"Eu tenho me gostado mais nas fotos". A constatação é da advogada e servidora pública Ana Paula Flores após olhar rápida e despreocupadamente as fotografias que ilustram esta reportagem. Não se trata de pouca vaidade, e, sim, de um amadurecimento em relação à própria imagem conquistado nos últimos tempos. Ana comemorou 50 anos em março e segue uma linha de pensamento e de comportamento de mulheres dessa geração que estão encarando o envelhecimento com mais conhecimento, segurança e aceitação.
— Eu ando admirando quando percebo alguma das minhas rugas, os meus cabelos brancos. Sinto que quero deixar a idade chegar em mim, ir envelhecendo. E acho que isso está sendo valorizado também: a mulher sendo como ela é. Uma vez eu me esticava toda nas fotos para não aparecer alguma barriguinha. Hoje, se aparecer é isso aí. Às vezes, batem foto e perguntam se quero olhar se tá bom. Digo que não e que pode publicar. Porque eu sou aquilo ali — enfatiza a advogada sobre a forma que enxerga a si mesma atualmente.
Se até o século passado chegar aos 50 anos representava se aproximar do fim da vida — em 1970, a expectativa de vida do brasileiro era de 57 anos; agora, é de 75,5 — hoje, o cenário é outro. Elas festejam o 50° aniversário com uma vida ativa, trabalhando, se exercitando, gastando mais tempo e dinheiro consigo mesmas e, como dizem, sendo mais seletivas nas relações, sejam de amizade, familiares ou amorosas. Um movimento alimentado não só pelo discurso de famosas em redes sociais, como também por fatores como independência financeira, crescimento dos filhos e busca pelo autoconhecimento.
Você para de dar explicação. Aprende a dizer não tranquilamente.
— Aos 50, a gente liga o botão do f*-se, sabe? Não gostou? F*-se! Não ficou feliz com o que eu falei? A mesma coisa! Você para de dar explicação. Aprende a dizer não tranquilamente. Quer jantar? Não, obrigada. Por quê? Porque eu não estou a fim. Eu não preciso mentir. Eu não sou obrigada a agradar todo mundo o tempo todo — opina a jornalista Patricia Parenza, que aborda a chegada dos 50 anos nas redes sociais.
Em Caxias do Sul, segundo o último Censo do IBGE, as mulheres entre 50 e 59 anos representam pouco mais de 6% da população, sendo, portanto, 30.944 habitantes do sexo feminino nesta faixa etária.
"Quero viver tudo que eu tiver direito de viver"
As caxienses Simone De Antoni e Ana Paula Flores não mantêm a mesma profissão, tampouco fazem parte do mesmo círculo de amizades, mas quando o assunto é o envelhecimento e a entrada na casa dos 50 anos ambas manifestam palavras-chave bem similares: liberdade, seletividade, aceitação e amor próprio. Obviamente que não é um processo fácil, mas o autoconhecimento e a maturidade conquistados nas outras fases da vida as ajudam a encarar as mudanças físicas e psicológicas com mais leveza e jogo de cintura.
Psicóloga, Simone diz que adora receber os amigos em casa, mas também aprecia a própria companhia, assistindo a séries e a filmes. As viagens para outros países, nos últimos tempos, também foram um marco simbólico de uma nova fase. Para ela, os 50 anos vieram como um destrave para se permitir mais.
Eu sempre digo que eu quero envelhecer, mas eu quero envelhecer lúcida. Porque eu quero viver tudo que eu tiver direito de viver.
SIMONE DE ANTONI
Psicóloga
— Eu sempre digo que eu quero envelhecer, mas eu quero envelhecer lúcida. Porque eu quero viver tudo que eu tiver direito de viver. E a chegada dos 50, marca uma coisa assim, pelo menos pra mim, do "se permitir mais". Porque coisas que tu não fizeste até os 50, tu passas a pensar, tipo, "tá, mas por que não, né? Por que eu não posso viver algumas outras coisas agora?" — questiona.
