima de um produto tão clássico?
É tão gostoso quanto dolorido. É muito gostoso você ver um projeto saindo. Quase tudo que a gente faz tem potencial de sair, mas a gente tem de ter o dobro de responsabilidade, primeiro para com a marca e a obra do Mauricio, que é uma obra importante, está entre as maiores obras produzidas por artistas brasileiros, e respeitando o DNA, mas trazendo sempre um sopro de novidade. Isso é uma coisa que o Mauricio sempre fez, de estar pareado (afinado) com a língua que se fala e o conteúdo que se consome. Isso ele fez no final dos anos 1950, nos anos 60, 70, 80, 90, 2000 e a gente entrou nesse modo que o Mauricio faz, só que deu uma acelerada na velocidade de mudança porque o mundo está muito mais fluido. A gente tem de mudar mais e produzir mais coisas diferentes para continuar disputando ombro a ombro com tanta gente boa fazendo coisas tão legais.
Como é teu processo criativo para poder inovar?
Isso vem da bagagem e do conjunto de coisas que a gente vai guardando no cérebro ao longo da vida e acho que tem dois lados: um é tudo o que sou desde que me identifico como Bruno, tudo a que assisti, as aulas de que participei, as pessoas com as quais convivi, as histórias que ouvi. E tem um lado de pesquisa direcionada. Todo criador acaba sendo um estudioso. Não tenho muita educação formal. Me formei na faculdade e não fiz pós, nada disso. Desde então, venho em um processo muito contundente de entender processo, método, ver o que deu certo com outras pessoas. Estudo a escola de Hanna-Barbera (produtora americana de desenho animado). Tenho estudado muito a produção de animação japonesa. E trocando muito com os outros parceiros da empresa. Tem uma riqueza nessa interpolação entre gerações. Seu Mauricio está com 83 anos, eu com 40 e trabalho com gente de 20. Olha a quantidade de vivência e mundos diferentes presentes nessas conversas. Então, é estudar muito, e daí as ideias vêm naturalmente, só tem de saber escolher o que é bom.
Dá para ser criativo em qualquer empresa?
Sim. Dá para ser criativo em qualquer empresa, em qualquer momento da vida, em qualquer relacionamento, em qualquer aspecto da vida mesmo. Para mim, a melhor definição do que é criatividade é que é a capacidade de você resolver problemas e você achar uma solução criativa. Não é encontrar a solução mais diferente, mas a solução onde você gasta menos energia para alcançar o máximo de resultado. E esse é um raciocínio que você consegue usar na sua vida em tempo integral, que é solucionar problemas com a melhor saída sem gastar tanta energia.
Como você vê a economia criativa para as empresas?
A economia criativa está permeada em todos os setores, na indústria, no comércio, porque é sempre como você vai encontrar maneiras de potencializar o seu core ou o core business. Quando você imagina que a indústria criativa tradicional já é quase 3% do PIB nacional e quando você pega a cadeia inteira e dá quase 20%, você já vê o impacto que isso tem. Isso porque somos uma nação que ainda estuda pouco, tem pouca educação de base, pouca educação de capacitação. A gente pega bastante iniciativas pontuais, você pega Senai, Senac. Todos os governos, de todas as esferas, tentam, mas a gente não tem isso estruturado como um conceito. A gente tem um preconceito grande que se você não for se capacitar para trabalhar com algo muito específico, tipo, ser um torneiro mecânico, trabalhar com administração, tudo o que está envolto de arte e essa criatividade relativamente mais solta ainda não é vista como uma função de verdade, como profissão. Mas isso está mudando, o mercado de animação abriu, o de audiovisual está saindo um pouco só do televisivo, a gente está vendo cada vez mais séries e filmes, o mercado de literatura está abrindo, só que as pessoas têm de ler mais, têm de assistir mais, porque isso vai gerar demanda e, com a educação de base, a gente vai fundamentar e capacitar mais gente para trabalhar, e daí o mercado vai abrindo 1%, 2% por ano e logo, logo a gente pode ter um grande polo de entretenimento. Se na Índia aconteceu, a gente pega Bollywood e vê a quantidade de riqueza que é gerada lá, por que no Brasil não pode acontecer? Mas são sempre mudanças estruturais e começa por educação.
Qual o conselho para quem quer apostar na economia criativa?
Primeiro é estudar muito. Quando falo em estudar, não é só formal, que também é interessante. Usar as redes sociais para acompanhar carreiras e cases, pessoas que já trabalham na área. Na minha época, o máximo de contato que eu tinha com um artista ou com alguém que eu achava bacana era através de uma revista, de uma reportagem editada. Hoje tenho contato direto. Vou na cara de pau e mando mensagem para o diretor do Homem-Aranha. Vou mandando mensagens, tem gente que responde, e vou formando uma teia de amizades. É estudar, ir atrás das pessoas e começar a fundamentar um trabalho bem consolidado de alguma coisa que você gosta de fazer. Você trabalhando um projeto, mesmo que seja pessoal, que não vá trazer frutos financeiros imediatamente, isso vai te dar vitrine, vai te dar capacitação e vai te dar agilidade de pensamento para o momento em que a janela de oportunidade se abrir.