Cansado de ser afetado com racionamento de gasolina nos últimos dois meses, o que o obrigou a manter o posto fechado por cerca de 15 dias ou racionando a quantidade de litros aos clientes, o dono do Posto São Pelegrino (bandeira Charrua), Jonatas Conti, 26 anos, resolveu reagir.
Com conhecimento de quem é formado em Direito, o revendedor entrou na Justiça nesta semana com uma liminar pedindo o restabelecimento da entrega do combustível. Na terça-feira, obteve ação favorável da Comarca de Lajeado, sede da Charrua, determinando que a distribuidora voltasse a fornecer a gasolina ao posto, dentro das quantidades encomendadas, no prazo de 24 horas, sob pena de rescisão de contrato e multa de R$ 4 milhões. No mesmo dia, três cargas de combustível foram entregues no posto, motivando a família Conti, dona do posto, a voltar a fazer as esperadas promoções, com gasolina comum a R$ 2,49. Na quarta-feira, a partir das 16h, houve outra "oferta-relâmpago", até as 23h.
- Quando mais me cutucam, mais eu devolvo - confessou.
A decisão judicial é inédita no Rio Grande do Sul, abrindo um precedente de jurisprudência sobre racionamento de combustível. Mais do reaver os R$ 200 mil em prejuízos no período, Jonatas busca recuperar os danos de imagens sofridos pelo posto. Nesta entrevista exclusiva ao Pioneiro, desabafa sobre as dificuldades de vender gasolina barata em Caxias:
Pioneiro: Como foi a luta para voltar a ter combustível após passar semanas com racionamento?
Jonatas Conti: O racionamento começou há cerca de dois meses. Meus cliente vinham aqui e eu não tinha o produto para entregar. Eu ligava para a companhia e não vinha esse pedido. Eu pedia 35 mil litros e eles me mandavam 10 mil, 12 mil litros. Até 5 mil litros me mandavam. Eu acabei ficando uma semana tendo esse problema. Isso antes dessa situação que saiu na mídia (dos navios de petróleo com dificuldades de atracar em Tramandaí por condições adversas de clima). Eu até na época informei isso a uma rádio e fui desmentido pelo Sindipetro. Eles falaram que não estava problema nenhum na cidade. Mas eu já estava sofrendo naquela época.
Pioneiro: E isso ocorreu antes daquele problema que deu em função dos ventos no mar e que então não conseguiram desembarcar petróleo?
Conti: Isso. Cerca de 30 dias antes eu já estava sofrendo e, desde aquela época, nunca mais normalizou para mim. Fiquei sempre recebendo cerca de 50% do meu produto. Quando deu esse problema dos navios, aí piorou. Passei a receber 20% do meu produto e às vezes não recebia nada. Fiquei mais tempo fechado do que aberto. O que me indignava era o seguinte: os outros postos não fecharam, só eu. Tentei várias vezes questionar a companhia o motivo de os outros postos terem produto e eu não. Eles alegaram que havia um racionamento, que minha companhia tinha uma cota para receber e a refinaria não poderia ultrapassar essa cota. Mas quando aconteceu esse problema, a Refap (Refinaria Alberto Pasqualini) criou polos alternativos para as companhias irem buscar o produto, já que ela não poderia entregar. A minha companhia foi buscar, mas eu continuei sem e a multa por rescisão contratual que eu tenho com a minha companhia gira em torno de R$ 4 milhões. Então, eles não regularizaram e não tomaram medida nenhuma. Aliás, era um fato notório que estava tendo falta e ninguém fez nada, nem o Ministério Público agiu.
Pioneiro: Você havia avisado o Ministério Público?
Conti: Eu cheguei a ir lá, conversei com uma assessora e ela disse que isso era uma perda civil que não tinha nada a ver com a distribuidora. Mas eu só conversei com a assessora, o promotor não estava lá. Mas como eu sabia dos meus direitos, sou formado em Direito, inclusive, eu protocolei um ofício informando o que estava acontecendo, que apenas o nosso posto estava tendo um tratamento desigual. Inclusive eu inclui que o próprio Sindipetro concordava com isso porque diziam que era um caso isolado. Queria que eles investigassem isso então. Eu tive um prejuízo muito grande. Foram criadas muitas especulações, tinham clientes até achando que a gente não pagava o combustível, porque era complicado passar tanto tempo fechado.
