Valentim Dalle Grave, 81 anos, viu Caxias do Sul crescer e quase empilhar carros uns sobre os outros em horários de pico. Tudo isso a bordo de um táxi. Desde 1972, Valentim recebeu a concessão para ser um dos taxistas do chamado “ponto zero um” da cidade, o da Estação Rodoviária.
– Naquela época, éramos em 18 carros, pelo menos 12 ou 13 eram fuscas. Não tinha o banco da frente, os passageiros sentavam atrás, cabia até três tranquilamente. Em cima do carro tinha um bagageiro – recorda Valentim, citando que a Rodoviária era na esquina das ruas Sinimbu com a Moreira César.
Quarenta e sete anos depois, o carro mudou, o endereço da Rodoviária mudou, mas, mesmo aposentado, Valentim segue trabalhando. Em 2015, no último ano em que o IBGE divulgou o número de aposentados que trabalhavam, eram 5,188 milhões de brasileiros. Essa é uma realidade a cada dia maior em todo o Brasil. Primeiro, por causa da longevidade. Conforme o estudo Cápsula, realizado pelo Grupo RBS, 19% dos gaúchos têm mais de 60 anos. Desde o dia 7 deste mês, segundo a SeniorLab, consultoria de mercado voltada ao público mais maduro, o número de gaúchos com 60 anos ou mais é maior do que o contingente de crianças e adolescentes de zero a 14 anos. Essas amostragens dão conta de projetar o aumento real do número de idosos, ou seja, aposentados que, por maior ou menor necessidade, estarão disputando o mercado de trabalho.
Segundo, porque as aposentadorias e pensões representaram 20,5% da participação da renda domiciliar em 2018, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD Contínua IBGE). Em 2017, esse índice era de 19,9%. No Brasil, no ano passado, entre as fontes de rendimento para a composição da renda mensal do trabalhador aposentado, a aposentadoria ou pensão foi o item que corresponde à maior fatia do bolo (R$ 1.872 em média). O crescimento dessa categoria de rendimento entre 2017 e 2018 foi de 3,3% e, em relação a 2012, aumento de 7,3%.
Valentim está aposentado há 30 anos
– Me aposentei aos 51 e comprovei 35 de trabalho, porque antes de dirigir táxi eu era caminhoneiro. Só que faz uns dois meses que eu tive de voltar a trabalhar diariamente, porque não consigo mais um auxiliar para dividir o táxi comigo. O serviço anda muito ruim, e muitos têm deixado o táxi para ser motoristas de aplicativo – explica Valentim, que geralmente trabalha das 7h às 19h, e não pode deixar de ganhar seu pão atrás do volante.
Quem não gostou muito da decisão foi a esposa Terezinha Goulart Dalle Grave, 72, também aposentada.
– Ela preferia que pudéssemos descansar, quem sabe indo passear mais na chácara – resigna-se.
Expectativa x Realidade
Esse desejo de estar fazendo outra coisa é mais comum do que se imagina, bem como o número de pessoas aposentadas que segue trabalhando. Não há um número oficial de aposentados que permanecem vinculados com carteira assinada em Caxias. Porque não há esse recorte das pesquisas nacionais, seja na Secretaria de Trabalho (vinculada hoje ao Ministério da Economia), seja no Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), tampouco na Previdência Social, nem mesmo no Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). O que se sabe a respeito de Caxias do Sul é que a cidade terminou o ano de 2018 com 75,7 mil aposentados. Desse montante, 58% dos benefícios são por tempo de contribuição, 27% pela idade e 15% devido a invalidez. Em média, o caxiense recebe R$ 1.636 ao mês de aposentadoria, o que equivale a menos de dois salários mínimos. Dessa maneira, o total desembolsado pelo INSS chegou a R$ 1,6 bilhão no ano passado. Esses dados são da Previdência Social.
– A aposentadoria é um sonho, mas a realidade é bem diferente da expectativa. Eu me aposentei em 1998 e hoje ganho dois salários mínimos. Mas cada dia fica mais caro manter a família, porque os preços aumentam mais do que o nosso rendimento. A maioria dos aposentados e pensionistas que atendemos está à procura de emprego. Porque hoje o desemprego atinge a filho, a nora, e ele acaba tendo de voltar a trabalhar para sustentar essas pessoas – revela Gildenor Canalli, secretário geral da Associação dos Aposentados e Pensionistas de Caxias do Sul (Aapopecs), que atende a uma rede de 5 mil pessoas, entre aposentados, pensionistas e tutelados.
Essa maior procura por trabalho, por parte dos aposentados, ou por uma população mais idosa, constatada até mesmo na associação caxiense, aparece como um dos dados da pesquisa PNAD Contínua IBGE. Em 2018, as faixas etárias que apresentaram maior crescimento foram as de trabalhadores a partir dos 40 anos. A maior parte das vagas que surgiram no último ano foi ocupada por empregados que tinham entre 40 e 49 anos – ao todo, foram 258 mil postos a mais, um crescimento de 2,47% em relação a 2017. A faixa de quem tinha mais de 50 anos aumentou em 183 mil vagas, ou seja, crescimento de 2,19%. Estes índices, de pessoas a partir dos 40 anos, é muito maior do que a dos trabalhadores com idades entre 30 e 39 anos, que teve acréscimo de 83 mil vagas, com variação sutil de 0,57%.