Colocar-se no centro da própria vida, após o crescimento do filho Arthur, atualmente com 24 anos, também é um dos desejos já colocados em prática:
— Acho que acima de tudo você tem que buscar se divertir e viver a tua vida do jeito como quer. Porque eu noto que, muitas vezes, as pessoas chegam aos 50 e se dão conta que viveram muito em cima do que a família, o casamento e os filhos esperam delas. Eu tenho que pensar agora em mim, né? Na Simone, 50+, no que eu quero viver daqui para frente — avalia.
A advogada e servidora pública Ana Paula credita muito da forma que vê e leva a vida aos 50 anos às vivências como um mestrado, em Porto Alegre, oportunidade que a permitiu conviver com pessoas de diferentes pensamentos e orientação sexual.
— Eu digo que foi lá que eu virei mulher, porque fiquei sozinha, eu vivi comigo mesma. Eu também trabalhei com a Justiça Restaurativa, que eu avalio que foi uma coisa que evoluiu muito o meu ser, a minha visão de mundo, a minha personalidade — conta.
Sem filhos e em um relacionamento há três anos, ela fala livremente sobre as opções muitas vezes consideradas fora dos padrões que a sociedade impõe e espera das mulheres:
— Eu nunca quis ter filhos e nunca quis casar. Nunca quis ter aliança. Eu nunca me imaginava com sobrenome de marido. E chegou uma época que todas as minhas colegas começaram a se casar e eu fiquei pensando "acho que eu tenho um problema". Aí depois que eu fui para Porto Alegre, já com a idade avançada, é que realmente tive certeza que eu não tenho problema _ conclui Ana Paula.
E a menopausa?
As mudanças corporais, com a acentuação das rugas, dos fios brancos e outras características próprias do envelhecimento, não são exatamente fáceis, mas têm sido acompanhadas de mais liberdade: os procedimentos estéticos são ditos como uma opção e não uma exigência para quem alcança os 50+. Por outro lado, é preciso lidar com sintomas e períodos característicos da faixa etária, como a menopausa.
A médica ginecologista Mona Dall'Agno explica que a menopausa corresponde ao último ciclo menstrual feminino. A falência dos ovários faz com que o corpo deixe de produzir alguns hormônios, entre eles o estradiol. O resultado é uma série de alterações físicas e emocionais, nem sempre bem-vindas e fáceis de lidar:
— O estradiol tem ação em todo o nosso corpo e quando deixamos de produzi-lo, passamos a ter inúmeros sintomas. Os famosos calorões são os mais comuns e mais conhecidos, mas temos mais de 40 descritos, como ressecamento de pele, de cabelo, dores articulares, alterações do sono, alterações cognitivas... O humor fica mais depressivo e instável. Também podemos ter falta de memória, além da questão sexual que muda totalmente — explica a médica.
A ginecologista recomenda que as mulheres busquem apoio com um profissional de confiança e que, se necessário, façam a reposição hormonal.
— É possível tratar e é possível ter qualidade de vida. É um tratamento seguro, o qual possui pouca contraindicações — sinaliza.
"Respeita a minha história"
Criadora do curso Menopausa Sem Pirar, em parceria com a médica Joele Lerípio, a jornalista caxiense Patricia Parenza diz que sentiu na pele todos os sintomas e que isto, somado à falta de informação sobre o assunto, por volta de 2016, a incentivou a levar conhecimento para mais mulheres por meio das redes sociais.
— Foi um susto tremendo, eu não sabia o que estava acontecendo. Caí de paraquedas num buraco negro. Não tem médico bom para te atender, as pessoas não sabem, não têm informação. Foi muito difícil — lembra Patricia, acrescentando sobre a importância de ter informações mais claras e acessíveis sobre o envelhecimento:
Nós somos a primeira geração que está dizendo "ó, eu não tenho prazo de validade, respeita a minha história"
— Hoje a gente está botando luz. Sou da primeira geração de mulheres de 50 anos que está reescrevendo essa história. Nós somos a primeira geração que está dizendo "ó, eu não tenho prazo de validade, respeita a minha história" — finaliza.