Pioneiro: A partir de dois meses para cá, você ficou quantos dias com o posto fechado ou com racionamento?
Conti: Fechado fiquei uns 15 dias. Mas vários outros com limitações de litros. Outra coisa, não conseguia mais trabalhar com preço competitivo. Eu fui a R$ 2,79, coisa que eu nunca tinha feito. Não tinha o que fazer. Vendia 200 mil litros por semana. Mas no racionamento caiu mais da metade, cerca de 45%.
Pioneiro: Isso porque pouca quantidade significa ter que trabalhar com preço mais alto...
Conti: Exatamente. Um dos diretores da Charrua até me disse: "quem sabe se tu subir o preço, tu resolve esse teu problema".
Pioneiro: Por que a distribuidora faz essa pressão, que sempre pareceu ser dos postos?
Conti: Ela pode subir meu preço para eu não ser competitivo no mercado. Porque eu compro à vista, eu tenho o preço melhor. Mas como eu tenho contrato de exclusividade, eu sou obrigado a comprar dela. Não posso comprar de outro. Se ela quiser que eu compre gasolina a R$ 2,60 para eu não vender a R$ 2,59, ela pode. Só que eu pedi no recurso que eu fiz na Justiça para que o preço seja congelado, a não ser que a própria refinaria mude o valor. Então eu me precavi de não ficar preso nas mãos da distribuidora. Outra coisa, nesses dois meses que eu tive problema, foi subido o valor meu e eu tenho como provar. Não tenho aumento da refinaria e a distribuidora subiu meu preço.
Pioneiro: E tu achas que essa pressão vem da onde?
Conti: Não sei te dizer. Já ouvi falar muita história, mas não tem como provar. Mas não tem explicação, como que agora (depois do recurso) eles têm o combustível para me fornecer? Até ontem (terça) não tinha.
Pioneiro: O fato de ser formado em Direito lhe ajudou, senão seria mais difícil para um dono de posto sair desse impasse?
Conti: Pois é. Além disso, eu estou pedindo a reparação de lucros que eu deixei de ter nesse período e mais a questão de dano moral sobre a imagem do posto, porque tinha essa especulação de que tínhamos quebrado ou falido. Os outros postos mesmo diziam para meus clientes quando eles tinham que ir em outro posto porque aqui estava fechado: "viu o que dar vender gasolina barata?" Eu tenho o posto que mais lucra em Caxias. Ninguém ganha mais dinheiro que eu em lucratividade.
Pioneiro: Isso vendendo mais barato do que os outros...
Conti: E aqui é um livro aberto. Quando eu comprei o posto há dois anos ele vendia 30 mil litros, a uma margem de R$ 0,50 ao litro e ganhava R$ 15 mil por mês de receita. O cara não ganhava nem para pagar as contas. Hoje, eu vendo 800 mil litros a uma margem de R$ 0,33 e ganho entre R$ 170 e R$ 200 mil por mês só de lucro.
Pioneiro: Ou seja, dá para vender bastante em Caxias, ganhar e adotar preço competitivo. Por que os outros postos não fazem isso?
Conti: De repente é a política. Tem que saber reduzir o custo fixo da empresa sem desmotivar os funcionários. Os meus funcionários ganham meta, se a gente atingir a meta, eles são recompensados. Os outros postos não trabalham tanto com isso. É uma questão matemática e tem que acreditar na ideia. Eu recebi um excesso de fiscalização aqui no posto e nunca pegaram nada no combustível. Não tem nada.
Entrevista
'Se tu subires o preço, resolves o teu problema, disse-me o diretor da distribuidora', afirma sócio de posto em Caxias do Sul
Jonatas Conti é obrigado a recorrer à Justiça para ter abastecimento normalizado
Silvana Toazza
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