Porta-voz dos assuntos da Serra em Brasília, o vice-presidente de Relações Institucionais da Marcopolo, José Antônio Fernandes Martins, é um dos empresários com credencial para expor reivindicações para Dilma Rousseff. Ele integrou um time de empresários que ajudou a presidente da República a moldar um pacote de estímulos à indústria, em 2012.
Além de executivo da Marcopolo, Martins, 80 anos, é presidente da Associação do Aço do Estado, da Associação Nacional dos Fabricantes de Ônibus (Fabus), do Sindicato Interestadual da Indústria de Materiais e Equipamentos Ferroviários e Rodoviários (Simefre) e vice-presidente da Federação das Indústrias do Estado do Rio Grande do Sul (Fiergs). Nesta quarta, ele palestra na reunião-almoço que a Câmara de Indústria, Comércio e Serviços de Caxias do Sul (CIC) sobre "2014 - Eleições - Copa do Mundo - Expectativas".Martins falou ontem ao Pioneiro sobre as perspectivas econômicas. Confira os principais trechos da entrevista:
Pioneiro: O Brasil perdeu credibilidade diante de investidores e agências de riscos em 2013. Na sua opinião, por que isso aconteceu?
José Antonio Fernandes Martins: A presidente Dilma assumiu o país em 2011 com uma inflação alta. Ela elevou a taxa de juros para segurar a inflação e reforçou o superávit fiscal. Em meados de 2011 estourou a crise na zona do euro, em que os países como Espanha, Irlanda, Itália e Portugal quase que entraram em bancarrota. Então, com essa crise na zona do euro e os EUA sentindo a crise de 2008, eles diminuíram as suas compras. Como tiveram as suas vendas para esses lugares diminuídas, os chineses começaram a olhar qual país que compra bem e eles invadiram forte o Brasil. A redução de compras americanas e da zona do euro e invasão dos chineses criaram uma recessão no nosso país. E o que aconteceu: a Dilma tomou medidas anticíclicas para ativar a economia: reduziu a taxa Selic de 11% pra 7,25%, aprofundou as desonerações dos impostos, deu a redução do IPI para os automóveis 1.0, dos eletroeletrônicos, linha branca, de imóveis e criou o Plano de Sustentação do Investimento, do BNDES, através do qual se financiou caminhões, implementos rodoviários, ônibus, máquinas agrícolas, implementos agrícolas e máquinas operatrizes.. Houve um conjunto de incentivos à produção doméstica para animar a atividade econômica. São medidas orientadas para o consumo e não para o investimento. Então acreditou-se por curto período que estava em vigor uma nova matriz macro econômica, marcada por juros baixos, grande expansão do crédito. Tudo isso parecia que ia levar a um crescimento extraordinário. E o governo então esqueceu que crescimento de um país se faz através de investimento e não através do consumo. Esse foi o erro estratégico do governo.
Pioneiro: Como reverter isso?
Martins: O governo se deu conta do erro e abandonou esses dogmas de que precisa jogar dinheiro no consumo, mudou de estratégia e montou um pacote grande de concessões para atrair investimentos privados nacionais e internacionais. Isso em 2013. Essa mudança de estratégia, de ficar em cima do investimento e não mais em cima do consumo, resultou nessas licitações de rodovias, portos, aeroportos, etc. O objetivo era desobstruir os entraves da infraestrutura. O Brasil não crescia porque não tinha investimento em infraestrutura. Não tendo infraestrutura, o país não caminha. Então o governo resolveu desobstruir esses entraves da infra ao crescimento e aumentar a taxa de investimento através dessas privatizações.
Pioneiro: Foi uma medida certa então?
Martins: Absolutamente certa. Porém, o governo fez uma besteira. Apertou demais as taxas interna de retorno (TIR), que o governo ofereceu de 5% a 5,5%, quando o mercado esperada de 7,2% a 7,5%. Em alguns setores se esperava até 8% (TIR). Além disso, não tinham marcos regulatórios bem definidos. Governo não definia exatamente, com clareza os marcos regulatórios das licitação (uma condição de compra e venda). Então faltou confiança no governo por parte dos investidores. Não houve então interesse na iniciativa privada nessas concessões. O governo, então, como não teve interesse nenhum, desmontou aquela atitude original que ele tinha e começou a elaborar alguma coisa efetivamente construtiva. Hoje já tem lotes grandes de leilões bem sucedidos, como, por exemplo, o campo de Libra (reserva de petróleo), a privatização dos aeroportos do Galeão e de Confins, a privatização de rodovias. A Dilma já anunciou em São Paulo que 2014 será o grande ano das ferrovias. Essa mudança de estratégia fez a iniciativa privada voltar novamente para as compras. Fizeram os ajustes que precisam.
Pioneiro: O senhor acha que com essas alterações, 2014 tem de ser um ano de volta de crescimento?
Martins: Os resultados são só para 2015 e 2016. Não vai ser esse ano não. Esse ano vamos sentir muito pouco. Vamos começar a perceber os resultados desses movimentos de privatizações e concessões só daqui 1,5 ano, dois anos. O grande mal do Brasil chama-se infraestrutura, que é precaríssima. Quando falo em infraestrutura, falo de mobilidade, de energia, comunicação, de tudo. Em 2002, a frota de veículos que existia no país era 35,5 milhões de veículos. Em 2013, foi de 77.8 milhões. Houve, então, um crescimento de 120% na frota. E a infraestrutura cresceu menos de 10%. Com isso a gente percebe o congestionamento absurdo que existe. Infraestrutura deficiente produz congestionamentos brutais e o país não se movimenta.
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